Energia sustentável, boa para o planeta e para o bolso

Placas solares representarão 13% do consumo de residências em 2050; sistema alternativo gera economia de R$ 12 mil por mês a condomínio do Rio

Fincado no alto de um prédio em Botafogo, Zona Sul do Rio, a poucos metros do vaivém dos bondinhos do Pão de Açúcar, um conjunto de placas escuras e brilhantes passa despercebido em meio a um entorno bem mais aprazível. São essas 40 placas, no entanto, que garantem bem mais do que torneiras com água quente a 200 pessoas que vivem em 98 apartamentos do Edifício Augusto César Cantinho: trazem um senhor alívio às finanças do condomínio.

Esse é um exemplo de como já podemos agir pelo clima e reduzir nosso impacto no planeta, neste caso, economizando energia. O setor é o que mais contribui com emissões de gases de efeito estufa, que superaquecem a Terra e provocam as mudanças climáticas.

O sucesso é traduzido em números: antes do sistema sustentável, em 2008, o edifício pagava R$ 15 mil por mês gás à CEG. Hoje, livre das onerosas e enormes caldeiras movidas a gás (tecnologia que fez muito sucesso na década de 1980), os condôminos desembolsam mensalmente cerca de R$ 3 mil à Light – que fornece energia para as bombas de calor quando a incidência solar não é suficiente. Uma incrível economia de R$ 12 mil por mês – ou R$ 60 por morador.

A troca dos sistemas foi idealizada há oito anos pela síndica Henriette Krutman (foto). Ao deparar-se diante da necessidade de substituir as antigas caldeiras, ela levou um susto ao fazer cálculos: para trocar por novas em bom estado, o custo ficaria em torno de R$ 80 mil. A opção foi apostar na tecnologia “verde”. O pagamento do equipamento foi adquirido por um sistema de leasing, ao custo médio mensal de R$ 7 mil durante quatro anos.

Além, de todos os benefícios, o sistema liberou o espaço onde se localizavam as caldeiras, cerca de 40 metros quadrados na área nobre do playground – diz Henriette.

Os coletores solares só funcionam em prédios que foram construídos com sistema central de aquecimento da água (algo muito comum há três décadas).

No sertão baiano, uma usina de novidades

Além de exemplos como o do condomínio de Henriette, têm sido cada vez mais comuns no Brasil casos de geração da energia solar em prédios, casas e sítios. Somos agraciados por um dos índices de radiação solar do Brasil mais altos do mundo. E regiões do Nordeste, principalmente o Sertão da Bahia, estão na frente quando se trata de aproveitar fontes limpas para geração de energia.

Em 2013, foram instalados sistemas para captação de geração de energia elétrica com placas solares (também chamadas de fotovoltaicas) sobre mil residências em dois condomínios do Programa Minha Casa Minha Vida em Juazeiro, no sertão da Bahia, totalizando 2,1 MWp (foto).

É o suficiente para abastecer 3,6 mil domicílios em um ano. Isso possibilita que mil famílias vendam a energia excedente no mercado livre. Assim, conseguem financiar os equipamentos e reforçar o orçamento doméstico.

A energia vendida à distribuidora local rendeu, líquido, R$ 1,89 milhão entre fevereiro de 2014 e junho. Desse bolo, uma fatia de 60% vai para o bolso das famílias, todas de baixa renda, 30% são aplicados num fundo de investimentos para o condomínio e para a associação de moradores e os 10% restantes pagam as despesas de manutenção dos residenciais. No atual ritmo de faturamento, o investimento se pagará em sete anos, estima a empresa.

Os microgeradores, sistemas com potência de até 100 kW, pedem passagem. De acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já são 498 sistemas fotovoltaicos conectados até março de 2015 em todo o país, totalizando 5,4 MW.

A pequena geração residencial de energia com luz solar foi objeto da resolução normativa 482, da Aneel, de 2012. Nos próximos 35 anos, a potência instalada em micro e minigeradores solares deve chegar a 5 mil MW, representando 13% do consumo residencial do país, revela um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE[EC1] ).

São Paulo, Pernambuco, Goiás, Rio Grande do Norte e Minas Gerais são alguns estados que já decidiram isentar ICMS sobre a produção de energia eólica, contribuindo para a inovação se tornar cada vez mais atrativa para o consumidor comum.

Em agosto passado, São Paulo também concedeu isenção fiscal para a fabricação de equipamentos para eletricidade renovável (solar e eólica).

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O grande gargalo, que impede uma expansão mais significativa dessas tecnologias 100% limpas, ainda é o preço.

A energia elétrica fornecida pelas companhias de distribuição permanece mais barata na maior parte dos estados brasileiros. Mas com a escalada das tarifas, a tendência é que os sistemas de geração alternativos ganhem terreno. Com isenção de ICMS, a geração fotovoltaica já se apresenta viável em 98,5% do mercado residencial, segundo a EPE.

Como a regulação da Aneel permite a injeção de energia na rede em troca de créditos em kWh na conta de luz, a geração descentralizada de energia tornou-se viável economicamente para consumidores residenciais de quase todo o Brasil. O consumidor paga, a cada mês, somente o valor da diferença entre a energia consumida da rede pública e o que foi gerado e injetado por ele mesmo na rede, mais a incidência de impostos sobre toda a energia consumida.

Vale a pena hoje? Depende do padrão de consumo

A pedido do PapodeHomem, um engenheiro especialista na área de energia fez um cálculo do custo-benefício de se instalar um microgerador fotovoltaico numa residência no Rio de Janeiro. O objetivo era responder à pergunta:  “Vale a pena instalar uma geração fotovoltaica na minha casa, hoje?”.

O especialista arbitrou 20% do custo de investimento e mais um custo anual de manutenção de 2% do investimento. Admitiu uma vida útil de 20 anos para painéis e instalação e dez anos para o inversor. Também considerou uma taxa de juros de 6% ao ano (igual ao rendimento da poupança) e um fator de capacidade de 17% no local (relação entre a potência instalada e a produção de energia).

Ele propõe, então, um exercício: vamos imaginar dois consumidores. Um com consumo igual à média dos brasileiros e outro que está numa faixa superior de consumo residencial.

Consideramos que o consumo residencial médio no Brasil é de 168 kWh/mês, o gasto com a energia elétrica produzida por 5 painéis solares de 255 watts seria de cerca de R$ 232 por mês (ou R$ 1.380/MWh).

Os preços foram obtidos no site neosolar.com.br:

  • Painel solar fotovoltaico de 255 watts (R$ 1.059);

  • Inversor de 3 kW: (R$ 10.090);

  • Kit de montagem para três painéis:  R$ 899 (para telhado de telha).

No caso do “consumidor-médio”, se a energia fosse comprada da Light, o preço a pagar seria algo como R$ 138 por mês, já considerados o preço (tarifa mais impostos) de R$ 0,75261/kWh, a partir de 5 de novembro de 2015, além da penalização pela bandeira vermelha. Claramente, neste caso, a instalação das placas não compensa, pois o custo da geração fotovoltaica seria quase o dobro do custo de comprar da Light.

Vamos ver agora a situação de um consumidor com mais recursos, parte de uma minoria de 0,5% da população, que consome 1.320 kWh/mês.

Neste caso, o gasto com a energia produzida por 42 painéis solares de 255 watts seria de cerca de R$ 992 por mês (ou R$ 752,00/MWh). Se comprasse essa mesma quantidade de energia da Light, teria um custo mensal de R$ 1.124,44 (tarifa mais impostos mais bandeira vermelha e mais taxa de iluminação pública). Agora, a resposta se inverteu: para este a geração fotovoltaica compensa.

Eólica tem maiores entraves

Quando o assunto é energia eólica em unidades residenciais, entretanto, outras variáveis entram na conta. É preciso levar em conta que alguns aspectos que podem dificultar a sua implantação no país. O principal entrave, observa Juarez Lopes, da diretoria de Estudos Elétricos da EPE, é a dinâmica arquitetônica das cidades, que impedem uma melhor circulação dos ventos.

“Quem deseja instalar um gerador eólico num empreendimento residencial tem de levar em conta que o regime de ventos precisa ser suficiente, o que muitas vezes não ocorre, principalmente entre prédios, numa área urbana. Num prazo mais curto, vejo mais possibilidades de expansão dos modelos de aquecimento de sistemas hidráulicos de condomínios com placas solares” – destaca Juarez.

Com opções ainda surgindo no horizonte, a síndica Henriette, aquela do prédio de Botafogo, aproveitou para fazer logo mais pelo planeta. No espírito “não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje”, além do sistema de aquecimento por placas solares, ela colocou no cronograma do condomínio a “semana das válvulas” a uma ação trimestral de combate ao desperdício. Todas as torneiras, válvulas de descarga e chuveiros são vistoriados e o condomínio providencia a troca de reparos, carrapetas e válvulas defeituosas. O morador paga apenas as peças e o condomínio arca com a mão de obra do bombeiro hidráulico. Logo após essa ação, ela conta, o consumo de água costuma cair cerca de 5% (3 a 4 mil litros/dia).

“Já instalamos 120 sensores de presença (nas garagens, corredores e depósitos de lixo), substituímos dos holofotes e lâmpadas de baixa eficiência (incandescentes) por fluorescentes, eletrônicas e LED. Essa mudança, além da eficiência energética, trouxe mais luminosidade para as áreas comuns” – gaba-se.

Viu só? Já é possível ser sustentável fazendo pouco e pensando na coletividade. Se estiver pensando em construir ou comprar a casa dos sonhos, vale a pena investir em uma placa solar ou em tecnologias que deixem o imóvel "mais verde", como torneiras e assentos sanitários que permitem pouca vazão de água, por exemplo.

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Acompanhe nosso percurso sobre sustentabilidade

Esse texto faz parte do nosso percurso sobre sustentabilidade, que vai ter 4 textos destrinchando o tema de forma prática.

Semana que vem, na terça, temos o último texto da série. Não vai perder.

Enquanto isso, aqui você pode acompanhar todos os textos do percurso:

1. O clima no mundo enlouqueceu. E eu com isso?

2. A revolução energética já começou e você não vai querer ficar de fora

3. Energia sustentável, boa para o planeta e para o bolso

4. ...


publicado em 12 de Abril de 2016, 00:10
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Emanuel Alencar

Jornalista formado pela Universidade Federal Fluminense (UFF), trabalhou nos jornais O Fluminense, O Dia e O Globo, no qual ficou por oito anos cobrindo temas ligados ao meio ambiente. Atualmente, é editor de Conteúdo do Museu do Amanhã. Tem pós-graduação em Gestão Ambiental. Apaixonado pela profissão, acredita que sempre haverá gente interessada em ouvir boas histórias.


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