Depois de um redator que sonha ser massagista de modelos, um cartunista malvado, um professor de dança de salão e um designer de moda heterossexual, entrevistamos um dos criadores do programa Pânico, na Jovem Pan, o DJ do Caldeirão do Huck: Maestro Billy.
Billy Umbella, eleito como um 50 campeões da inovação de 2007 pela revista Info, foi um dos primeiros podcasters do Brasil: seu primeiro programa foi ao ar em abril de 2005.
Ele é o cara por trás da Rádio Heineken. Já fez remixes para Lulu Santos, Ana Carolina, Ed Motta, Morcheeba, Enya e, mais recentemente, Black Eyed Peas e DJ Tiesto.
Além de seu trabalho no rádio e na TV, hoje grava podcasts para seu blog e é dono do estúdio Mellancia, em São Paulo, onde grava jingles, vinhetas, trilhas e tudo que envolver produção de áudio.
Se você está fugindo das profissões mais convencionais e pensando em se aventurar com áudio, o papo com Maestro Billy é leitura obrigatória.
1. Qual sua história? Quais suas origens? O que fazia antes de ser DJ?
Eu fiz colégio no Galileu Galilei e faculdade de Publicidade na FAAP em SP, mas antes ainda eu tinha uma banda cover do Joy Division.
Já tocava piano desde meus 8 anos e sempre tive essa mania de pensar que ganharia dinheiro com música ou algo similar. Aquele esquema “Putz, vou ser famoso”. Até uma vez perdi uma vaga de estágio na Mastercard quando, na entrevista, disse que aquilo seria algo passageiro, que eu queria mesmo era ser artista. 😉
Depois do lance do Joy Division, em paralelo à faculdade e a Band FM (onde eu trabalhava de estagiário), ainda cheguei a lançar com minha banda, a Digital Disorder, alguns “sucessos” underground e uma versão dance anos 90 de “Mandy”, do Barry Manilow.
Esse lance de ser DJ aconteceu porque, além da faculdade de manhã, do estágio na Band FM à tarde, eu ainda trabalhava à noite em um estúdio de gravação com o Banana (atual locutor da Jovem Pan Sat) e o Silvio Calmon (um dos DJs pioneiros no Brasil). Nesse estúdio gravávamos chamadas para bailes de samba do Pelé (na Rosas de Ouro, etc), chegamos a gravar um single para os Racionais MCs (“Voz Ativa”) e também o CD Consciência Black II, sucesso dos primórdios do rap nacional. Tem meu nome lá!
Um belo dia o Silvio me perguntou se eu queria ser DJ. Eu falei que sim. Isso foi numa quarta-feira. Aprendi o básico e logo na sexta ele me mandou abrir uma festa. Coisa simples. Só trocar vinis entre uma pick-up e outra até ele chegar. Fui tocar. Uma festa de pessoas por volta dos seus 50 anos. Não sabia nada de música nessa linha. E o Silvio só chegou às 2 da manhã.
Levei a festa sozinho. Ou melhor, tinha um cara muito bêbado, convidado, que curtiu ficar do meu lado e a cada música ele me perguntava: “Você tem a música X?”. Eu procurava, geralmente achava e tocava. Ele curtiu muito fazer o playlist… Foi o que me salvou.
Depois disso, o que veio foi lucro. Festas em várias baladas em SP, Luais (plural de Luau) em Maresias, Clube Sirio, O Leopolldo, Allure e outros lugares mais, até chegar no Caldeirão.
Ao mesmo tempo trabalhava em rádio. Band FM, Metropolitana, Cidade FM, Transamérica e Jovem Pan. Nesta última fui um dos fundadores do programa Pânico e produtor do Djalma Jorge Show nos anos 90. Fui também o cantor do CD do Pânico. Sim, eu era o Macacaralho. O cara que entrava fantasiado de Michael Jackson com máscara de macaco no Gugu, Xuxa, etc.
2. Como descobriu que era isso que queria fazer e como chegou onde está?
Putz, acho que desde criança eu sempre tive um interesse muito grande por música. Em casa ouvíamos de tudo, desde música clássica até MPB – meus pais sempre foram cabeça aberta pra isso. Minha irmã mais velha também foi uma grande incentivadora, até porque ela me mostrava músicas que rolavam nas baladas que eu nao tinha acesso na época, e curtia muito.
Fiz aulas de piano e, com a banda que montamos no colégio, comecei a me interessar por outros instrumentos e por produção musical.
O lance de DJ foi uma consequência do trabalho mais todo esse background que tive. Aprendi muito de música como DJ, aprendi a não ter preconceito por estilo nenhum e a ouvir tudo que chegar aos meus ouvidos, mesmo não gostando.
Acho que estou hoje em dia onde estou (com estúdio de produção em SP mais DJ do Caldeirão) justamente por não ter o menor preconceito com nenhum tipo de música e também por ser “Pau pra toda obra”. No que rolava de trampo eu estava sempre interessado e me metia no meio. Aprendi de tudo um pouco com isso.
3. O que você faz atualmente? Qual sua especialidade? No que você é realmente bom?
Atualmente tenho uma produtora de áudio em São Paulo. Faço de tudo: desde jingles, vinhetas, trilhas, efeitos, podcasts e tudo mais relacionado a áudio. Somos especializados em áudios “tailor-made”. Ou seja, você pede algo extremamente específico, nós atendemos.
Fui um dos primeiros a fazer podcasts, na verdade fiz o primeiro podcast corporativo do Brasil, a Rádio Heineken, que está no ar até hoje, desde 2005.
Sou bom em produzir trilhas e ambiências para sites. E também em fazer podcasts. Gosto muito e sei que faço bem.
Outra coisa que faço bem é remix. Remix basicamente é você ter um ego maior do que o produtor da música original, e achar que pode melhorar ou fazer diferente alguma coisa de uma música de sucesso. O famoso “arquiteto de obra pronta”. Já fiz remixes pro Lulu Santos, Ana Carolina, Ed Motta, Morcheeba, Enya, Jota Quest, e muitos outros mais. Recentemente fiz remix para o Black Eyed Peas e para o Tiesto.
E DJ também. Sei fazer, modéstia à parte faço muito bem feito e me adapto a qualquer tipo de som que precisarem, apesar de ter um gosto próprio e tocar o que eu gosto algumas vezes.
4. Conte um pouco do seu cotidiano.
Acordo cedo, levo as crianças na escola e já sento na frente do computador. Checo tudo de emails e feeds, resolvo algumas pendências e começo a trabalhar. Geralmente tem alguma produção mais urgente que corro que nem louco até a hora do almoço.
Na hora do almoço faço o ADD, meu podcast diário, e volto a tarde pra finalizar outros assuntos. Algumas gravações de locução esporádicas (gravamos as locuções do People & Arts, por exemplo), alguns músicos no estúdio de vez em quando também.
A cada 15 dias vou para o RJ gravar o Caldeirão no ProJac. Saio cedo, pego avião, vou até o ProJac, gravamos o dia inteiro (uso 5 CDJs mais 1 computador pra sonorizar o programa todo “ao vivo”), e volto geralmente no mesmo dia para SP.
Quando tem festa ou algum evento noturno, tenho que correr mais no dia anterior, para poder descansar na manhã seguinte ao evento… Finais de semana tento viajar. Sempre.
Link YouTube | Para quem não sabe, Billy explica o que é um podcast
5. Uma história ou uma cena que fez todo o esforço valer a pena.
Olha, nessa eu travei. Fiquei pensando em algum momento bonito, onde crianças carentes vinham até mim falando que a vida delas mudou porque começaram a trabalhar como DJ, mas não lembrei de nada parecido que tenha ocorrido comigo.
Alguns momentos legais valem a pena, mas o dia-a-dia é que é bacana.
Tocar uma música legal na hora certa de um evento ou de uma festa, realmente criar um clima “pra cima” numa festa e o povo não te deixar sair das pickups mesmo com o sol nascendo (é um saco, mas no fundo é gratificante). Criar músicas e trilhas legais bem comentadas e, ao ver o resultado, perceber que valeram todas aquelas horas não dormidas.
Acho que é meio isso. Um pouco de cada coisa. Sempre tem algo gratificante rolando.
Ah, e tem dia que não sai absolutamente nada. Você pode levar as músicas mais legais do mundo, tocar uma atrás da outra numa festa. Mas se o povo não quer dançar, não vão dançar e ponto final. Isso já aconteceu, principalmente em eventos.
6. Quais os mitos da profissão?
O mito de que DJ come toda mulher que aparece na cabine. Mito. Só se for DJ que usa CD pré-mixado.
Na época em que comecei a tocar, eu era um simples “Trocador de discos with brains”. Hoje em dia tem toda essa idolatria em cima do DJ, mas o cara que realmente leva a sério está lá pra divertir todo mundo, não para se divertir. Lógico que o trabalho é bem divertido, mas no fundo você tem de divertir os outros, senão não é um bom DJ.
Outro mito é que “aquele-DJ-é-melhor-que-aquele-outro-que-não-toca-psy-mas-o-que-toca-house-é-melhor-que-o-que-toca-música-ao-contrário”. Isso também não existe. Lógico que tem aqueles DJ que são bons, técnicos, criativos, que conseguem levantar uma pista com poucas músicas e levar a noite toda com a pista cheia. Lógico que tem.
E é lógico que tem aquele DJ que a gente gosta mais que o outro. O bom DJ é aquele que toca música boa na hora certa para o público certo.
Não adianta um DJ de house music chegar num forró e querer tocar Barbara Tucker “I get lifted” (um clássico da house). O cara vai ser vaiado.
O bom DJ é aquele que chega no forró e toca os melhores forrós, os mais legais, numa sequência bacana.
7. Quais os erros de outros DJs que deixam você com vergonha da profissão?
Três coisas.
Apostar no fácil. Lógico que se você tocar só música conhecida e vamos vc vai ter a pista cheia a noite toda. Mas qual a graça do ouvinte chegar na balada e ouvir as mesmas músicas sempre? Que tal um pouco de inovação?
Tem lugares que eu vou que dependendo do DJ eu acabo adivinhando a sequência que ele vai fazer. De tão óbvia.
Pô, um pouco de inventividade, uma quebra de ritmo aqui, uma aposta em alguma novidade legal ali, não esvaziam a pista de jeito nenhum. Nem dá tempo. Até porque se o povo não gostar, você já vira outra e pronto…
DJ, ou melhor, proto-DJ que diz que toca Psy. Nada contra o estilo, nem nada contra quem realmente toca Psy. Só que o Psy tem uma pegadinha super fácil de mixar. Qualquer Psy que vc ouvir tem uma parte que o ritmo some e fica só umas camas de teclado. Pronto. É a hora que o “proto-DJ” de Psy vira as músicas. No ritmo? Pra quê? No tempo? Ah? Tempo? Isso me irrita profundamente.
Já vi bons DJs de Psy que chegaram a mixar “Thriller”, do Michael Jackson, no meio do set sem perder o ritmo. O povo foi a loucura. E eles não deixavam as músicas chegarem nessas partes sem ritmo… Isso sim é um bom DJ de Psy.
DJ que não leva fone pra tocar. Ferramenta de trabalho. CD, vinil, computador… Nunca peça emprestado fone para outro DJ. Isso mostra que o cara ainda não é DJ. Simples assim.
8. Mulher: melhor trabalhar ao lado dela, melhor mantê-la longe ou nenhum dos extremos?
Melhor trabalhar ao lado dela. Ainda mais quando ela cobra e você cria.
É o que acontece no estúdio. Minha esposa é minha sócia. Eu não sei cobrar, só criar. Ela sabe cobrar, e deixa a criação comigo. A melhor coisa. Assim pelo menos ela sabe a quantidade de trampo que tá rolando e não fica ligando a cada 5 minutos na empresa pedindo pra você voltar pra casa logo. 😉 Mas tem que ter a hora de parar também.
9. O que você diria para quem está querendo se tornar um DJ?
A primeira e mais importante coisa que um aspirante a DJ tem que fazer é ouvir música. Qualquer tipo de música: clássica, house, rock, dance, anos 50, 60, 70 80,90, 200, forró, embolada, sertanejo, funk, psy, trance, drum’n’bass…
Não que você tenha que gostar, mas pelo menos conhecer pra poder falar se gosta ou não. Se você não ouvir, nunca vai saber se é legal ou não, se encaixa em algum set seu ou não.
Imagina só vc um top DJ de House, que é contratado pra tocar em Barretos. Nada mais simpático e “ganha-galera” do que meter um sertanejo no meio do seu set. Nem que seja por 30 segundos. Mas tem que conhecer pra tocar o sertanejo certo.
A segunda coisa mais importante é aprender a mixar direito. Pode ser no vinil, no CD ou no computador. Mas tem que ter noção de tempo, de corte, de ritmo, de volume e de onde uma música começa e outra termina.
A terceira coisa é treino. Qualquer lugar é lugar. Se der pra comprar o equipamento, ótimo. Se não der, qualquer lugar é lugar pra treinar. Peça pro DJ da balada pra você abrir a pista, tocar antes do povo entrar… Pode ter certeza que, se ele for um cara bacana e seu amigo, ele deixa você brincar no equipamento. E ainda vai te pagar uma breja. Ou não. A breja acho que não. Mas você vai liberar o cara pra posar de gostosão para as menininhas que vão chegando.
Ou arrume um software de mixagem e treine em casa. Monte sets, acerte os tempos, as viradas, mostre aos amigos e pra quem você acha que entende do assunto.
10. O que você demorou muito tempo pra aprender e agora pode resumir em poucas palavras?
Conheça todo e qualquer tipo de música.
Demorei até meus 18 anos pra entender isso. Imagina um cara que tinha uma banda cover do Joy Division ouvindo Gloria Gaynor… Não rolava, né ? Mas tornou-se necessário conhecer a Gloria Gaynor. E tem gente que gosta. Você pode topar com um desses em alguma balada que tocar…
Aprender inglês também é básico.
11. Quais seus outros interesses, práticas e habilidades?
Gosto muito de viajar, viajo sempre que posso.
Pratico Tai-chi e gosto de plantar. Mesmo. Arbusto, árvore, flor, qualquer planta. Me divirto com isso.
12. Faça uma pergunta que gostaria muito que alguém que te perguntasse. E responda.
–Pô, Billy, você faria tudo igual de novo ?
–Não. Faria exatamente as mesmas coisas, só que com mais afinco.
Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.