Tenho tido o prazer de acompanhar mais de perto o time de conteúdo do PdH durante os últimos 2 meses. Ressalto o “mais de perto” porque acompanhar, de longe, eu já acompanho há pouco mais de 6 anos.
Eu era fã de carteirinha, daqueles bem chatos. Daqueles que mandam e-mails – muitos, muitos mesmo – para os editores, querendo publicar texto. Daqueles que comentam no blog pessoal dos editores, querendo publicar texto. Daqueles que comentam no blog pessoal da namorada dos editores, querendo publicar texto. Daqueles que abordam os editores em eventos do PdH, querendo publicar texto. Não estava fácil.
Eu gostava do site, basicamente, por conta do contos e crônicas. Lia todos. Acho lindo quem consegue escrever sem desperdiçar palavra. Cada conjunto de letras ali tinha uma função, não tinha ninguém à toa.
Atualmente, aqui na firma, estamos enfrentando um choque geracional. Enquanto a turma mais antiga tem 30 e alguns, a molecada que entrou recentemente não completou 20. Recém-saídos das fraldas, esses meninotes (sempre quis usar essa frase).
Conversando com os jovenzinhos na última reunião de conteúdo, eu percebi que tem uma batelada de textos que passaram desapercebidos para os que não acessavam lá pelos idos de 2010, 2011 e 2012.
Essa tem sido uma preocupação por aqui: como valorizar o contéudo atemporal? Como mesclar o conteúdo inédito, produzido todos os dias, com a prata da casa, produzida há coisa de 5, 6 anos atrás?
Vou fazer minha parte e agrupar, por aqui, alguns dos textos da nossa coleção de crônicas e contos. Pra ler devagar, parágrafo por parágrafo, em tela cheia, sem muita aba em volta.
Vamos lá.
“João e Maria na cama”, por Rodolfo Viana
Ela chegou com fome, com fúria. Me apertava ainda no hall do prédio. Mordia. Machucava. Marcava. Cravava as unhas nas minhas costas. No quarto, berrava palavrões, me xingava de puto, me dava tapas. Mesmo esgotado, eu a desejava com cada fibra de músculo do meu corpo. Corpo este marcado pelas unhas de Maria, que me rasgara a carne e me roubara a alma. continuar lendo…
“Análise combinatória”, por João Baldi
Ele achou que tinha com ela mais coisas em comum do que com qualquer outra garota que já tinha conhecido, assim como viu nela as diferenças mais fascinantes que já tinha reparado. Tinha sido bailarina, morou dois anos na Turquia, sabia falar japonês. Mas ela gostava de Matt Sharp, tinha fechado Marvel x Capcom num fliperama e riu da piada sobre a polícia do cereal. Na última meia hora ela viajou com a cabeça encostada no ombro dele e ele só não tentou um beijo porque ela parecia estar dormindo. Mas antes disso ela falou que nunca ler errado uma passagem tinha dado tanta sorte. continuar lendo…
“Minha vida amorosa é uma barraca de pastel”, por Jader Pires
Só que, com o passar dos minutos, percebo que ela evita trombar os olhinhos dela com os meus e, mais ainda, ela se poupa de ter que ir até a ponta da barraquinha em que eu me encontro. Ela me evita. E eu só queria me apresentar e mostrar que eu sou, sim, um cara legal e que posso muito bem ser digno de comer os pastéis dela. continuar lendo…
“O malandro morreu”, por Rodolfo Viana
Sem que a mulher protestasse, em pouco tempo estavam numa construção ao lado do barracão. Logo ela gemeu um “eu sempre te quis, nego, e sempre soube que te teria”. Repetia a frase e era interrompida por beijos e mordidas de Dadá. Com a morena nua nos braços, colados corpos, haveria de valer a pena o acordo com o diabo. Ele queria ir devagar; ela estava em êxtase e lhe arranhava a carne. “Eu sempre soube que te teria, nego.” Emaranhada nos pelos e beijos de Dadá, Beatriz rasgava a pele do malandro. Contorcia-se bruscamente, apesar de nem terem começado de fato. Num de seus solavancos, arrancou do peito de Dadá o escapulário. continuar lendo…
“Os mesmos olhos”, por Alex Castro
Com certeza, não faltaram bons lares para os olhos verdes da Esmeralda. Mas quem levamos pra casa foi a Sabrina. Os anos se passaram e o pingo de doce de leite logo se transformou em um tonel de doce de leite. Sempre linda. Sempre com aqueles olhos. continuar lendo…
“Não existe amor em SP”, por Jader Pires
Aqui, nesse velho quilombo de todos os brasileiros, crescem desordenadamente os bairros e a vontade de viver aqui. Quando brota o amor por São Paulo, aí fudeu. São Paulo vicia, tanto ou mais do que todas as pedras que a cracolândia tem pra oferecer. Chega até a dar um orgulho estranho e torpe daquilo que é feio. “É violento, tá estragado, só sujeira, mas é nosso”. E quem ia poder julgar? continuar lendo…
“And the last thing I saw was you”, por João Baldi
Mas enquanto ele tentava puxar o ar necessário pra dizer de uma só vez isso tudo ela colocou a mão no ombro dele e disse “Calma, respira… senta aqui, bebe um copo d’água e aí você fala comigo, calma…”. E ele se sentou, e ele pegou o copo d’água, e ele bebeu. E claro, nesse meio tempo ele pensou. continuar lendo…
“O primeiro nada”, por Rob Gordon
— Se com apenas uma costela você criou a Eva, aposto que com outra costela daria para resolver isso. Daria e sobraria, aposto. Se o Senhor quisesse, daria para também colocar mais um seio, ou aumentar os dois que já estão lá. continuar lendo…
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A seção de crônicas e contos continua crescendo, ganhando novos textos toda semana, e com espaço para novos autores. Ah, não esquecer: a cada 15 dias, sempre às sextas-feiras, tem texto novo na coleção do amor. É aquele sofrimento bonito, obra do Jader Pires.
Para fechar, seguindo a nostalgia boa, vou tomar a liberdade de recomendar mais duas crônicas, que não foram publicadas por aqui, mas, enfim, chega de bairrismo.
Mamões e casamento, por Bruno Palma
Pois hoje, dia do último mamão, minha mulher acordou mais cedo –normalmente eu me levanto meia hora antes– e, quando eu saí do banho, ela já tinha tomado café da manhã e cantarolava no quarto. Fui para a cozinha e estava lá meu cereal, o leite, o pão, os frios e uma metade de mamão. Na hora, lembrei dos pontinhos podres e virei o bendito para ver: imaculado. Minha esposa acabara de ficar com o pedaço ruim. continuar lendo…
Blowing in the wind, por Antonio Prata
Foi a Maria, minha irmã mais nova, sentada próxima a janela da esquerda, quem deu o alarme: “Ó lá ela chupando o pinto dele!!!”. A Julia pisou na minha barriga, passou por cima de mim e também grudou a cara na janela, eu levantei correndo mas só cheguei a tempo de ver uns vultos dentro da Variante bege parada no acostamento. A Maria jurava ter visto direitinho: o cara pelado, uma mulher chupando-lhe o pinto. continuar lendo…
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Deixo o convite para o papo nos comentários: dentre as crônicas publicadas no Papo de Homem, qual sua preferida? Qual é antiga e merecia estar nesse post?
E para quem compartilha o apreço pelo gênero: qual sua crônica preferida? E conto?
Aguardo as recomendações.
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