Manu Ginóbili, possível Hall da Fama derrotado nas finais da NBA, nos ensina a perder

Um dos maiores jogadores sul-americanos na NBA, que ontem pode ter feito sua despedida perdendo a final da conferência oeste, nos ensina um pouco sobre a presença do fracasso

O ginásio em coro gritava o nome de Manu Ginóbili quando decidi escrever este texto.

Os jogadores de ambos os times batiam palmas, a torcida emendava os eufóricos "manu" com gritos que me fazia crer que poderia estar assistindo uma partida de nosso futebol, e não um jogo da mais alta liga de basquete com seus ginásios normalmente insossos.

Mais de um minuto de aplausos e um impagável momento ao fim: Greg Popovich incentiva e pergunta se Ginóbili gostaria de voltar a quadra.

Sim, era uma festa, e o detalhe mais curioso, aquele digno das narrativas de realismo mágico que só os mais hábeis latinos são capazes de criar: seu time perdia por concisa vantagem.

A diferença beirava os vinte pontos e a torcida já havia aceitado a derrota. Os torcedores festejavam ainda assim. Celebravam os possíveis últimos momentos do ala argentino que por quinze temporadas vestiu a camiseta do Spurs, conquistando quatro títulos e se tornando um ídolo. 

Hoje já podemos apontar, sem muito medo de estar errado, que Manu foi o maior jogador sul-americano a atuar na NBA. Suas conquistas e o respeito que todos tem por sua carreira mostram isso.

E mesmo que Ginóbili não tenha anunciado a aposentadoria e ainda não tenha decidido nada, grande parte dos torcedores e da mídia enxergaram o momento desta forma. E fizeram um merecido reconhecimento para aquele que é um forte nome para estar no Hall da Fama do esporte.

Homenagens à parte, o fato é que Manu estava sendo eliminando de forma incontestável das finais que tantas vezes ganhou. O Golden State vencia o quarto jogo e varria, usando um jargão do esporte, o time do San Antonio da competição. Acabava assim seu sonho de mais um anel. 

Impossível foi não lembrar da entrevista que o mesmo Ginóbili concedeu após o terceiro jogo, poucos dias antes, em outro momento onde o Spurs também sofreu um revés. Questionado sobre como o time deveria jogar na partida de ontem para ter a chance da vitória e não ser eliminado, deu uma resposta cheia de clareza e experiência. 

"Pra gente ganhar, a gente precisa jogar num nível nota 10 e eles precisam jogar num nível 7. Precisamos tentar fazer com que eles joguem um 7 e precisamos jogar nosso melhor jogo. Sabemos que será muito difícil. A gente não sabe o que vai acontecer com o Kawhi [Leonard. Um dos principais jogadores do San Antonio, machucado na primeira partida. Era incerteza para o quarto jogo]. Então temos que ir lá... Competir. Se sentir bem. Dar tudo o que temos. Se for o suficiente, ótimo. E se não for o suficiente, ótimo também. Você aperta a mão deles, deseja boa sorte e vai pra casa. Abraça seus filhos, acorda no dia seguinte e a vida continua."
 

(legenda do vídeo e tradução é da página Homens brancos não sabem blogar)

O que chama minha atenção é a serenidade presente na fala, pouco comum nos discursos do mundo dos esportes de alto nível. O "temos que vencer a qualquer custo" que permeiam as competições é substituído por um "nosso compromisso é dar nosso melhor, mas alcançando a vitória ou derrota, seguimos com a vida sabendo que fizemos o que podíamos". 

É fala vinda dos ensinamentos que os anos e as vitórias que vieram com eles trazem.  Sim, a conquista é parte crucial na criação dessa menor obsessão, vejo eu. Diferente de um discurso juvenil, que parte da ânsia cega pela glória, ignorando todas as consequências que essa busca pode trazer, a reflexão do Ginóbili parte de outro lugar. Nasce desse entender que, tal qual a já conhecida glória, o fracasso sempre está presente, mostrando sua cara sempre que pode. E ele faz parte da vida, não há como controlá-lo, mas podemos, unicamente, controlar nosso papel a fim de evitá-lo. E nem sempre conseguimos.

Adoramos pensar que ele não é uma opção. Às vezes é, queiramos ou não. Imagem dO Lugar.

Reflexão parecida encontrei no nosso último Caixa Preta e no discurso de diversos outros campeões. Igualmente próxima foi a fala de alguns executivos com altos cargos. No mais, que honra tem os companheiros de equipe de Manu, por conviverem e aprenderem com tamanha experiência. Que honra temos nós, por termos a oportunidade de escutarmos lições como essa enquanto ele ainda esteve em quadra.

Porque parece existir um momento, que vislumbro de maneira turva estando na casa dos vinte e em busca de conquistas, em que o fracasso dói, mas não se impõe como o fim de tudo. Que a pele calejada entende que ele sempre esteve ali. E sabe que, no fim do dia, como bem dito, sempre voltamos para casa. No dia seguinte, acordamos e seguimos com a vida. E começamos uma vez mais.

Agora, curioso, como vocês enxergam e lidam com o fracasso por aí? Seguimos a conversa nos comentários. 


publicado em 23 de Maio de 2017, 17:53
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Bruno Pinho

Estagiário do PapodeHomem e estudante de jornalismo.


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