hipocrisia é que nem celulite. todo mundo tem. então, nem faz sentido haver uma palavra só para isso.
se hipócrita é quem fala uma coisa e faz outra... então, quem não é? quem passaria nesse teste? quem não tem ideais éticos e princípios morais que nem sempre consegue seguir?
aliás, por definição, nosso ideal de conduta é aquela conduta que nem sempre conseguimos praticar no dia-a-dia.
a única pessoa realmente não-hipócrita seria aquela sociopata que chutou o balde e nem mesmo está tentando ser uma pessoa melhor.
enquanto isso, aqui no mundo real, somos todas a batedora de panela que corrompe o guarda, a vegetariana que ama croquete de rodoviária, o homofóbico que não resiste a chupar um pau, a minimalista que troca de iphone todo ano.
aí, a gente faz a merda, trai nossos princípios, se sente mal, promete nunca mais cair em tentação, faz o melhor que pode, falha de novo, e assim vamos vivendo.
o problema do deputado homofóbico flagrado chupando pau não é ele ser um hipócrita que defende leis homofóbicas e, de noite, chupa pau.
não. o problema é SÓ ele ser homofóbico — o que ele faz de noite é irrelevante.
se queremos julgar as pessoas, ok, vamos julgá-las por seus princípios detestáveis e ofensivos, não por sua hipocrisia em viver de acordo com eles.
porque, afinal, quem consegue realmente viver de acordo com seus ideais e princípios?
nada pode ser mais hipócrita do que acusar alguém de hipocrisia.
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maquininhas de autojustificação
pessoas auto-proclamadas experts, que vivem de fazer previsões políticas, econômicas, etc, quase sempre têm uma média de acerto pior do que pessoas aleatórias sem conhecimento algum.
como conseguem explicar para si mesmas esse baixíssimo índice de acertos e ainda assim continuar se considerando experts, continuar indo para a televisão dar entrevistas prevendo o futuro?
é simples.
para os seus próprios erros, elas sempre têm uma série de explicações generosas e plausíveis:
1. foi um acontecimento completamente inesperado e sem precedentes que não poderia ter sido previsto;
2. o acontecimento na minha área foi influenciado por um outro acontecimento em outra área onde não tenho expertise e que eu não poderia antecipar;
3. na verdade, minha previsão quase se realizou, mas aí aconteceu aquela coisa na véspera, alguém morreu, alguém passou uma lei, etc, e mudou tudo;
4. minha previsão foi tão influente que fez as pessoas mudarem de comportamento, evitando assim aquilo que eu disse que aconteceria, etc.
o mais interessante é o que acontece quando você pede para essas mesmas experts explicarem o baixíssimo índice de acerto de suas colegas e competidoras na mesma área de conhecimento:
"ah, pura charlatanice, né? essa aí não sabe nada. completamente ignorante. não sei como ainda levam a sério. deviam proibir de dar entrevista, etc."
(exemplos tirados de "a lógica do cisne negro", de nassim nicholas taleb, e "rápido e devagar - duas formas de pensar", de daniel kahneman.)
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é um de tantos paradoxos da vida narcisista: julgamos os outros por suas ações, mas queremos sempre ser julgadas por nossas intenções.
quando dirigimos perigosamente e alguém nos xinga, ainda nos damos ao direito de nos chatear:
“porra, será que ele não vê que estou com pressa? respeito as leis do trânsito todo dia, mas hoje tenho aquela reunião importantíssima!”
não interessa o que seja: ou agimos certo (e o mundo tem que reconhecer e nos premiar, senão é muita injustiça) ou agimos errado, mas por um motivo totalmente válido (e o mundo tem que reconhecer e nos entender, senão é muita injustiça).
a dissonância cognitiva das experts não é (necessariamente) porque são malandras charlatãs hipócritas tentando nos enganar:
é porque são pessoas humanas SE autoenganando, tão egocêntricas e tão narcissistas quanto todas nós.
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hoje em dia, tento realizar o movimento oposto:
sempre que me flagro justificando ou racionalizando meu próprio comportamento, eu páro, desconfio, questiono.
porque eu sei que não sou melhor que ninguém:
somos todas maquininhas de autojustificação.
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desenvolvo esses temas nos exercícios de empatia e no texto o mal é a falta de atenção.
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publicado em 11 de Abril de 2016, 12:21