A marca do bom relacionamento

Quando está com a outra pessoa, você é quem gostaria de ser?

Relacionamento bem-sucedido é aquele onde gosto da pessoa que eu sou quando estou com a outra pessoa.

O pior relacionamento é aquele que me transforma em alguém que não quero ser.

* * *

Lúcia me amava muito, mas achava que “não dava para viver de amor em uma cabana” e que eu tinha que investir mais na minha carreira de consultor de internet e menos nessas “besteiras” (ela jamais seria boba de usar esse termo, mas estava implícito) de literatura.

Eu poderia dizer que ela amava uma pessoa que não existia, uma projeção, etc, mas seria uma inverdade e uma injustiça. O homem que ela amava existia mesmo e foi a pessoa que vesti por muito tempo. Por oito anos, fui dono de minha própria consultoria de internet e trabalhei com algumas das maiores corporações do Brasil: Vivo, Embratel, Petrobrás, Banco do Brasil, etc.

Mas não era o homem que eu queria ser.

(Nem nunca foi: abri a empresa com minha amiga, a artista plástica Isabel Löfgren, e o objetivo da empresa para nós sempre foi nos possibilitar viver nossas vidas de artistas.)

Porém, a cada vez que eu fazia menção de tentar ser mais a pessoa que eu queria ser, Lúcia resistia, pois eu estava sendo menos a pessoa que ela amava e nada é mais compreensível e bonito do que lutar pela pessoa que se ama.

Ela me ajudou a perceber que relacionamento bem-sucedido é aquele onde eu gosto de ser a pessoa que a outra ama.

* * *

Lúcia era uma pessoa incrível, que eu amei pelos mais numerosos motivos. Mas reparem que o texto praticamente não fala dela.

Porque a verdade é que a pessoa que ela era não faz diferença.

Nosso primeiro e mais importante e mais permanente relacionamento é com nós mesmas.

Se eu não estou bem comigo mesmo, se não sou a pessoa que quero ser, se não estou em sintonia com meus próprios sonhos, vontades, anseios, então não existe, de fato, ninguém aqui para amar essa outra pessoa ali.

Se eu não quero ser a pessoa que a outra ama… então, o relacionamento não tem chance.

Independente da pessoa incrível que ela seja.

* * *

Lúcia e eu nos amamos por cinco anos. Foi o relacionamento mais longo da minha vida. Quando tomei a iniciativa de terminar, doeu uma dor que eu não acreditava ser possível. Sofri por dois anos, dois longos anos.

De repente, em lugares públicos, eu desabava, começava a chorar e chamava, gritava por ela. Chorei por ela no French Quarter, em Nova Orleans, no Parque das Nações, em Lisboa, no Parlamento Nacional, em Dili, no Timor-Leste. Marquei o mundo com minhas lágrimas como um cachorro marca a vizinhança com seu mijo.

(Desses 24 meses de choro, 18 foram passados longe do Rio, minha época de mais saudade de casa, o que seguramente só piorou o meu estado emocional.)

Aí, foi passando e, um dia, passou. Como passaremos todas, como passará tudo.

E, quando passarmos, a questão que sobrará é: conseguimos ser as pessoas que queríamos ser?

* * *

Os encontros "As Prisões"

São instalações artísticas, polifônicas e interativas, improvisadas e colaborativas, onde praticamos escutatória e atenção, generosidade e cuidado, e exploramos os limites e possibilidades da comunicação cotidiana: o que falamos?, como falamos?, por que falamos?

O nome vem de uma série de textos que estou escrevendo desde 2002, tentando mapear todas as Prisões cognitivas que acorrentam nosso pensamento: Verdade, Dinheiro, Trabalho, Privilégio, Monogamia, Religião, Obediência, Sucesso, Conhecimento, Felicidade, Autossuficiência,  Patriotismo, e a maior de todas, Eu.

Os encontros, realizados por todo o Brasil desde 2013, reúnem de dez a trinta pessoas, duram de um a cinco dias e são sempre diferentes, imprevisíveis, únicos.

Neles, enquanto discutíamos "As Prisões", os Exercícios de Atenção foram criados, gestados, aperfeiçoados, em um processo colaborativo com as pessoas participantes. Hoje, os encontros servem para praticarmos esses exercícios e para inventarmos juntas os próximos, em um processo que só poderia acontecer presencialmente, olho no olho e lágrima no suor.

Ninguém é obrigada a falar: toda fala é voluntária.

Ninguém é obrigada a pagar: todo pagamento é voluntário.

Para saber quando serão os próximos, visite minha página de eventos.

* * *

Assine a newsletter do Alex Castro


publicado em 13 de Outubro de 2017, 04:15
File

Alex Castro

alex castro é. por enquanto. em breve, nem isso. // esse é um texto de ficção. // veja minha vídeo-biografia, me siga no facebook, assine minha newsletter.


Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.

Sugestões de leitura