4 linhas pedagógicas e porque você deveria considerar escolas "alternativas"

Cuidar de um filho ou filha envolve um número praticamente infinito de decisões, mas talvez uma das mais importantes seja qual o tipo de educação que você espera de uma escola.

Certa vez uma escola de pedagogia "não tradicional" iniciou suas atividades em uma cidade e, para atrair novos alunos e começar sua operação, a escola entrou com valores de mensalidade mais acessíveis em relação às escolas daquela cidade. Os pais, empolgados com a economia, não pensaram duas vezes, matricularam suas crianças nessa escola e, assim, as turmas ficaram cheias logo antes do ano letivo começar.

Alguns meses depois, começaram a surgir dúvidas e até mesmo reclamações de alguns pais, nada de apostilas, aulas expositivas e professores autoritários, não havia pressa para alfabetizar os pequenos, nem a pressão para que os mais velhos pensassem apenas no vestibular.

Alguns se chocaram ao descobrir que aquela escola não era nada parecida com a escola que eles estudaram quando crianças.

E, infelizmente, ao invés dos pais dialogarem e estarem abertos a conhecer sobre o que se trata aquela pedagogia diferente, preferiram tirar seus filhos e colocarem de volta em uma escola mais tradicional.

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Cuidar de um filho ou filha envolve um número praticamente infinito de decisões, mas talvez uma das mais importantes seja qual o tipo de educação que você espera de uma escola.

Pode até parecer que escola é tudo igual, que basta escolher a que cabe no orçamento e então ela vai colocar seu filho pra fazer as atividades, passar o dia lá e ficar tudo bem. 

Existe também uma noção equivocada e perigosa de se tratar a escola como um prestador de serviços, onde a gente contrata um fornecedor e eles ficam responsáveis por cuidar da educação dos pequenos enquanto estamos trabalhando, mas essa é a mentalidade que vai gerar problemas pra todo mundo e todos saem perdendo: professor, coordenação, pais e alunos.

Eu já falei anteriormente sobre alguns pontos importantes a se observar antes de escolher a escola, mas ali, por causa do tamanho do texto e a necessidade de passar por diversas dicas, não aprofundamos em algo fundamental: conhecer as linhas pedagógicas que as instituições podem seguir.

Hoje chegou a hora de fazermos exatamente isso.

A pedagogia tradicional

A educação não é algo que foi criado e ficou parado no tempo. Há muitas pessoas que pensaram e pensam a forma como ela é feita e, claro, existem diferenças consideráveis no que diz respeito ao período e espaço analisados. Mas há uma recorrência de conceitos e práticas ao longo da história.

Segundo o filósofo e pedagogo brasileiro Dermeval Saviani, a “Concepção Pedagógica Tradicional ou Pedagogia Tradicional foi introduzida no final do século XIX com o advento do movimento renovador que, para marcar a novidade das propostas que começaram a ser veiculadas, classificaram como ‘tradicional’ a concepção até então dominante”.

Algumas características dessa concepção são:

A escola como mantenedora do status quo: ou seja, os alunos não são exatamente ensinados a pensar e questionar. Ao invés disso, são incentivados a absorver conteúdos morais e intelectuais que os preparem para se adaptar à cultura e às exigências daquela sociedade. Aquilo que eles ensinam vem como uma verdade, deve ser entendido como o certo e, portanto, aceito.

O professor como figura central: o professor é o detentor do conteúdo e da verdade. Ele fala, o aluno ouve. Existe um silêncio imposto para que esse canal de autoridade possa acontecer.

A metodologia é burocratizada, focada em aulas expositivas, onde o professor fala e depois oferece exercícios repetitivos para que os alunos possam gravar e reproduzir a matéria dada. Depois, ocorre uma avaliação padronizada que vai determinar o grau de aprendizado e dizer se o aluno está apto ou não.

Falando a grosso modo, essa é a pedagogia tradicional, que ainda é a mais comum.

Então, quando falo em escolas com "pedagogia alternativa", falo em escolas que se afastem mais ou menos desse padrão encaixotado de ensino que foca em tornar seu filho ou filha em uma ferramenta para o vestibular e para o mercado de trabalho - ainda que com a revolução tecnológica acontecendo, o perfil do profissional desejado mudou bastante.

A pedagogia Construtivista

A pedagogia construtivista é baseada nas ideias de Jean Piaget, que foi biólogo mas deixou um imenso legado para a pedagogia.

Ele foi responsável por criar o conceito da teoria do conhecimento centrada no desenvolvimento da criança. Paradoxalmente, a maior força desse método se baseia nas limitações do aprendizado. Parte-se do pressuposto de que não dá pra fazer uma criança absorver aquilo que ela ainda não está pronta para aprender.

Para isso, busca-se estimular na criança a curiosidade, por meio da experimentação, da convivência e de atividades em grupo, sem esquecer a individualidade de cada aluno.

Na pedagogia construtivista, o aluno é o protagonista do seu aprendizado. O conhecimento se dá por descobertas próprias, feitas pelo estímulo ao buscar. Aqui, o professor não surge como um palestrante que transmite conteúdo, mas como um agente que visa estimular essa busca. Como cada aluno tem um processo que vai ser diferente, não há uma avaliação padronizada como na pedagogia tradicional. 

Como relato pessoal, o construtivismo foi a pedagogia que escolhi para minha filha. As crianças são naturalmente curiosas e, para mim, faz total sentido que o professor instigue para que a curiosidade vire conhecimento.

Na escola da Clara não há apostilas. Lá eles acolhem e proporcionam experiências, valorizando a criança como um ser rico em potencialidades, e respeitando sua individualidade. 

Todo ano o aprendizado gira em torno de um projeto central, que este ano por exemplo, é "Segredos do Papel". Ou seja, além das atividades lúdicas, jogos, músicas e brincadeiras, a experiência com o projeto e a sua construção, estimula o aprendizado, solidifica e torna o conteúdo escolar apresentado mais atrativo e interessante, possibilitando o desenvolvimento nos mais diversos aspectos.

Antes que me perguntem da escola da minha filha nos comentários, ela estuda no Jardim dos Pequenitos/ Il Sole, em Santo André, em São Paulo, de pedagogia construtivista e na filosofia educativa inspirada em Reggio Emília, referência no Brasil e também na formação de educadores. 

A pedagogia Waldorf

A Pedagogia Waldorf foi criada pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner, curiosamente, a pedido do dono de uma empresa que fabricava cigarros(!), a Waldorf. Por isso, o nome.

Para a pedagogia Waldorf, é necessária uma forte base emocional para que o desenvolvimento intelectual possa acontecer.

A metodologia é pensada em setênios. Assim, trabalha-se com especial atenção o período dos 0 aos 7 anos de idade, com brincadeiras e jogos ao ar livre. A ideia é estimular os sentidos, a imaginação e a criatividade.

O aluno é olhado de maneira holística, ou seja, levando em conta todos os aspectos do corpo, da mente e do espírito. Há um cuidado com todos os detalhes, da arquitetura da escola, pensada para favorecer o livre brincar e a autonomia, da alimentação e até da relação com a família, que precisa estar próxima, para criar um ambiente que deixe a criança segura para poder explorar e se desenvolver.

Para cada setênio, há um tutor que acompanha a criança por todo o período. Não há avaliações, mas a evolução entre os ciclos é acompanhada por anotações do tutor. Não há repetição de ciclos, já que eles acompanham o tempo biológico de cada aluno.

Montessoriana

Criado pela pedagoga italiana Maria Montessori, a linha montessoriana se baseia na relação entre experiência e abstração e rejeita a ideia de que deve ser voltada para a conquista de bens materiais, mas sim, para o bem estar, a paz e a felicidade.

O método parte da ideia de que a criança tem potencialidades infinitas que podem ser desenvolvidas por meio da individualidade, da liberdade e da atividade. 

As escolas montessorianas incentivam os alunos a desenvolverem a responsabilidade pelo próprio aprendizado como uma maneira de se tornar mais autoconfiantes.

Leva-se em conta a personalidade de cada criança, por meio do manuseio de certos materiais para aumentar a concentração e o aprendizado. A ideia é que cada criança possa escolher o que deseja aprender naquele dia, respeitando seu ritmo próprio. As atividades são pensadas de forma a aproximar o aluno das artes, da ciência e da música.

O professor atua como um guia, removendo obstáculos ao aprendizado e observando. Não há uma avaliação isolada, uma prova, por assim dizer. 

Uma pequena reflexão do autor

Pensar em educação é, necessariamente, pensar no futuro. Os métodos tradicionais de pedagogia foram criados pensando num modelo de sociedade que vem se transformando.

A pedagogia clássica foi criada num modelo inspirado na revolução industrial e, se pararmos para pensar, a escola tradicional tem muita semelhança com uma fábrica.

O problema é que já passamos da revolução industrial e estamos no meio da revolução tecnológica, com os robôs ocupando posições que antes eram de humanos, e o mercado de trabalho demandando profissionais que tenham um novo conjunto de habilidades que a inteligência artificial não tem.

Em termos práticos, o que os estudiosos sobre o tema dizem é que o mercado vai querer profissionais que se diferenciam e saibam trabalhar em conjunto com robôs e não como robôs.

Hoje muito se fala em profissionais com alto nível de pensamento crítico, capacidade de fazer boas perguntas, levantar hipóteses e se relacionar de forma genuína com outros humanos.

Muitas dessas habilidades são vistas como essenciais nas linhas das pedagogia então ditas "alternativas", que fogem do modelo de escola tradicional que conhecemos.

A ideia desse artigo, mais do que criticar o modelo de educação tradicional, é jogar também a responsabilidade para nós, pais em como desenvolver também em casa essas habilidades que são fundamentais para o desenvolvimento dos nossos pequenos.

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publicado em 29 de Novembro de 2019, 00:05
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Rodrigo Cambiaghi

é especialista em mídia programática, monetização de sites e BI. Reveza o tempo entre filha, esposa, cão, trabalho, banda, moto, games, horta de casa, cozinha e a louça que não acaba nunca.


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