We are all on drugs

Você já parou para pensar por que gostamos de drogas? Não digo o barato que elas causam, mas o porquê de elas funcionarem.

Como uma substância que ingerimos é capaz de agir no nosso cérebro?

Por que raios produzí–las?

Drogas são substâncias produzidas por plantas para defesa. Além dos frutos, que estão lá para serem comidos como forma de dispersar sementes, as plantas não gostam muito de terem partes arrancadas – por não gostar muito entendam que plantas que favoreciam isso já estão extintas.

Para impedir o ataque de predadores secretam substâncias que não têm muita serventia para a planta em si, mas agem nos animais. E uma coisa que os animais têm e plantas não têm é o sistema nervoso, assim o que age sobre o sistema nervoso dificilmente agride a própria planta.

Substâncias como cafeína, cocaína, nicotina, opiáceos, são produzidas por diversas plantas.

Os fungos, que não têm nada a ver com o reino vegetal, mas também estão sujeitos à fome alheia, produzem entre outras o LSD. Até a banana e o alface – diz um conhecido – são capazes de fazer alguém alucinar, se preparados da maneira certa. Funcionam muito bem para insetos e outros animais, entre eles os macacos pelados, em doses fatais para os pequenos, mas fracas o suficiente para apenas nos dar barato.

cogumelo
Cogumelo amanita. Parece gostoso, mas você não é o Super Mario.
© fmc.nikon.d40

Todos usamospsicotrópicos.

O mecanismo de recompensa

Os mecanismos de ação das drogas são bem variados, mas a maioria delas tem algo em comum, a sensação de prazer e o vício.

Nosso cérebro possui um mecanismo de recompensa, algo muito antigo entre os animais e importantíssimo. A cada geração, como sabemos o que comer ou não comer? Do que adianta um cérebro programado para gostar de certo tipo de alimento se o ambiente está em constante mudança e as dietas são bem variadas de animal para animal?

Temos um mecanismo muito mais universal. Quando você come algo novo de grande valor nutritivo, como um sorvete – aquela bola de gordura e açúcar deliciosa – teria sido para um caçador–coletor, seu cérebro recebe a informação de que aquilo é bom e dispara o núcleo acumbente. Essa região bem antiga do cérebro registra o estímulo como prazer, de forma que você se sente bem e incentivado a agir daquela forma novamente, é o mecanismo de recompensa. O mesmo serve para atitudes importantes como o sexo.

cerebro
Transmissão do impulso nervoso do axônio para o dendrito. Um-hum.

Quem comanda os impulsos nervosos que fazem a comunicação no cérebro são as sinapses. Um neurônio não encosta no outro, a ligação entre eles não é física, é química. A terminação de um axônio – prolongamento do neurônio que manda informação –  possui vesículas que secretam substâncias chamadas neurotransmissores que encontram os receptores do próximo neurônio, no dendrito – prolongamento que recebe a informação. Diferentes neurotransmissores são recebidos por diferentes neurônios e mandam diferentes mensagens.

A grande maioria das drogas age como ou através de neurotransmissores. Por mais que atuem em diferentes regiões do cérebro, acabam de uma forma ou de outra liberando dopamina no núcleo acumbente, onde o neurotransmissor desencadeia a sensação de prazer.

A cocaína impede a retomada de dopamina pelo axônio, mantendo uma grande concentração dela na sinapse. Metanfetamina, heroína e o THC, princípio ativo da maconha, estimulam a liberação da dopamina. Já o LSD e o Extasy atuam sobre outro neurotransmissor, a serotonina, e acabam agindo no mecanismo de recompensa por outra via.

(Se estiver com o inglês em dia e quiser como e onde cada uma age, veja essa animação dos ratinhos drogados.)

O estímulo do mecanismo de recompensa age também sobre outras regiões do cérebro, como memória e emoções, gerando associação. Sabe quando um cheiro te traz uma sensação, ou quando você não bebe mas fica meio embriagado com a galera?

link vídeo

Aqui nasce o vício:

Com o tempo, o cérebro perde a sensibilidade à dopamina – “a maconha de antigamente era mais forte” – mas associação continua, e o corpo ainda pede a repetição daquela atitude mesmo que ela não cause mais prazer. Na verdade, para usuários crônicos de drogas situações corriqueiras como ir ao cinema não liberam mais dopamina suficiente, a vida não dá mais prazer.

Claro que tudo depende da droga e da dose utilizada. A associação também tem o seu papel: beber dá vontade de fumar, comer dá vontade de tomar um cafezinho. Em macacos por exemplo – por mais que algumas pessoas se oferecessem para o experimento, é antiético – a maconha sozinha não causa dependência. Mas se for dada a macacos que usaram cocaína, a bendita associação desperta dependência.

Tudo depende de como ou quando você usa, lembrando que eu sou cientista, e não médico. Minha proposta não é discutir se esta ou aquela droga é saudável ou não, e sim como ela é capaz de agir sobre nós. Eu paro por aqui, meu café já não está fazendo mais efeito e uma cerveja vai ajudar a dormir nesse calor.

E você, que drogas você usa e por quê? Pode responder anonimamente.


publicado em 02 de Março de 2009, 17:58
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Atila Iamarino

Doutorando pela USP, biólogo viciado em informação e ciência. Autor do excelente blog Rainha Vermelha e editor do Science Blogs Brasil, o primeiro condomínio de blogs de ciência brasileiro. Vá lá expandir seus horizontes!


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