A nova geração de homens mimados

A nova geração de homens com fraldas não é uma categoria de seres, mas um estado de carência e fragilidade no qual qualquer um pode cair.

É por isso que minha motivação não é ridicularizar tais homens, mas apontar os problemas que surgem quando nos posicionamos desse modo na vida. Escrevo me colocando no mesmo lado dos fracotes, não me opondo, não criticando por fora. Estamos todos no mesmo time e desejamos todos uma vida livre de mimos e carências, não é mesmo?

Destaco 8 comportamentos, 8 tipos de fraldas, que podem ser encontrados na nova geração de homens mimados. Comento cada um deles com o desejo de que todos nós possamos superar tais fixações e cultivar uma mente livre, um corpo potente, uma vida generosa.

 

Qual a sua?

 

Eles não comem mamão

Durante um almoço com a equipe de trabalho, descobri que o estagiário não gosta de suco de laranja com beterraba. Não gosta e não bebe. Em outro almoço, enquanto eu me enchia de mamão, me surpreendi com um: "Hum... mamão eu nunca comi". Sério, isto deveria ser diagnosticado e tratado. Sou do tempo em que todos bebíamos o mesmo suco em família. Nada de "O que você quer?", "Ah, eu quero Coca zero", "E você?", "Água de coco", "E...", "Ai, não, não quero nada".

Não é necessário abandonar as preferências, claro, apenas não ser tão refém de "gosto" e "não gosto". Eu não gosto muito de grão de bico na salada, por exemplo, mas como.

 

Eles sentem "nojinho" no sexo

Já vi homens contarem que brocham com cheiros estranhos na cama ou que não transam com mulheres menstruadas. Ora, as mulheres nos lambem quando estamos suados, chupam, engolem... e nós queremos encontrar perfume francês debaixo da calcinha?

 

Eles se masturbam e gozam sozinhos

Imagine Gandhi ou Barack Obama vendo um filme pornô e melecando a mão. Ceninha no mínimo estranha, não é mesmo? O que é bastante saudável na adolescência deveria ganhar outro enfoque quando viramos homens. Qual o sentido em ejacular sozinho um dia antes de encontrar sua namorada ou namorado? Por que desperdiçar na tela do computador a potência que você poderia usar no sexo? O cara ejacula o tempo inteiro e depois reclama que não consegue prolongar a penetração!

O homem que goza sozinho quase todo dia, qual mente ele está cultivando? O que você acha que ele vai desejar quando for para a cama com alguém? Se temos o hábito de ficar nos agradando, focando apenas em nossas sensações, é isso que vamos continuar fazendo diante de uma mulher (ou homem) pelada.

O vício em pornografia afeta cada vez mais homens, de todas as idades

Eles não limpam o próprio banheiro

Um homem só consegue parar de fazer cagada na vida depois que aprende a limpar sua privada. Ele suja, a mãe limpa. Ele dorme, a empregada arruma a cama. Que tipo de homem é esse? Enquanto tratarmos o mundo como um hotel, seremos hóspedes.

Para além da privada, o mundo. Aquele que joga lixo no chão deixa seu mundo menor, exclui a rua, exclui o banheiro público, se distancia de tudo o que poderia incorporar à sua moradia como um cidadão do planeta. É por isso que os homens mimados só olham para o próprio umbigo: ali reside seu mundo, a única coisa digna de limpeza.

 

Eles não sabem o que querem da vida

Fato: se o homem não sabe o que fazer com sua vida, não saberá como se relacionar amorosamente. Além dos adolescentes que perdem tempo com distrações e jovens que patinam entre mil opções existenciais (alvos fáceis para essa crítica), há outros casos mais sutis, já que nem sempre ter dinheiro, poder, casa e família significa ter direcionamento na vida.

A nova geração de homens mimados pode ser representada pela imagem de moleques emos que não comem agrião ou por executivos de meia-idade dentro de uma Mercedes-Benz que nunca chegam a lugar algum. Ainda que eles consigam tirar muito da vida, pouco têm a oferecer. Como afirma Alan Wallace, nossa felicidade e a sensação de ter uma vida com sentido não é proporcional ao que extraímos do mundo e das pessoas, mas àquilo que trazemos ao mundo e às pessoas. Não é por acaso que encontramos muitos homens bem sucedidos completamente infelizes e impotentes, sem saber o que mais fazer com a vida.

 

Eles fazem só o que têm vontade

O homem mimado se move com a certeza de que sempre há alguém olhando por ele, pronto para protegê-lo, socorrê-lo, salvá-lo, resgatá-lo e levá-lo ao hospital.

A sensação de proteção divina e a confiança em um resgate paternal tiram sua responsabilidade: ele pode fazer qualquer coisa pois tudo acabará bem. E assim surgem os casos de colegiais estupradas, índios queimados, carros batidos, grávidas abandonadas, filhos abortados... O pai paga a faculdade para que o filho possa matar aula e beber.

O homem muda de vida quando deixa de fazer o que tem vontade e começa a fazer o que tem de ser feito. Não é à toa que muitos dos caras que conheço só se tornaram adultos de verdade quando tiveram um filho.

Para fazê-los dormir, acabamos saindo do berço! Com outro ser à vista, vamos além de nossos impulsos e desejos de satisfação imediata. Desenvolvemos generosidade, talvez a maior qualidade de um homem guerreiro.

 

Eles não sabem o nome dos porteiros do prédio

 

O que eles estão fazendo? Você tem mesmo interesse?

Autocentrados, os meninos mimados não têm interesse por aquilo que não pertence ao seu universo imediato. Lembro de um cara que me perguntou o que eu faria no fim de semana, ao que respondi falando de meditação e TaKeTiNa, uma técnica que usa o ritmo para transformar a mente. Se tivesse falado que passaria o tempo todo dormindo, teria dado mais papo. Ele simplesmente ignorou, ainda que nunca tivesse meditado nem conhecesse TaKeTiNa.

O homem mimado perdeu a curiosidade que faz nossos olhos brilhar. Em seu prédio, seis porteiros se revezam e ele não sabe o nome de nenhum. A melhor amiga de sua irmã, o tema da pós-graduação do seu colega de trabalho, a viagem importantíssima que seu primo fará... Ele esqueceu dentro de sua apatia distraída.

Quando você o encontra, ele sempre tem algo a falar e dificilmente oferece um espaço de autêntica escuta.

 

Eles buscam conforto o tempo inteiro

Mesmo depois de começar a morar sozinho e não mais depender financeiramente de meus pais, percebi o quanto ainda eu mesmo me mimava. Comprava frutas na feira para a ex-namorada, pagava as contas, limpava o banheiro, mas ainda assim dormia até me atrasar e enrolava o máximo possível quando era preciso fazer tarefas chatas na empresa ou em casa.

Nossos ancestrais caçavam animais, passavam frio, viviam à beira da morte. Nós pedimos pizza, usamos edredons e andamos de elevador com ar condicionado. Concordo que não dá mais para sair com um porrete para caçar antílopes, mas é preciso resgatar alguns comportamentos que ativam a energia masculina do destemor. Podemos começar com pequenas coisas como às vezes não fugir tanto do frio com mil roupas ou suportar o calor sem ficar tão dependente de ventiladores e ar condicionado.

O conforto nos entorpece. Viver embaixo do edredon nos deixa sonolentos em vez de disponíveis, anestesiados em vez de atentos. É por isso que admiro mestres de meditação que, mesmo com toda a possibilidade de viver uma vida confortável, escolhem condições desafiantes como dormir no chão numa esteira de meditação em uma casa sem energia elétrica ou ficar imóvel com água congelante batendo na cabeça durante a meditação takigyo.

 

Takigyo: mestre budista medita em uma cachoeira (Templo Oiwasan Nissekiji em Toyama, Japão)

 

Enfim, como salvar essa geração?

Basta que cada homem mimado comece a se observar para perceber traços de irritabilidade, ansiedade, impulsividade, reclamação e autocentramento. Em vez de trazer o conforto e o prazer que esperamos, os mimos causam aflições mentais e corporais. Sofremos mais, adoecemos mais. Assim que percebemos o problema, começamos a mudar por puro instinto de sobrevivência.

Se você namora um homem que manifesta algum dos comportamentos acima, não ceda aos seus mimos, dificulte um pouco as coisas. Se você é amigo de um cara mimado, desafie-o, convide-o para algo que ele não domina: mergulho, rafting, montanhismo, meditação ou uma noite de salsa.

Você pode tentar terapia cognitivo-comportamental, mas há meios mais simples e baratos de deixar de ser moleque de prédio. Como o mimo não é uma patologia biológica ou um distúrbio psicológico por excelência, mas um comportamento negativo (sintoma ou não de um problema maior), vou propor um método simples de cura. Nada muito sério ou científico: para quem não lava a privada, compre água sanitária e coloque AC/DC. Simples assim. Contemple sua própria vida, invoque desafios e elimine os seus mimos.

No próximo almoço, encha o prato com tudo o que normalmente não escolheria e coma com gosto. Supere a aversão a cheiros ruins, evite ejacular quando não estiver transando, pergunte o nome do porteiro, olhe o caixa nos olhos quando desejar "Um bom fim de semana pra você", beba menos, faça alguma prática que lhe prive de todo conforto por algum tempo (seja uma vision quest ou um retiro de meditação), seja curioso em relação à vida de outras pessoas, tome banho gelado e aceite mais o que a vida tiver pra hoje.

E você? Que outros comportamentos observa em seus amigos mimados?


ps.: esse texto foi escrito e publicado originalmente em 2009. O quanto ele segue atual agora, no momento em que você lê essas palavras?

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publicado em 13 de Julho de 2009, 07:00
Gustavo gitti julho 2015 200

Gustavo Gitti

Professor de TaKeTiNa, colunista da revista Vida Simples, autor do antigo Não2Não1 e coordenador do lugar. Interessado na transformação pelo ritmo e pelo silêncio. No Twitter, no Instagram e no Facebook. Seu site: www.gustavogitti.com


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