O cotidiano do mineiro José Geraldo de Souza Castro ia do nada a lugar nenhum. Os dias repetiam-se de maneira tortuosa e o matavam pouco a pouco. Mas o espírito, assim como os lugares, tem fronteiras apenas simbólicas. José resolveu rodar o mundo, desenhar sua própria cartografia e cortar as bordas do globo.
Há trinta anos, o mineiro saiu do Rio de Janeiro com uma bicicleta com objetivo de ir tão longe quanto conseguisse.
Pedalou até chegar à Espanha. Chegou a tempo de ver a Copa do Mundo de 1982. Cruzou o Japão em um velocípede. Contornou o mundo sobre uma magrela. Desceu de pedalinho o rio São Francisco. Desbravou o Oceano Atlântico em um barco a pedal. Presenciou chuvas monçônicas, terremotos, furacões e duas guerras civis.
Percorreu cerca de 150 mil quilômetros e atravessou 66 países. Quanto mais viajava, maior sua vontade de conhecer o mundo.

Na sua última aventura, a bordo de um kart movido a pedal, que fora doado por uma empresa holandesa, viajou por mais de 17 mil quilômetros num período de cerca de 127 dias, ou 3.048 horas.
Sempre vestido com uma camisa do Brasil, cortou 21 países. Começou seu trajeto em Paris e passou pelo Mediterrâneo com destino à África do Sul, onde, assim como na sua primeira aventura, assistiu à Copa do Mundo.
Viveu de pequenas doações e do apoio das pessoas que conheceu ao longo do caminho. Não foi derrubado pela malária. Nem por assaltantes. Tampouco pelas privações cotidianas, como água, comida e banho.
O mundo podia se consumir em desgraças, mas nada haveria de tirar do Zé, homem de semblante sereno e corpo franzino, a vontade de continuar.

Zé virou Zé do Pedal e abraça causas solidárias em todas as suas viagens. Na primeira, promoveu o combate ao câncer; na última, buscou dar visibilidade a uma campanha mundial do Lions Club, de assistência oftalmológica a países pobres.
Entre o câncer de uns e a cegueira de outros, cruzou o Japão num velocípede infantil para chamar a atenção da mídia para a condição das crianças na Etiópia.
Cortou o Rio São Francisco num barco tipo pedalinho para alertar sobre a poluição na natureza fluvial e atravessou a Baía da Guanabara, no Rio, em uma embarcação a pedal feita com garrafas pet para chamar a atenção para a poluição das águas e a importância do Protocolo de Kyoto.

Zé nunca sabe onde vai dormir ou o que vai comer. Traz consigo uma barraca de camping e a certeza de que o que importa na vida não é o destino, mas sim o percurso. Ele costuma dizer que saída e chegada são apenas ponto de referência.
“A fronteira do mundo está em cada um de nós. Você coloca o seu limite e essa é a sua fronteira.”
Aprendeu a falar inglês, francês, espanhol e italiano, tudo on the road – mas nunca perdeu o sotaque mineiro do interior. Quando senta para fazer um lanche, parece que o mundo pára por alguns instantes. Sua paz é quase palpável.
Em 2010, os cineastas Bruno Lima e Fabricio Menicucci, depois de reunir uma grana que foi doada por pessoas que ficaram deslumbradas com a história do Zé, tiveram a oportunidade de acompanhá-lo na viagem à África do Sul, que resultou no maravilhoso documentário Zé do Pedal – As fronteiras do mundo.
Para conhecer um pouco mais sobre o Zé e as suas histórias, pode visitar o blog com todo o percurso de produção do documentário.
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