Vogue e o mito da visibilidade: Somos todos paralímpicos?

Campanha quer dar visibilidade aos atletas paralímpicos e coloca eles como modelos? Não é bem assim.

A gente já discutiu aqui no papo de homem o quanto as paralimpíadas vem ocupando um lugar pequeno na vida dos torcedores. Mesmo arrasando no quadro de medalhas e na garra, a cobertura e o falatório sobre essa competição são historicamente menores.

Pegando essa linha , a vogue quis criar uma campanha que quebrasse esse gesso e incentivasse o envolvimento das pessoas: pensando aqui comigo, a expressão certa é “dar visibilidade” para a competição e para os atletas.

Até aí tudo bem.

A conversa toma um outro rumo quando a primeira foto do "Somos Todos Paralímpicos" aparece na tela. Paulinho Vilhena e Cléo Pires photoshopados; ela com um dos braços amputados e ele com uma perna mêcanica. Ambas as modificações foram feitas usando o braço de Bruna Alexandre e a prótese de Cláudio Leite, dois atletas paralímpicos.

E agora? A expressão certa continua sendo “dar visibilidade”?

As críticas já estão rodando pelas redes sociais e não era pra menos. Discussões acaloradas em campanhas #SomosTodosAlgumaCoisa já são nossas velhas conhecidas. Nesse caso, o anúncio criado pela agência África falhou em não cumprir justamente aquilo que propôs. Querer dar visibilidade está ligado diretamente a colocar como protagonista quem só pega figuração. Mas onde estão os atletas paralímpicos?  Se você quiser conhecer o rosto dos dois que "cederam" os corpos para a montagem, vai precisar dar uma olhada nas fotos de bastidores.

Bastidores? Era justamente de lá que a iniciativa da Vogue deveria tirá-los. 

No meio de toda essa discussão, e apesar de todas as críticas, é importante se agarrar na ideia principal da campanha: as paralimpíadas estão chegando e a gente precisa mudar de postura em relação essa história.

Então por que não começar justamente sabendo quem são essas duas figuras? Você já conhece a Bruna e o Cláudio?

 

Bruna Costa Alexandre 

Essa mulher incrível é mesatenista e teve o braço direito amputado quando ainda era criança. Ela treinava com a seleção brasileira de São Caetano do Sul, em São Paulo, e a rotina era pesada. Mas os esforços levaram ela longe! Em 2013 ela entrou para o ranking dos jogadores de tênis de mesa paraolímpicos,  sendo a quinta melhor do mundo.

Ela também foi escolhida a melhor mesatenista de 2014, depois de trazer para casa dois bronzes do Mundial Paralímpico de Tênis de Mesa, além de ter sido indicada ao prêmio de melhor atleta geral.

A Bruna começou a treinar com sete anos e já acumula várias conquistas. O foco nas paralimpíadas 2016 é total, mas ela já disse que quer competir entre atletas olímpicos também.

 

Renato Leite

Com uma história que vai de motoboy a camisa 10 da seleção paralímpica, esse nome é um dos precursores do vôlei sentado no Brasil. 

O Renato passou 28 dias no hospital e perdeu uma das pernas depois de um acidente em 2002. Em 2003 ele já entrou para a seleção; conquistou medalha de prata nos Jogos Parapan-americanos de 2003 e trouxe o ouro em 2007. A fatalidade com a moto acabou dando lugar a um caminho cheio de conquistas.

Já que o assunto envolve uma campanha, vale fazer uma observação: encontrar boas fotos do Renato não foi uma tarefa fácil. Esse é um dos vários pontinhos que vão construindo um cenário invisível para os atletas, deixando cada vez mais longe da realidade o slogan "Somos Todos Paralímpicos".


publicado em 24 de Agosto de 2016, 16:02
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Carol Rocha

Leonina não praticante. Produziu a série Nossa História Invisível , é uma das idealizadoras do Papo de Mulher, coleciona memes no Facebook e horas perdidas no Instagram. Faz parte da equipe de conteúdo do Papo de Homem, odeia azeitona e adora lugares com sinuca (mesmo sem saber jogar).


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