[Vídeo] Depois 75 anos estudando a felicidade, cientista dá fórmula:

Talvez sua avó já tenha te dado a mesma receita...

Sucesso? Fama ou reconhecimento profissional? Uma bela seguridade financeira e quem sabe até riquezas?

Aparentemente nada disso garante felicidade. E quem foi que disse isso? O mais longo estudo sobre desenvolvimento adulto e satisfação ao longo da vida - The Grant Study - desenvolvido em Harvard.

Desde 1938, muitos pesquisadores passaram pelos 75 anos de estudo acompanhando grupos de homens para entender, no curso de suas vidas, quais eram os ingredientes chaves para aquele que depois de tantas décadas poderiam dizer fui feliz. 

[Pare um segundinho pra dar o seu palpite.]

Os que deram início a pesquisa, virão a conclusão no topo de seus 80 ou 90 anos de idade e o pesquisador Robert Waldinger é quem fala sobre os resultados nessa Ted:

Bote os fones, ative as legendas e selecione, nas configurações, a opção “português (Brasil)”.

Fala logo o que é!

“… De novo e de novo, ao longo destes 75 anos, nosso estudo mostrou que pessoas que se consideram mais satisfeitas são as que se dedicaram aos relacionamentos, família, amigos, comunidade."

 

Aqueles que cultivaram relações mais calorosas ao longo da vida não só se sentem mais felizes e satisfeitos, como tendem a viver por mais anos, ter menos problemas de saúde e memória mais preservada na velhice. 

Simples, poderoso, quase óbvio, não é?

Uma sábia senhora da minha família não precisou de 75  anos de estudos em Harvard para, diante de choro e sensação de fracasso alheio, dizer que “que o que importa já estava ali: pão na mesa, família, amigos e amores.” 

Talvez ela não tenha precisado de 75 anos de teorias e artigos acadêmicos, mas acumulou décadas de aprendizados. Aprendizados esses que, ditos a alguém de 20 ou 30 anos, soam até mais fantasiosos que ideais de dinheiro e poder. 

A pesquisa de Harvard cumpre a função de provar cientificamente que as avós sempre têm razão.

"Quando o dinheiro sai pela porta, o amor pula pela janela"

Também dizia minha sábia avó.

Infelizmente a pesquisa foi feita no contexto estadunidense  - nada contra, tenho até amigos que são - mas a cultura anglo-saxã e a nossa, latina, tem muitas diferenças.

Contexto local e social importa. Para que o cultivo de relações comunitárias sejam chave da nossa satisfação é preciso que o básico esteja presente - seguridade alimentar, um teto, um suporte comunitário. Estas questões ainda são grandes desafios no Brasil e não podemos ignorá-las.

A boa notícia é que a formação de comunidades que se ajudam, que dividem o pão, o teto, tarefas, cuidados, é justamente uma das chaves para garantir o básico a tantos que estão em situação vulnerável.

Família nem sempre é de sangue

Outra diferença entre o contexto estadunidense e o brasileiro/latino é que nós temos a tendência de conviver mais e por mais tempo não só com a família direta, pais e filhos, mas também com os parentes. 

Se o individualismo, o apartamento de solteiro e autossuficiência são características valorizadas no norte do mundo, aqui nas terras tropicais, domingos em família (incluindo parentes) são obrigações que inquestionáveis.

Sem entrar em juízo de valores sobre qual modelo garante mais felicidade a longo prazo, o ponto aqui é diferenciar o cultivo de boas relações familiares com a obrigação compulsória de estar preso a determinada família.

Manter relações a todo custo - não desmantelar a família, não brigar com parentes, não divorciar-se - não é sinônimo de boas relações e passa longe de ser a chave para longevidade cheia de satisfação a que o professor se refere.

“É possível estar sozinho numa multidão e sentir sozinho num casamento. Então a segunda grande lição que aprendemos que é não é sobre o número de amigos que você tem, ou se você está em um relacionamento sério ou não. O que importa é a qualidade das suas relações mais próximas.

Descobrimos que viver no meio de conflitos é realmente ruim para a nossa saúde. Casamentos conflituosos sem muita afeição se mostram péssimos para a nossa saúde, talvez piores que divórcio."

Família, amigos e comunidade: é sobre cultivar profundidade com quem amamos, constituir famílias baseadas em suporte, afeto e responsabilidade. 

“Introdução ao cultivo de relações 101”

Um jornalista americano que escreve sobre a pesquisa pergunta:

“Se as relações são a parte mais importante da nossa vida, por que não temos nenhuma aula na escola nos ensinando sobre isso?

Você já teve alguma aula de habilidades sociais na escola? Talvez “introdução à intimidade?” Ou então uma aula sobre como navegar por conflitos numa relação longa? Ou como não culpar os outros pelos seus problemas e, ao invés disso, assumir a responsabilidade por eles e fazer algo sobre as suas dificuldades. “

Essa pergunta me acendeu duas imagens: uma que brilhou e aqueceu o coração e outra mais ou menos obscura.

A mais acinzentada das possibilidades é imaginar uma apostila didática sobre sentimentos, um manual de conduta mais ou menos rígido que entregue roteiros de como agir ou não agir, apontando certos e errados sobre convívios e afetos. Na menos pior das consequências, pasteurizamos as relações, na mais terrível delas, a aula se torna uma ferramenta de controle e manipulação das formas de amar e se encaixar no mundo.

Por outro lado, brilha a imagem de uma roda, um espaço e tempo abertos para que as pessoas, juntas, compartilhando medos, aflições, vontades e conflitos, possam desenrolar aprendizados sobre as interações humanas num laboratório prático, real e nada hermético.

A roda de gente que fala de igual pra igual permite conexões genuínas, soluções coletivas e o florescimento de um saber que é em si sobre estar junto, ouvir, falar e construir com o outro. 

Essa imagem calorosa se parece com o nosso sonho: com o sonho de que, em cada cidade do país, exista um grupo de homens para que, todos aqueles que queiram, possam construir caminhos de aprendizados emocionais que tanto foram podados aos homens. 

Depois destas valiosas lições, o que você quer cultivar?


publicado em 07 de Janeiro de 2021, 12:37
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Gabriella Feola

Editora do Papo de Homem e autora do livro "Amulherar-se" . Atualmente também sou mestranda da ECA USP, pesquisando a comunicação da sexualidade nas redes e curso segunda graduação, em psicologia.


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