Tristeza de ler que um casal "morreu de mãos dadas"

Infelizmente não printei a tela do G1 no dia de ontem. Mas, na home, tinha uma foto de um casal de beijando e a chamada parecida com essa:

"Casal atingido por um raio morreu de mãos dadas"

Cliquei no link para saber qual era dessa história e encontrei uma matéria que me deixou bem triste com o jornalismo, falando dos sonhos do casal, da "casinha" que eles queriam comprar, que eles foram para o litoral porque ela (a mulher do casal) adorava praia.

No meio dos sonhos destruídos, o depoimento de uma testemunha do acontecido:

Uma testemunha que estava no local no momento do acidente conta como tudo aconteceu. "Eu estava recolhendo as mesas, e daqui a pouco só escuto o estrondo do raio caindo e os dois caídos de costas no chão, com as mãos dadas. Rapidamente nós corremos, chamamos o resgate e rapidinho eles vieram e já colocaram na viatura", diz o garçom Leandro Prince.

Achei muito perspicaz por parte da testemunha dar esse tipo de detalhe e tudo o mais, mas foi de uma tristeza sem tamanho ver alguém de um dos portais mais visitados do país utilizar esse tipo de título pra chamar acessos.

Não sei qual era a do casal, muito menos do amor deles pra falar, como prova, da bobeira que é ver significado nas mãos dadas ao morrer. Destituído de todo o sentimentalismo (como jornalista, não como pessoa), o mais provável é que, no atingir do raio, não tivesse havido tempo nem para ver a vida passando diante dos olhos, quanto mais focar em manter as mãos juntas para o final trágico, mas enrolado em todo o amor que houvesse naquelas duas vidas.

Todos os milhões de leitores que clicaram nessa matéria tem todo o direito de fantasiar o que quiserem e o que puderem. Não o jornalista que escreveu o causo, não o cara do G1 Santos que botou essa chamada, muito menos o editor que deixou tal bobeira entrar na home do site nacional.

Títulos tidos como sensacionalista não são problema. A questão está no conteúdo da nota, da matéria, da reportagem, enfim, em qualquer leriado publicado. Não é um assunto sobre celebriades, ora pombas! É um assunto dos mais sérios, a morte de duas pessoas que queriam - e isso eu nem precisa ser dito na matéria - realizar sonhos, concretizar planos.

Jogar um romantismo açucarado para chamar a atenção do leitor que vê verdades até nos filmes mais adolescentes de Hollywood e fica olhando emocionado pra tela do computador repetindo em voz baixa ou mentalmente que "eles morreram juntos, de mãos dadas.

Não dá pra botar esse tipo de equívoco na cabeça das pessoas. É de uma tristeza sem fim para esse editor que vos fala.


publicado em 10 de Janeiro de 2013, 09:00
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Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna Do Amor. Tem dois livros publicados, o livro Do Amor e o Ela Prefere as Uvas Verdes, além de escrever histórias de verdade no Cartas de Amor, em que ele escreve um conto exclusivo pra você.


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