Sobre flanelinhas e o que (não) podemos fazer a respeito deles

Quem mora em uma grande cidade, conhece bem a cena: você encontra um lugar para parar na rua. Suspira aliviado, sabendo que está prestes a economizar a facada do estacionamento. É aí que ele chega, sempre de surpresa. Malandro, moleque, às vezes bêbado, outras muito profissional. O flanelinha.

Te chama de chefia, amigão, bonita, parceiro, e pede aquela colaboração ligeira – que pode ser em forma de esmola ou pode soar ameaçadora e te fazer cogitar seriamente tirar o carro de lá. Pelo menos em um estacionamento você lê a frase "com seguro", acima do "R$15,00".

A notícia que corre pelo Facebook é verdade: a cidade de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, sancionou uma lei que proíbe a ação dos flanelinhas. Nada mais justo. Para quem nunca passou pelo ocorrido, pode soar estranho e uma medida exagerada, mas não é.

Se você decide parar em uma rua de São Paulo controlada por alguns que se intitulam donos, tem que pagar o estipulado ou tirar o carro de lá, sob o risco de voltar e encontrá-lo todo riscado. Não há polícia que detenha os flanelinhas, que em alguns lugares já atuam de maneira muito "profissional", cobrando dos motoristas por hora e ressaltando há quanto tempo estão na área e demonstrando um grande esquema de trabalho.

Link YouTube | "Dez reais é caro? Então tem que falar com o rapaz lá de baixo, que é da administração..."

Não faz muito tempo, decidi ir à Pinacoteca do Estado de carro e fui abordada por um flanelinha de esquema profissional. Narrei o episódio neste texto. Ele me pediu um absurdo, e eu fechei a cara, falei um monte e tirei o carro de lá. Parei em um posto policial do outro lado da rua, a cerca de 100 metros do lugar. Expliquei a situação, enquanto os policiais nem me olhavam, distraídos com qualquer coisa que não fosse a minha história.

Disseram que não há o que fazer. Que eu poderia ir a uma delegacia fazer um Boletim de Ocorrência, que eles chamariam o indivíduo, que negaria tudo, seria solto e continuaria a agir.

Sem uma medida específica para o caso, nós, as vítimas, somos duplamente prejudicados: quando nas ruas, pela ação deles, e perante a polícia, para quem devemos provar que fomos extorquidos. Temos que esperar a polícia, prestar queixa e aguardar para que o sujeito volte a ter sua ação no mesmo local em menos de 24 horas.

Não é certo que se apropriem do espaço público, que cobrem por um local que é tão nosso quanto deles. Não é correto que a polícia não possa nos defender com queixas anônimas, que tenhamos de pegar nossos carros como fugitivos, para não pagarmos o que foi exigido por quem nada pode exigir. Ora, é preciso menos de dez minutos no local para saber se há algum dono da rua no pedaço. Algum com colete fluorescente, com o informe segurança particular ou apenas olhar malandro e pilha de notas no bolso. Basta encostar a viatura e esperar para que eles tragam o preço da hora no quarteirão.

Isso não é certo. Mas só em Novo Hamburgo há uma lei dizendo que é errado. O resto do país aguarda.


publicado em 13 de Janeiro de 2012, 08:14
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Isabella Ianelli

Pedagoga interessada em arte e educação. Escreve no blog Isabellices e responde por @isabellaianelli no Twitter.


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