Eu nadei competitivamente durante seis anos da minha ainda curta vida. Passei por toda aquela que podemos chamar de 'categorias de base' da natação e parei quando tive que escolher entre virar um nadador profissional ou fazer qualquer outra coisa da vida.

A decisão, já naturalmente difícil para um garoto de 16 anos, se torna ainda mais complicada porque parte da opção por largar tudo isso diz respeito a capacidade de avaliar o quão talentoso você é naquilo que você faz. Em resumo: você é bom o suficiente para se destacar e viver disso num ambiente tão restrito?

O esporte é cruel. A maioria das outras áreas de atuação permite que muitas pessoas talentosas convivam. No esporte, não. Só há um vencedor. E ter a capacidade de ser este vencedor era uma coisa que todos queriam. Eu queria! Mas não tinha. Você pode imaginar, portanto, a raiva que 'pessoas comuns' como eu tinham de pessoas extremamente talentosas que desperdiçavam esse potencial tão desejado? Pois é.

A queda profunda

Ryan Lochte era um desses nadadores de talento comprovado. Na época em que eu competia, Michael Phelps ainda era, disparado, o melhor nadador do mundo. Possivelmente, Phelps foi o melhor nadador de todos os tempos. Mas, com o perdão do trocadilho, mergulhados nesse assunto como nós estávamos, era comum apostarmos quem seria o próximo Michael Phelps e Lochte sempre foi o líder das apostas.

Nossas apostas eram baseadas em alguns critérios bastante técnicos como a versatilidade e a capacidade de competir em alto nível em muitas provas distintas. Talvez ele não fosse tão especialista num único nado como tantos outros nadadores, mas ele era a melhor chance de repetir o que Phelps fazia e ser o melhor em tudo!

Todos nós esperávamos que Lochte seria o próximo nesse revezamento.

Tudo começou muito bem e nós parecíamos estar certos. Lochte bateu diversos recordes mundiais, ganhou medalhas olímpicas nas olimpíadas de Atenas-2004 e Pequim-2008. Mas aí veio os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro e Lochte se envolveu no lamentável episódio no qual mentiu para a polícia sobre ter sido assaltado num posto de gasolina, quando na verdade ele e um grupo de outros nadadores, bêbados, depredaram o banheiro do estabelecimento e foram repreendidos pelos seguranças.

Como todos estavam esperando algum grande desastre e a mídia estava caçando os problemas (não que eles não houvessem), a história de Lochte colou num primeiro momento e ganhou grande repercussão, mas foi só a investigação começar para perceberem que tinha algo de errado na versão dos nadadores e toda a fúria do público se voltar para ele.  

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Lochte caiu em desgraça. Ficou retido, foi suspenso por 10 meses das competições nacionais e internacionais, foi impedido de visitar a Casa Branca junto com o resto da seleção americana, perdeu todos os seus patrocinadores e, principalmente, qualquer apoio da opinião pública o que ocasionou, segundo as informações mais recentes, pensamentos sérios a respeito de cometer suicídio.

Apesar do trabalho de seus advogados e assessores de imprensa, o estrago estava feito e era enorme. É difícil combater a narrativa do homem branco, rico e talentoso que, bêbado, 'tentou manchar a imagem de todo um país'. Lochte bateu no fundo do poço em que se meteu de cabeça.

A volta por cima

Alguns dirão que tudo passa e que, na velocidade com que as coisas acontecem, daqui a pouco, ninguém mais lembrará disso. De fato, este pode ter sido um dos argumentos que pessoas próximas usaram para impedir que ele acabasse com a própria vida. Mas diante de uma situação como essa, o que fazer? Como encontrar motivação para seguir em frente? Até onde é possível sair de uma circunstância ruim e dar a volta por cima?

Não dá pra negar que a carreira de Lochte terá para sempre uma mancha. Pessoas do 'mundo da natação', como eu era, não se esquecerão que nossa principal aposta de quem seria o 'novo melhor do mundo' foi por água abaixo.

Mas Lochte promete se recuperar e, de fato, a maré parece estar virando pra ele. Apesar de ainda responder processo na justiça brasileira, o impedimento em participar das competições oficiais está acabando, o nadador já conseguiu alguns novos patrocinadores e, após superar a crise do suicídio, Lochte está fazendo aquilo que muitos treinadores sempre nos recomendavam depois que algo dava muito errado: enfiar a cabeça na água e treinar pra próxima.

Assim, ele promete que estará de volta em Tóquio-2020 para o que seria, estabelecer o recorde de nadador americano mais velho a competir nos Jogos Olímpicos. Mas a dúvida que fica é: Lochte merece uma nova chance? Conseguirá se reerguer? Qual a saída para crises como essa?

O tempo dirá, mas nós já estamos fazendo nossas apostas. 

Breno França

Editor do PapodeHomem, é formado em jornalismo pela ECA-USP onde administrou a <a>Jornalismo Júnior</a>