Rock n' roll: da luz ao pó e, das tripas, coração. De onde veio e para onde vai

Mil novecentos e dois mil e treze não foi, mais uma vez, o ano do rock.

Rock sai do top 30 de rádios do Brasil pela 1ª vez desde 2000

Em 2013, o rock teve a pior colocação entre as músicas mais tocadas nas rádios do Brasil em 14 anos, segundo monitoramentos feitos desde 2000 pela empresa Crowley e obtidos pelo G1.

Nos anos anteriores, houve pelo menos uma música de banda ou cantor de rock entre as 30 mais tocadas. Em 2013, a melhor colocação do estilo ficou com a canção "Meu novo mundo", de Charlie Brown Jr., em 40º lugar. A 1ª posição foi de "Vidro fumê", da dupla Bruno & Marrone.

Desde 2000, o rock havia chegado, no mínimo, à 21ª posição anual – colocação de "Só os loucos sabem", também de Charlie Brown Jr., em 2010

Para ver maior, basta clicar na imagem
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Lá fora, a situação não foi muito diferente, apenas com a aparição da banda de Nevada, Imagine Gragons, dentre os mais vendidos e escutados:

Bruno Mars teve o álbum mais vendido no mundo em 2013

Confira a lista completa:

1. Bruno Mars – Unorthodox Jukebox (3,9 milhões)
2. Justin Timberlake – The 20/20 Experience (3,7 milhões)
3. Daft Punk – Random Acess Memories (3 milhões)
4. P!nk – The Truth About Love (2,9 milhões)
5. Eminem – The Marshall Mathers LP 2 (2,7 milhões)
6. Mumford & Sons – Babel (2,4 milhões)
7. Take Me Home – One Direction (2,3 milhões)
8. Imagine Dragons – Night Vision (2,2 milhões)
9. Michael Bublè – To Be Love (2,2 milhões)
10. One Direction – Midnight Memories (2,1 milhões)

MP3, nuvem, streaming:

Spotify exibe estatísticas e músicas mais populares do ano com infográfico interativo

Foram mais de 4.5 bilhões de músicas escutadas pelos mais de 24 milhões de usuários ativos. “Get Lucky” do Daft Punk bateu o recorde de faixa mais ouvida num período de 24 horas. Considerando os últimos 5 anos, a música mais popular foi “Thrift Shop”, de Mackelmore & Ryan Lewis.

Estados Unidos
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Reino Unido
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Alemanha
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Austrália
Austrália

Argentina
Argentina

Isso é ruim?

De jeito nenhum. Tampouco quer dizer que o rock acabou e nem que as pessoas não estão mais ouvindo. No máximo, o rock perdeu força comercial e não está mais sendo, digamos, financiado.

O jabá ainda domina televisão e rádio e engana-se quem pensa que a internet não sofre com isso, bastando ver que as músicas mais tocadas em diversos países são de artistas/grupos que possuem investimento pesadíssimo em divulgação.

Agora, por que ninguém quer bancar uma banda de rock?

O rock n' roll envelheceu

Cabeludos, camisa preta, Woodstock, milhares de vertentes e ramificações dessas vertentes. O Bono, o Chris Martin, vocalista do Coldplay. Tudo isso remete a mofo, a velharia, a coisa antiga. O rock sempre foi, por essência, jovem. Quando o seu avô curte o mesmo estilo musical que você, quando se tem 13, 15, 17 anos, algo está muito errado.

Pra gente, pessoas entre 25 e 35 anos, parece até legal escutar um som com o avô, mas para a molecada, isso não é transgressor. O rock perde, assim, vivacidade e poder de transgressão, que estão na cerne do estilo musical.

Realmente não era fácil para os pais racistas daquela época ver seus filhos, com as cabeças cada vez mais abertas por influências musicais e intelectuais, dançarem da mesma forma que os negros dançavam. Até aquele momento, o ritmo branco tradicionalista e preconceituoso não aceitava a sensualidade e o suingue dos negros.

A origem negra do rock n’ roll

Isso não quer dizer que todo rock é velho. Há frescor a todo instante, com bandas novas e novas experimentações. O estilo em si é que é velho.

O rock vende... produtos

Novamente, o rock era um som jovem que deixava, até pouco tempo atrás, os adultos de cabelos em pé. Hoje, facilmente vemos dezenas ou até centenas de propagandas que tem como trilha sonora o rock n' roll.

Ora bolas, se antes as meninas ouviam rock escondidas do pai, se os cristão queimavam discos dos Beatles por serem "mais famosos que jesus Cristo", se sua mãe mandava rezar uma novena toda vez que te pegava ouvindo um disco do Iron Maiden ou Metallica ou ACDC, Se o grunge era perigoso e tendenciava suicídios, se o pessoal do Planet Hemp foi preso por apologia às drogas, cacete, hoje esse mesmo rock está vendendo carros no feirão de final de semana no pátio da fábrica da Chevrolet!

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Em algum momento o rock deixou de ser inclusivo

O rock n' roll sempre deu voz aos excluídos. Não que eles fizessem rock, mas sempre falavam pra eles ou com eles. Jovens, trabalhadores, mulheres, indígenas mexicanos. A facilidade em tocar e absorver melodia e mensagem, a catarse de se cantar junto, de se movimentar, de inspirar e cuspir frustração e hormônio sempre foi o catalizador do rock.

Hoje, o rap, o hip-hop, o funk tomaram essas qualidades de assalto. Não confunda "não entendi" com "não gostei". Se você não gosta desses novos estilos, é porque eles não são para você. Liberdade da sexualidade, o desabafo da violência na cidade, música "fácil" feita deles para eles.

O rock já foi assim um dia.

Hoje, o rock parece ter adquirido um caráter de música elitizada. Quando um intitulado "roqueiro" diz que esses estilos são feitos para as pessoas não pensarem, ele está fazendo o que um pai americano da década de 50 -- militar e conservador -- fazia quando o rock misturava o country dos brancos com a suingada dos negros.

O rock sempre foi e deve continuar sendo um estilo inclusivo, que atrai pessoas e não que as repelem. Por isso bandas mais experimentar (ou elitizadas, ou arredias ou qualquer adjetivo que quiser colocar) como Radiohead poderia ficar confortavelmente no mesmo estilo que o som bonachão do rock rural que os Raimundos fizeram no começo da carreira.

O rock n' roll tem até rock pra quem não gosta de rock, como as diversas bandas mais pop como (coloque aqui o nome daquela banda que você acha que nem deveria ser chamada de rock).

No Brasil, não há melhor época para se começar a fazer rock n' roll

Ninguém tá dando um real pro rock por essas bandas. Atenção, carinho afeto. O rock está abandonado por aqueles que investem em música. Momento ideal para todo o topo de experimentação genuína.

Depois dos Raimundos, toda banda queria soar como Raimundos. Depois de Los Hermanos, toda banda queria soar como Los Hermanos. Por anos, lá fora, roqueiros queriam cantar como o Eddie Vedder ou andar e falar e se vestir como Kurt Cobain. Quando se está em evidência, é fácil demais fazer com que a coisa se repita a exaustão.

Quem o roqueiro vai copiar hoje? O Capital Inicial? Tico Santa Cruz?

Peguem suas guitarras, pluguem seus cabos
Peguem suas guitarras, pluguem seus cabos

O rock está sem heróis e é bom que assim seja. Se for voltar a brilhar para que olhos se voltem para ele e dinheiro seja injetado, que seja com um som feito em casa, daqueles que nego vai ficar alucinado de não ter ouvido antes.

E é só esperar para acontecer.

Guardem o que estou falando.


publicado em 14 de Janeiro de 2014, 08:28
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Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna Do Amor. Tem dois livros publicados, o livro Do Amor e o Ela Prefere as Uvas Verdes, além de escrever histórias de verdade no Cartas de Amor, em que ele escreve um conto exclusivo pra você.


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