O Brasil vive uma monocultura esportiva e isso é fácil de detectar. Basta ligar a televisão numa tarde durante a semana e você vai ver o videotape de algum jogo de campeonato europeu de futebol masculino – Real Madrid e Getefe, ou Everton x Aston Villa, ou ainda milhões de mesas redondas sobre todos os tipos de campeonato de futebol do mundo: Brasileirão, Paulistão, Carioca, Inglês, Espanhol, Alemão, Francês, Russo, Liga Europa, Champions, Libertadores e por aí vai. Até campeonato alagoano foi transmitido este ano, e eu vi, uma final trágica entre CSA e CRB, que terminou em briga e gente sendo levada para o hospital.

Por outro lado, entre Londres 2012 e os jogos do Rio 2016, o Brasil conquistou o campeonato mundial feminino de handebol em 2013 e poucas pessoas viram os jogos. Artur Zanetti conquistou a primeira posição em etapas do Gran Prix de Ginástica e, se você perdeu ao vivo, teve que se contentar com uma matéria de 45 segundos, basicamente com a saída das argolas e o pódio. Tem uma emissora que transmite rugby, mas, em geral, só pelo aplicativo on demand, mas a Copa do Mundo de rugby pode interrompida por tomadas intermináveis de ondas sem ninguém surfando esperando Mineirinho ou Medina entrarem na água, o que nunca aconteceria com o futebol masculino.

Ei, você conhece a Ingrid de Oliveira?

O único título que falta para o futebol brasileiro é o muito sonhado e aguardado ouro olímpico. Uma conquista em casa pela geração de Neymar teria um grande impacto na mídia esportiva brasileira. E tudo que você ouviria sobre os Jogos Olímpicos Rio 2016 seria “os meninos de ouro”, “o futebol campeão olímpico” e todos esses apelidos dourados e bobos.

O ouro da seleção de futebol (sub23*) ofuscaria os resultados dos outros 460 atletas brasileiros. Não importa se conquistaremos as cinco medalhas esperadas no judô, ou se as meninas do vôlei serão tricampeãs olímpicas, ou se o handebol conseguirá sua primeira medalha, se Yane Marques vai subir novamente no pódio, se Fernando Reis vai ser um dos três homens mais fortes do mundo. Os resultados nas piscinas serão insignificantes e a vela, maior fábrica de medalhas douradas para o Brasil, apenas somará números ao ouro do futebol.

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Tudo será sobre o menino Neymar e sua turma e seu ouro olímpico. Não pretendo dizer que o futebol brasileiro não merece um lugar olímpico, mas afirmo que, para o futebol, os jogos olímpicos são a série “B”. O sonho do boleiro não é vestir a amarelinha em uma olimpíada, mas jogar a Copa do Mundo. Já para os demais esportes, os jogos olímpicos são o auge. Atletas abrem mão do campeonato mundial de 2015 para chegar sem lesões nos jogos olímpicos de 2016, as gerações são medidas em ciclos olímpicos, campeões mundiais que não conquistam o Ouro de Pierre de Coubertin se aposentam frustrados.

Valeu, Neymar! Mas não

Se sonharmos com um legado olímpico a partir do Rio 2016, o Brasil não pode ganhar o ouro, sim, é isso ai. Pense na geração de ouro do vôlei masculino, que só teve o sucesso que teve porque, anos antes, uma geração de prata elevou o patamar do esporte no país. Se tivemos as medalhas do César Cielo, grande parte, é resultado das performances olímpicas de Gustavo Borges e Fernando Scherer. Se quisermos deixar de ser um país com uma cultura esportiva que se baseia apenas no futebol, se vamos aproveitar a diversidade de corpos, técnicas e esportes que só uma olimpíada pode reunir, que a medalha do futebol não seja de ouro.

Que Neymar e sua turma conquistem a prata ou o bronze, que carreguem mais uma frustração para a conta olímpica do futebol brasileiro. Não porque o futebol não merece os holofotes, mas porque já os têm em excesso. Que seja a hora de outros atletas, outras estrelas, brilharem.

Diego Dubard

Jornalista nascido em Recife, vive em Brasília desde 2007 e quer se mudar em 2012, antes que o mundo acabe. Escreve porque precisa ganhar a vida e joga rugby por paixão. Twitter: <a>@ddubard</a>."