Olá, meu amigo. Como a maioria aqui já sabe, sou estilista e tenho uma marca de roupas, a Conto Figueira. Por isso, duas vezes ao ano sou obrigado a lançar peças novas, uma campanha inédita e até mesmo a embalagem é reformulada, atualizada.

Se eu resolvesse repetir sempre a mesma coleção, por mais fantástica e bem feita que fosse, minhas vendas cairiam e provavelmente a empresa deixaria de existir. Um dos motivos deste fenômeno é a lógica de consumo. Mas, e se pensarmos além desse fator e analisarmos as outras causas que nos levam a gostar tanto assim de coisas novas?

Essa é a imagem da nova coleção da Conto. Baita impacto. No terceiro lançamento da mesma obra com a mesma camisa da mesma cor… ninguém mais daria a mínima (legenda do editor)
Essa é a imagem da nova coleção da Conto. Baita impacto. No terceiro lançamento da mesma obra com a mesma camisa da mesma cor... ninguém mais daria a mínima

Nosso cérebro, esse brincalhão

Existe uma região do cérebro chamada Área Tegmental Ventral (ATN) e outra de nome Substância Negra (SN), ambas localizadas no mesencéfalo. São elas as responsáveis pela produção de dopamina.

Estas áreas (ATN/SN) são ativadas basicamente por estímulos inesperados e excitação emocional, estando ligadas ao hipocampo (grande responsável pela nossa memória) e à amígdala cerebelosa (o nosso processador de emoções). Ao sermos apresentados a algo novo, o ATN/SN responde a este estímulo motivando nosso cérebro a explorá-lo em busca de recompensa por meio da liberação da dopamina. Quanto mais incomum é o objeto/imagem analisado(a), mais estímulo receberemos.

É importante saber que nosso cérebro encara o fato mais como motivador para explorar algo do que como recompensa em si. É aí que reside toda nossa confusão com o gosto desenfreado por algo que não se conhecia.

Como é mais fácil encontrarmos coisas novas do que necessariamente boas, pregamos uma peça em nós mesmos e acabamos nos “alimentando” da satisfação pequena — mas constante — provocada pela grande oferta de novidades do dia a dia.

Certamente seria mais trabalhoso identificar e explorar itens e situações que realmente pudessem nos trazer alguma recompensa, porém, não tenho dúvidas que este olhar mais profundo e atento nos traria uma felicidade muito mais concreta e duradoura, venha ela de produtos, imagens, pessoas ou sentimentos ou relações.

Nosso cérebro, esse camarada

Como vimos acima, as novidades podem nos mostrar caminhos inexplorados para grandes descobertas, mas também podem se tornar pequenos comprimidos de felicidade ilusória.

Outra característica interessante é que testes nos indicam a chance de um futuro promissor no uso das novidades para o nosso aprendizado. Animais expostos a estímulos causados por elas expandiram a plasticidade (capacidade de neurônios fazerem novas conexões) de seus hipocampos (o grande responsável pela memória, lembra?). A pesquisa ainda não foi feita com seres humanos, mas existe grande probabilidade de reagirmos da mesma forma, aumentando assim nossa capacidade de armazenar conhecimento.

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Nosso cérebro, essa putinha

girl

Agora que já sabemos o que acontece conosco quando nos deparamos com coisas novas, poderemos entender como o cérebro pode tratar mal um coração.

Eu explico.

Você tem uma garota e tanto. Ela é bonita, tem um cheiro gostoso, risada engraçada, conversa boa e faz sexo de um jeito que te deixa louco. E então você vai para o trabalho, provavelmente um emprego novo, e lá está ela. A garota de sapatos roxos. Ela é bonita, tem cabelos negros, mas nada de outro mundo. Vocês nem chegaram a conversar. Apenas uma apresentação rápida na hora do almoço e pronto, foi o bastante e você foi para casa e se deitou ao lado da sua mulher. Na cama, você fica ensandecido pensando no que faria se aqueles cabelos escuros estivessem enrolados na sua mão.

É claro que sua mulher pode ser um porre e a menina dos sapatos roxos talvez seja uma pessoa mais interessante, inteligente e louca por sexo. Bem, se for o caso, realmente estaremos diante de uma novidade e tanto. Mas provavelmente ela seja só uma garota como muitas que já conheceu e não te despertaram interesse real e sua mulher ainda seja a mesma pessoa por quem você se apaixonou e brigou pra ter ao lado.

Agora que você sabe que esse seu sentimento confuso é fruto de uma reação cerebral involuntária, poderá agir como um idiota embasado cientificamente dando em cima de outra mulher ou então poderá suar durante alguns dias e deixar que a sensação passe, gastando sua fúria sexual acumulada com quem realmente interessa.

Por fim, lembre-se: você também pode ser apenas a novidade de alguém.

Como sempre, espero que tenha sido útil ou, ao menos, divertido!

Textos de apoio e referências de pesquisa:

→ “Novidades ajudam na aprendizagem” (UCL News)

→ “Grandes novidades estimulam o cérebro” (Science Daily)

→ “Os efeitos da novidade, habituação, e medo” (Society for Neuroscience — The Journal of Neuroscience)

Obs: os títulos dos textos de apoio foram traduzidos livremente.

Bruno Passos

Pintor. Ama livros, filmes, sol e bacon. Planeja virar um grande artista assim que tiver um quintal. Dá para fuçar no <a>Instagram</a> dele para mais informações."