Nessas últimas semanas de lançamento da febre Pokémon Go pelo mundo começaram a espalhar pela internet a mais nova teoria da conspiração: o jogo seria uma arma da CIA para espionar detalhes íntimos de milhões de pessoas pelo mundo. Não bastam espalhar uma coisa dessas, alguns veículos jornalísticos brasileiros ainda botaram lenha na fogueira fazendo uma apuração medíocre sobre o assunto. Pensando em acabar com essa baboseira escrevi esse texto apontando as principais falhas nessa teoria.

Este balão tem todas as características de um potencial terrorista de acordo com o manual da NASA de identificar ameaças digitais. Não se deixe enganar. Foto: Charles Skyes (AP)

Acesso Irrestrito a Câmera

Ao liberar as permissões de câmera para o aplicativo teoricamente poderia tirar fotos sem consentimento do usuário, salvar e enviar para a nuvem. É possível fazer em programação e nem é complicada a execução.

Só que na prática um aplicativo que faça isso provavelmente não seria aprovado na App Store, ou ainda seria removido rapidamente pela Google Play por violar direitos de privacidade do usuário. Em países como no Japão, é proibido por lei que aparelhos celulares tirem foto sem fazer um barulho específico de câmera mesmo que em modo silencioso, tanto que qualquer aparelho comprado no país vem com isso configurado de fábrica e não tem como ser removido facilmente. Eu tive um iPhone japonês e nunca consegui tirar o barulho, nem mesmo na Apple fora do Japão o suporte técnico conseguiu ajudar.

Resumindo: se o aplicativo tirasse fotos escondidas e mandasse pra CIA, ele estaria bloqueado no Japão e possivelmente no resto do mundo em seguida.

Utilizando o que há de mais moderno em tecnologia ectoplasmática, Pokémon Go permite transformar a câmera do smartphone em uma janela para uma dimensão paralela aonde criaturas interdimensionais ameaçam a nova ordem mundial. Foto: TNT Review

Acesso Irrestrito a Localização

O aplicativo tem acesso a localização do usuário, porém pelas permissões solicitadas apenas enquanto o jogo estiver aberto. Sem Pokémon Go rodando, sem dados de localização enviados pra Niantic.

Independente disso, seria muito ineficiente para uma NSA da vida utilizar Pokémon Go para pegar a localização de um usuário específico, pois o governo tem formas mais eficientes de rastrear qualquer aparelho celular, mesmo que ele esteja fora da internet. Isso já é feito há anos através da triangulação de antenas de sinal, e aonde uma agência de inteligência teria acesso muito mais fácil do que fazer um requerimento pra Nintendo lá no Japão.

Resumindo: da pra ABIN pegar seus dados de localização via Pokémon Go? Que dá, dá, mas eles têm formas muito mais eficientes e mais discretas de fazer isso, como já fazem.

Acesso Irrestrito ao Microfone

O aplicativo não utiliza o microfone. Logo, nem tem como gravar, muito menos enviar suas conversas pro FBI.

Acesso Irrestrito aos seus Dados Pessoais

Ao cadastrar em Pokémon Go alguns dados vêm direto de sua conta Google, logo, caso a Polícia Federal resolva ir atrás de seus dados, é mais eficiente eles irem pegar isso com a Google, que tem um histórico e muito mais informações pessoais de um indivíduo, do que pegar meia dúzia de dados com a Niantic como email ou data de nascimento, dados que a agência de inteligência provavelmente já tem.

Leia também  A internet não está chata, é só você

Estando seus dados pessoais todos registrados no Google você fica abaixo da política de privacidade da empresa, que compartilha informações pessoais com governo, sob situações muito específicas e, em alguns casos, ainda recusa devido à baixa relevância.

Essas informações estão detalhadas no relatório de transparência da Google. No FAQ a primeira pergunta já explica esse processo:

Por que um órgão governamental pode solicitar meus dados? 

Diversas leis permitem que órgãos governamentais investiguem violações regulamentares ou atividades criminais. O Google recebe solicitações de dados do usuário de órgãos governamentais que estão investigando atividades criminosas, órgãos administrativos, tribunais e outros.

Nesse mesmo link tem mais informações e até mesmo estatísticas do quanto cada governo pede de informações privadas para a Google, e quantas solicitações são atendidas. Curiosamente o Brasil tem pouco menos de 60% dos pedidos resolvidos.

Resumindo: Os dados que O MI6 pegaria de um usuário em Pokémon Go provavelmente são informações que já constam em um banco de dados do governo. É mais eficiente eles irem atrás dessas informações com a Google, Facebook, Apple, etc.

Este Pikachu se recusa a acreditar nesse texto e acredita que Pokémon Go seja uma ferramenta de manipulação usada pelo governo Temer pra monitorar simpatizantes do PT.

Mesmo assim, devo me preocupar?

Pokémon Go não tem nenhum potencial de ajudar a capturar terroristas interessados em correr no parque atrás de Caterpies. Muito menos tem informações úteis para isso que não sejam disponibilizadas em outros lugares. Envolver a Nintendo ou a Niantic num assunto de segurança nacional seria uma piada ou atestado de incompetência desses órgãos.

Com isso em mente, saia de casa, capture uns pokémons e lembre sempre de:

  • Usar Filtro Solar
  • Olhar pros dois lados ao atravessar a rua.

Boa sorte em se tornar um mestre Pokémon!

***

Nota da edição: esse texto foi originalmente publicado no Medium do Gus Fune e cordialmente autorizado para republicação no PdH por motivos de: vem jogar com a gente.

Gus Fune

Hacker de viagens, se tem wi-fi pode ter certeza que ele ainda chega lá se já não foi. Trabalha de qualquer canto cuidando da <a> Epic Awesome</a> e fazendo suas próprias regras."