Neto Barros (PC do B) ficou conhecido em todo o Brasil como o prefeito que, às 18h do dia 12 de novembro de 2015, parou os trens da Vale.
Sua cidade, Baixo Guandu, no Espírito Santo, tem o abastecimento hídrico feito pelo Rio Doce. Àquela altura – sete dias depois da quebra da barragem – a lama já descia em direção à cidade, mas ele não conseguia estabelecer um diálogo com os responsáveis pela tragédia. Colocar as máquinas nos trilhos e paralisar o tráfego férreo foi a maneira que ele encontrou para chamar a atenção das donas da Samarco: Vale do Rio Doce e BHP Billiton.
Quando as primeiras notícias chegaram ao município, os moradores foram ao comércio comprar “qualquer recipiente que guardasse água”, diz Barros. “A Samarco não tinha nos procurado e o responsável pelas relações institucionais da Vale disse que não tinha nada a ver com isso”, explicou o prefeito. Como último recurso, comunicou que iria fechar a ferrovia para “sensibilizar” os responsáveis.
Quando chegou em casa, às 23h30, Neto Barros encontrou um oficial de justiça à sua porta com um decisão que previa multa pessoal e ao município caso a ferrovia não fosse liberada. Nós cronometramos: a cada 15 minutos, um trem da Vale passa pelos trilhos de Baixo Guandu. Isso quer dizer que, no intervalo em que os trilhos ficaram bloqueados, Neto impediu que 22 trens da mineradora passassem pela cidade.
Para escapar da contaminação, a Prefeitura decidiu colocar em prática um antigo plano: passar a captar e tratar a água do Rio Guandu, um dos afluentes do Doce que ficou escanteado por anos (leia aqui sobre os pescadores que estão trabalhando na limpeza do Rio Guandu). Após uma obra emergencial de cinco dias sem parar – pressionada, a Samarco cedeu material para uma das três adutoras construídas e profissionais para auxiliar nas obras –, os cerca de 30 mil habitantes não ficaram sequer um dia sem abastecimento.
Depois do episódio dos trens, Neto tem reforçado a fama de combativo ao apoiar as reivindicações da população da cidade, especialmente os pescadores. "Um pescador em reunião aqui no gabinete disse que, com mais de 30 anos de pesca, nunca tinha comido robalo porque era o peixe mais caro que ele tinha. Outro dia ele reuniu a família e eles comeram justamente robalo, porque não está conseguindo vender. Até o comerciante de assessórios de pesca já está sendo prejudicado. São coisas que não é um salário que a Samarco dá que resolve", conta.
A amplitude dos problemas e das sequelas do desastre é imensa. Questões ambientais como a irrigação de plantações, e o fornecimento de água e alimento para criações já estão dando dor de cabeça. Durante o período de pouco mais de uma hora em que nos recebeu no gabinete, Neto fez questão de pontuar aspectos que muita gente parece querer diminuir. "O Ministro da Integração Nacional Gilberto Occhi esteve aqui, mas não para prestar solidariedade – veio para vender a ideia de que foi um acidente”.
Neto acredita que a Samarco tem que se responsabilizar e reparar os danos causados. “Tudo o que eu falei até agora é o óbvio. Eu represento uma cidade e a cidade toda é vítima. Nós vamos fazer uma mobilização coletiva e cobrar isso da Samarco. É nosso direito ter a vida como era antes”, afirmou.
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Esse texto faz parte da coleção Expedição Rio Doce, reportagem especial produzida para o Papo de Homem pela repórter Nina Neves e pelo repórter e fotógrafo Ismael dos Anjos – iniciada com um chamado à nossa comunidade para recebermos sugestões de perguntas a serem investigadas.
Nosso enviados percorreram 2.500 km da Barragem de Fundão à foz do Rio Doce para investigar a maior tragédia ambiental da história do Brasil. Tem alguma pergunta? Nosso time vai tentar responder a vocês com reportagens que serão publicadas ao longo da semana.
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