Sucesso de bilheteria, o filme tem incomodado parte dos homens que diz que a história ridiculariza e parece odiar homens. Mas será que é isso mesmo?

“Os homens surtam quando não são o centro do universo (?)”

Essa foi uma frase que eu vi circulando no perfil de algumas amigas. Outros perfis masculinos e de tendência conservadora ficaram ressentidos afirmando que o filme seria uma chuva de ódio aos homens e ridicularizando todos os personagens masculinos. Mas eu tenho uma perspectiva diferente.

Barbie e os estereótipos

O filme brinca com estereótipos, de forma mais irônica e divertida o filme todo. Mas veja, não são só os homens que ocupam esse lugar do estereótipo um tanto vergonhoso. As próprias Barbies também: seja quando a Barbie sai pelo mundo real vestida de cowgirl com uma roupa roubada, ou quando elas acreditam que resolveram todos os problemas do mundo real e que são amadas por todas as meninas.

O filme é sobre brincadeiras de criança e assim estamos livres para nos divertir com posições e atitudes ridículas, não é pessoal contra os Ken nem contra os homens. 

Cena do filme Barbie

Mas e a guerra dos sexos e o ódio aos homens?

O filme está todo fundamentado no contraste de dois universos: o mundo real com todos os seus defeitos – com um grande destaque para o machismo – e o mundo da Barbie, onde as mulheres são o centro: as amigas, a suprema corte, a presidente. Quanto ao Ken, bem… ninguém nem nunca pensou nem onde eles dormem. 


Cena do filme Barbie

“A Barbie sempre tem um dia incrível, o Ken só tem um dia incrível quando a Barbie o nota.”

No mundo da Barbie os homens são secundários, acessórios, esquecidos, vivendo em função dos caprichos da Barbie. É quase um INVERSO PERFEITO do que era o mundo quando a Barbie foi criada, na década de 1950. Mas o filme não fala que isso é bom, nem que deve ser assim.

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Sentindo-se diminuído, Ken vive em competição com os outros, e quando se depara com o mundo real, e com a inversão do poder, ele resolve seus ressentimentos disseminando o patriarcado para seus colegas. O mundo Barbie está para sempre contaminado com caras tentando recuperar um sonho de poder e controle que nunca foi deles. E aqui, qualquer semelhança com a realidade e com movimentos masculinistas e redpill, não é mera coincidência.


Cena do filme Barbie

A Barbie tá em crise…

A jornada da Barbie não é sobre guerra dos sexos, é sobre uma crise existencial individual, é sobre o lugar dela no mundo, uma vez que seu espelho de perfeição foi quebrado. Os conflitos com os Ken é quase como se fosse um problema bônus. No entanto, a Barbie não ignora a dor do Ken.

É possível um equilíbrio?

Ainda que a jornada dela esteja focada na sua própria crise existencial, caminhando para a conclusão do filme, a Barbie acolhe o sofrimento do Ken e reforça que aquele antigo e falso equilíbrio realmente só funcionava para uma parte do mundo cor de rosa. Sendo assim, daqui pra frente algumas coisas vão ser diferentes e mais equilibradas.

O filme da Barbie traça vários paralelos com o mundo real, com nossas questões sociais, faz piada com tudo e todos. Ele brinca com esse “machismo invertido” e com as reações masculinas quando se perde o centro e o poder. Mas nenhuma das conclusões é um ódio aos homens. Ao contrário, seria mais um retrato de que nenhum universo funciona bem quando uma parte dele está esquecida e subjugada.


publicado em 03 de Agosto de 2023, 19:31

Gabriella Feola

Editora do Papo de Homem e autora do livro <a href="https://www.amazon.com.br/Amulherar-se-repert%C3%B3rio-constru%C3%A7%C3%A3o-sexualidade-feminina-ebook/dp/B07GBSNST1">Amulherar-se" </a>. Atualmente também sou mestranda da ECA USP