O ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio – era uma prova aplicada às pessoas que estavam no fim do terceiro ano do ensino médio para avaliar a qualidade do ensino das escolas do país. De forma pragmática, os resultados serviam para escolas particulares fazerem propaganda sobre a qualidade de ensino da sua própria instituição e para as pessoas darem risada com as pérolas do ENEM, um compilado das coisas mais absurdas escritas por estudantes desse país.

Em provas de português e matemática, esses dois caras conseguiram falar de religião. Genial.

A partir de 2009, o ENEM passou a ter uma importância muito maior no cenário nacional ao ser usado como forma de seleção unificada nos processos seletivos das universidades federais. Atualmente, cada universidade possui autonomia para utilizar o ENEM como totalidade do seu processo seletivo ou apenas uma parte, como se fosse uma primeira fase, por exemplo. Muitos estudiosos louvaram essa atitude do governo, liderado pelo Fernando Haddad, ministro da Educação, como um grande passo para a democratização do ensino superior no Brasil.

No entanto, esse novo papel do ENEM gerou problemas vinculados a interesses e corrupção. Em um país onde pequena parte da população tem ensino superior e que um dos maiores gargalos para o acesso à universidade é a competição por vagas nas instituições, um exame nacional para seleção de ingresso nas universidades federais só poderia dar merda, ainda mais com nosso histórico de corrupção.

Os problemas do ENEM começaram em 2009, com o vazamento da prova antes da data da aplicação, além da divulgação de gabaritos com respostas embaralhadas. Esses problemas causaram a auto-demissão do presidente do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) na época, Reynaldo Fernandes.

No dia 3 de agosto deste ano, os dados sócio-econômicos sigilosos dos alunos que se inscreveram no ENEM vazaram do site do INEP, ficando à disposição de qualquer um informações como RG e CPF.

Na aplicação da prova, erros de impressão no cabeçalho do gabarito da prova amarela induziram alunos a preenchê-lo de forma errada. Além disso, houve o vazamento do tema da redação, durante a prova, pois um jornalista de Pernambuco publicou na Internet uma foto da prova, via celular. Essa atitude gerou uma resposta ríspida do MEC em seu Twitter:

Cuidado com o Big Brother.

De fato, essa afirmação gerou mais alvoroço nas redes sociais. Muitos achavam que era uma forma de proibição à liberdade de expressão, uma vez que estavam ameaçando as pessoas que estavam reclamando no Twitter sobre a aplicação do ENEM. Claro que, em poucos minutos, o perfil do MEC lançou outra mensagem dizendo que o Twitter estava sendo monitorado para avaliar fraudes durante a aplicação da prova e que, se detectada alguma irregularidade, como a troca de informações pela rede social durante a prova, os candidatos poderiam ter a sua prova anulada.

Para o circo pegar mais fogo ainda, o ENEM foi anulado no dia 8 de novembro a pedido do procurador da república do Ceará, Oscar Costa Filho, e aceito pela juíza Karla de Almeida Miranda Maia. Poucos dias depois, a anulação foi cancelada pois traria mais transtorno ainda, tanto para os organizadores e autoridades como para os próprios estudantes, sem falar em prejuízos financeiros da ordem de 180 milhões de reais caso fosse necessário aplicar um novo ENEM.

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Para arrumar o problema, o MEC abriu um canal de reclamações para as pessoas que pegaram a prova amarela. No site, os candidatos podem dizer se querem a correção do gabarito de forma correta ou invertida, de acordo com o erro que o estudante cometeu ou não.

O jeitinho brasileiro

Existe muita gente indignada com essa situação, cada um com suas razões. Se fizermos uma análise fria sobre o assunto, essa história poderia até ser vista como previsível. O problema da corrupção já é bem antigo no Brasil; em uma seleção de ingressantes em universidades, não é assim tão surpreendente que esse tipo de problema também apareça no Ministério da Educação.

Acho muito engraçada essa indignação na sociedade que, acomodada “como nunca esteve antes na história desse país”, não faz nada a respeito.

O jeitinho brasileiro negativo tem origem nessa inteligência que sempre encontra uma saída (elogiada por Paul Bennett no TEDx Amazônia).

Muitas destas pessoas, indignadas com a situação da corrupção no país, não param pra refletir que a corrupção começa justamente em atos como twittar uma resposta da prova na hora que vai ao banheiro. Sejamos calculistas, em qualquer vestibular é possível ir ao banheiro, portando um celular, e ter acesso à Internet para encontrar as respostas das questões. O que muitas pessoas não entendem é que não deveriam fazer isso. Estão trapaceando. Ganhando em detrimento de outras pessoas que, consequentemente, estão perdendo.

No meio de nós, assim nasce a corrupção, também conhecida como “jeitinho brasileiro”.

Alguns poucos estudantes fizeram passeatas e encontros para reivindicar maior seriedade na aplicação do ENEM, mas a participação foi pífia. Parece que isso tem mais caráter político partidário (justamente porque acabamos de sair de uma eleição) do que reivindicação de direitos. Afinal de contas, quem se sentiu lesado por ter invertido as questões na hora de preencher o gabarito pode simplesmente solicitar ao MEC a correção de forma adequada. Logo, não há prejudicados.

Como humilde cidadão brasileiro, um pouco informado e formado, apoio as decisões do MEC de monitorar e condenar as pessoas que trapacearam durante a aplicação da prova e, ainda, confirmo o meu apoio às políticas de inclusão do Ministério da Educação, aprovada já por diversos especialistas da área de educação e muitos reitores de universidades federais.

Aos jovens que reclamam do ENEM, deixo um conselho: se não passarem no vestibular esse ano, parem de reclamar e estudem mais.

Danilo Scorzoni Ré

Engenheiro Florestal, amante da natureza e de ecoturismo. Apesar de ambientalista, não gosta de eco-chato e ainda acredita na capacidade do ser humano em promover um futuro melhor. É <a>@dscorzoni</a> no Twitter."