Antes de começar esse debate, precisamos desconstruir o mito de que o homem é movido a sexo. Ou, pelo menos, de que ele tem invariavelmente mais apetite sexual do que a mulher. Com todos de acordo (essa percepção macro é facilmente errônea, pois cada um tem mais ou menos libido como resultado de diversos fatores), sigamos.

Conversando com um amigo, o João Silva*, pai de duas lindas meninas ainda pequenas, ele não hesitou quando perguntei se o ritmo sexual do casal desacelerou quando nasceu a primeira: “Houve uma mudança considerável na nossa frequência sexual após a chegada da primeira filha”.

A primeira “tentativa” do João foi uns quatro meses depois do nascimento da pequena que, segundo ele, não rolou porque a esposa sentia dores e ainda não estava conseguindo relaxar. No sexto mês, começaram a conversar (!) sobre retomar a rotina sexual. “A libido dela ainda estava baixíssima e foi a vontade dela que continuou sendo respeitada. Naquele momento, acabei esfriando minha vontade também”.

E agora, João?

“Pra ser sincero até mais ou menos 1 ano, levei numa boa. Entendia a complexidade do momento, das preocupações com a maternidade e a própria volta ao trabalho (…). Depois disso, comecei a ficar incomodado”.

Na visão do meu amigo João, a ideia de que o homem "precisa entender" que, depois dos filhos, a vida do casal muda pode trazer muito sofrimento, pois trata-se de uma responsabilidade de ambos em ume relação. Afinal, a vida de um casal é vivida e decidida a dois, unilateralmente.

A dica do terapeuta Anderson Martiniano, também amigo e que está vivendo a experiência com filho pequeno em casa, segue a linha da compreensão. “É preciso prestar apoio à mãe e ao bebê e entender que a fase é passageira. O carinho, abraços, beijos e a famosa conchinha podem estimular o casal à prática do sexo, mas caso não ocorra não se deve entender como rejeição”.

A questão parece mesmo estar mais ligada com estresse do que com gênero (homem e mulher), por diversos motivos: mudança de rotina imposta pela criança, aprendizado inédito sobre como lidar com frustrações e dificuldades no manejo com o bebê, mudança de ambiente e adaptações da casa, comunicação entre o casal alterada pela irritabilidade intrínseca do momento novo, distorção interpretativa por conta de desgaste físico e psicológico, afastamento de recursos como lazer e sociabilidade, conflitos familiares sobre como cuidar do bebê e dificuldades de processamento cognitivo por falta de repertório emocional ou reativo para lidar com a situação nova.

A ciência diz algo?

Interessante é que, pesquisando mais sobre a “problemática”, cheguei a um estudo publicado pelo Journal of Sexual Medicine, que diz que o cansaço e o estresse de ser pai recente também podem causar perda de desejo pelos parceiros. Ou seja, amigos, não tem essa de “estou sempre pronto pra transar”. Nossa vida sexual é pautada muito mais do que por hormônios à flor da pele.

A psicóloga Janaina Rodrigues Machado me contou que, por aí, a questão sempre gira muito em torno do tempo que a mulher está voltada à maternidade, a necessidade do homem compreender esse tempo e da importância do diálogo (constante) entre o casal sobre o sexo. E até a possibilidade de buscarem ajuda terapêutica caso não consigam estabelecer estratégias para retomar o romance e a vida sexual que tinham antes da prole:

“Mas, oras, se a receita está aí, por que muitas vezes a realidade não é essa? Porque alguns relacionados esfriam e às vezes até terminam? Por que a busca por outra pessoa para satisfazer os 'instintos masculinos' é comum? E ainda, pior, porque algumas mulheres preferem ceder às pressões para cumprir suas ‘obrigações matrimoniais’?”  

A verdade nem sempre é reconfortante e, nesse caso, acreditamos (Jana e eu) que as crenças que construímos ao longo da vida determinam nossos sentimentos e comportamentos. À medida em que os meninos são educados para lutar e vencer, as meninas o são para cuidar e agradar. “Na vida adulta só pode refletir esses papéis!”.

Essas desconstruções precisam ser aprendidas.

Voltando ao estudo do Journal of Sexual Medicine, o alto interesse dos pais novatos pelas mães esposas se dá também pelo fato de a necessidade de exercitar sentimentos de intimidade. Os pais experimentam, sim, uma diminuição no desejo sexual após o parto por conta da fadiga e falta de tempo livre.

O meu amigo João não chegou a admitir a tal fadiga após a chegada das filhas, mas conhecendo-o (e outras famílias com crianças) sabemos que esse é um ponto a ser considerado: ser pai/mãe é puxado, sendo o diálogo a melhor forma de trazer isso à tona e deixar o negócio bom para todo mundo.

“Não adianta ficar tentando adivinhar o que o outro está pensando ou deixando de pensar. Esse cultura (de abertura para o diálogo sobre sexo) deve ser criada desde antes do nascimento. Se possível e de preferência, até mesmo antes do casamento. Talvez mais saudável nesse período, para além do sexo, é não deixar de sair, ir ao cinema, pois são esses vínculos que vão manter a relação nesse período mais difícil”, disse sabiamente o João. Nada como a experiência, né?

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Aqui não estou rechaçando a importância da sexualidade em uma relação afetiva – até porque para muitos casais ela é mais (ou menos) fundamental.

Estou, sim, propondo refletirmos que, após a gravidez, tanto homens quanto mulheres sofrem mudanças ambientais, psicológicas e biológicas. Sigo com a Anderson: “É preciso aceitarmos que estes fatores interferem no apetite sexual e suas causas são tão justificáveis quanto qualquer disfunção da sexualidade”.

Mas é, sim, possível canalizar essa energia intensa da libido com algumas “técnicas”:

1. Conheça-se, dê-se prazer, masturbe-se

Nós, melhor do que ninguém, sabemos o que nos dá (ou dará) prazer em cada momento. Não há problema algum na masturbação durante o casamento. A psicóloga Regina Navarro, em uma de suas brilhantes colunas para o UOL, afirma que a masturbação para casados e solteiros só se tornou algo “proibitivo” porque a Igreja a taxou como pecado:

“Por conta dos preconceitos encontramos pessoas culpadas e amedrontadas com seus próprios desejos e com a forma de realizá-los. Isso impede que a masturbação se torne a experiência libertadora e satisfatória que ela pode ser”.

O método, por exemplo, foi adotado pelo João: “Quase sempre recorri à tradicional forma de aliviar as tensões (…), o tal ‘vício de menino’.”

Resumo: masturbe-se à vontade, amigo! Pode ajudar no período de pouca atividade sexual na sua casa!

2. Controle sua alimentação e o tesão

Se está muito difícil só pela masturbação, pelo diálogo ou pela compreensão de que sua esposa agora é mãe e vocês terão que dividir a vida sexual anterior à gravidez com as demandas com um novo membro da família, coma soja.

Brincadeiras à parte, um artigo do site Fatherly afirma que a proteína de soja é rica em isoflavona, elemento semelhante ao estrogênio. Ou seja, uma dieta rica em soja pode ajudar a diminuir os níveis de testosterona de um homem e, consequentemente, esse tesão louco.

Por outro lado, alimentos ricos em gorduras saturadas e proteínas animais podem ser associados a libidos superiores. Portanto, cuidado com esses nessa fase.

3. Sexo não é só penetração

Se ela está reclamando de dores, desconfortos ou ainda não se adaptou à rotina pós-chegada do bebê, forçar a barra para transar não é o caminho – como já discutimos no início.

Agora, quem sabe se com jeitinho, você não cria um momento favorável (para ambos) e vocês não trocam pelo menos umas carícias. Ser masturbado por uma mão que não é sua (mas de alguém que você ama) pode ser bem gostoso.

Quem discorda?

4. Dialogue mais e acabe com o tabu que é o sexo

Quem sabe não seja esse o momento de acabar com o tabu que o sexo possa ter sido na relação até então? Para a psicóloga Regina Navarro, a falta de diálogo e reflexões acerca dos problemas dentro do relacionamento é o que leva ao fim dos mesmos.

Uma frase ótima que li da especialista e que corrobora muito com o que estamos falando aqui é: "É o tesão que leva à criatividade. Sem desejo pelo parceiro, não tem criatividade e ânimo que deem jeito na relação".

Permito-me a acrescentar aqui que, sem diálogo, não há a chance de ser criativo com o parceiro.

Olha só a opinião (forte) do Anderson: “Nós, homens, continuamos lutando com modelos ainda não descartados de que o sexo se torna muitas vezes uma obrigação feminina tanto quanto as tarefas domésticas. Porém não precisamos qualificar o lado certo ou errado assim como fazemos com a política atualmente, é preciso dialogar”.

E eu não poderia encerrar esse artigo (e abrir para a discussão nos comentários) sem levantar uma questão importante: quão saudável é tornar o sexo, obrigatoriamente, protagonista de relacionamentos afetivos?

Vamos conversar.

Por motivos óbvios, João Silva* é um nome fictício do nosso personagem.

Mecenas: Natura

Natura Homem acredita que existem tantas maneiras de exercer as masculinidades quanto o número de homens que existem no mundo e que os homens podem, sim, se abrir a conversas desse porte, buscando melhorias reais. Sem modelos a serem seguidos, sem colocar ainda mais pressão sobre os nossos ombros.

As nossas verdades, os nossos ritmos, os nossos jeitos de ser e estar no mundo. Seja homem? Seja você. Por inteiro. Natura Homem celebra todas as maneiras de ser homem.

Danilo Gonçalves

Um cara alegre e gosta de ser lembrado assim. Jornalista de formação, com um pé na publicidade, gosta de Novos Baianos, Doces Bárbaros e Beatles. Já gostou de Calypso e como todo gay que se preze, é fã da Beyonce.