Olá.
Bem-vindo ao novo metrô da cidade. Quanto é o bilhete?
Isso é o melhor: não custa nada. Tudo grátis. Bom, na verdade, você é obrigado a usar nosso metrô.
Você parece confuso…
Calma. Vou apresentar nossas instalações. Siga-me, por favor.
Falei que este metrô é novo, mas não é bem verdade. Ele sempre existiu e você está aqui desde que nasceu. Só que, agora, percebe que é um de nossos passageiros. Cuidado com o degrau. Isso.
Aonde nosso metrô pode te levar? Bom, essa é a parte engraçada. Nossas linhas mudam de trajeto a cada momento, os trilhos estão sempre se cruzando, levando nossos passageiros a estações imprevisíveis, onde há conexões para lugares inesperados. Conheci um passageiro argentino, meio cegueta, que chamou nossa rede de jardim dos caminhos que se bifurcam.
Há algo curioso. Sempre que posso, pergunto aos passageiros que terminaram sua jornada qual foi a última estação. E, não importa de que direção vêm, sempre respondem a mesma coisa, que desceram em um lugar chamado “Destino”.
Você parece pálido. Tudo bem?
Não se preocupe, vou dar boas dicas para sua viagem.
Em primeiro lugar, o fundamental é não se perder. Sei, você está se perguntando que papo trouxa é esse, já que nossas linhas sempre mudam de trajeto e não sabemos aonde podem levar. A questão é que você não pode se perder de si mesmo. Isso é terrível.
Conheci um passageiro que, certa vez, olhou pela janela do seu vagão e viu aquele que deveria ter sentado no trem que seguia em sentido oposto. Podia ter feito parte da história da música e da cultura no século vinte, mas acabou trabalhando em uma padaria – o que não era sua vocação.
E que fazer para não se perder? Bom, o segredo está em suas escolhas. Qual a linha você vai decidir pegar, em que estações irá descer e quais as conexões fará.
Claro, é comum que a vida faça algumas escolhas por você. Às vezes, nossos trens podem levar a uma estação inesperada, até mesmo trágica. Mortes de entes queridos, doenças, acidentes e decepções amorosas estarão lá, na próxima parada. Mas a verdade é que até as estações mais sombrias possuem conexões que levam a destinos surpreendentes.
O segredo está em manter a calma e esperar os olhos se acostumarem com a pouca luz. Há sempre uma placa indicativa na penumbra.
Por exemplo, conheci um passageiro que teve as pernas mutiladas em uma das estações. Era um grande velejador. Mas seguiu por outras conexões, tornou-se uma personalidade política e, após muito desafios, voltou a praticar seu esporte, mesmo sem as pernas.
Como você pode deduzir dessa história, preciso lhe prevenir sobre nossos condutores. É que eles adoram sacanear os passageiros, têm um senso de humor estranho. Aceleram do nada, tornando sua vida uma balbúrdia, ou freiam bruscamente, fazendo a composição quase se descarrilhar com todos os seus planos. Farão de tudo para provocar solavancos e derrubar você, só pela gargalhada.
Infelizmente, nossa companhia não pode fazer nada. Seu sindicato, a Associação dos Condutores Autônomos e Supressores da Ordem, A.C.A.S.O., é muito forte.
Portanto, você precisa ter equilíbrio e flexibilidade, precisa corrigir sua postura a cada momento para não cair. O truque é ter jogo de cintura e, se for jogado em uma estação indesejada, fazer o melhor das conexões que estarão disponíveis.
Esse foi o caso de um passageiro judeu que conheci. Ele sonhava seguir na viagem como jornalista, mas um condutor meio nazista não permitiu que seguisse por esses trilhos. Sua escolha foi pegar a conexão para a estação mais próxima de seu plano inicial: tornou-se fotógrafo. No final, foi consagrado como um dos maiores fotógrafos de seu tempo e, graças a isso, viajou pelo mundo inteiro e teve tórridas paixões, inclusive com atrizes hollywoodianas.
Falando em relacionamentos, uma coisa é certa: você não pode fazer essa viagem sozinho.
Você esbarrará em muitos passageiros durante as conexões no metrô, mas outros seguirão ao seu lado por muito tempo. E nossos usuários mais experientes afirmam que a capacidade de amar e compartilhar a jornada com esses companheiros determina qual será sua próxima estação.
Porém, há momentos em que terá de se despedir dessas pessoas, pois elas escolherão conexões distintas ou descerão em outras estações.
É preciso aceitar com sabedoria a despedida.
Certa vez, um condutor que já foi taxista me disse que o segredo é “permanecer em um estado de constante partida enquanto se está em permanente chegada, pronto para novas apresentações e despedidas”, pois “essa é uma jornada que não precisa de explicações ou de sentido, só de viajantes.”
E mais viajantes chegam a cada instante em nosso metrô. Conheci muitos passageiros que desceram na estação da paternidade sem planejar. Gravidez fora dos planos é outra situação em que a vida faz as escolhas por nós. Mas, apesar de confusos, não demora para esses passageiros enxergarem, nos olhos de suas crianças, os reflexos de uma única linha de metrô, que sempre foi destinada a levá-los até seus filhos.
Quem me explicou essa mágica do destino foi um passageiro inglês que amava gatos. O maravilhoso de nosso metrô é que, quando você olha para a frente, vê inúmeras linhas, conexões e estações para escolher. Mas, quando olha para trás, você vê apenas trilhos em linha reta, levando diretamente, sem conexões, para o lugar em que está.
É que, toda vez que se escolhe uma estação ou conexão, as outras possíveis deixam de existir para você. Cada escolha que faz elimina outras, e a própria linha de metrô que você seguiu é transformada por sua decisão. Por isso, tome muito cuidado ao escolher seu caminho. E aprenda a amá-lo, pois ele é seu.
Isso quem me ensinou foi outro passageiro, com um bigode engraçado e sotaque alemão.
Esse sujeito sempre voltava na estação em que trabalho. Acho que estava andando em círculos. Mas, ao invés de concluir que se perdeu, interpretou que nosso metrô era circular. E aí ficava repetindo uma coisa estranha: “Amor Fati! Amor Fati!”
Um dia tomei coragem e perguntei se “Fati” era o nome de sua amada, apelido de “Fátima”. “Não, isso é latim”, ele respondeu, “quer dizer amor ao destino“.
E aí ele me ensinou a filosofia por trás dessas palavras. Você precisa amar o destino que lhe trouxe até esta estação como se tivesse de a ela retornar ainda inúmeras vezes. E isso porque cada momento dessa viagem é eterno. Você precisa amar cada estação e cada conexão que lhe conduz nesta jornada, aprender a apreciar mesmo as escolhas erradas, mesmo as escolhas que o acaso tomou por você, pois tudo isso forma sua trajetória pessoal.
Aprenda a ter amor ao destino.
Ainda está um pouco confuso sobre quais caminhos escolher? Pois então preste a atenção, já que será meu último conselho.
Certa vez fiz amizade com dois passageiros, um homem culto e um velho índio. Ambos conheciam muitos segredos de nosso metrô. Pareciam saber exatamente que linha escolher e em que estações descer para chegarem ao destino desejado. Metido como sou, pedi uma dica sobre como escolher o caminho certo. E sua resposta me surpreendeu:
“Um caminho é só um caminho. Se achar que não deve segui-lo, não permaneça nele. Mas sua decisão deve ser isenta de medo e ambição. Olhe bem cada caminho, e com um propósito.
Experimente um caminho quantas vezes quiser.
Depois, pergunte-se, e apenas a si mesmo, uma coisa: esse caminho tem coração? Se tiver, é bom. Se não tiver, não presta.
Todos os caminhos são o mesmo, não conduzem a lugar algum. Mas uns têm coração, e outros não.”
Opa, nosso próximo trem acaba de chegar, e pontualmente.
Está pronto para continuar a viagem?
Com seu coração?
Mecenas: Subway
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