Quando conhecemos os ativistas do Movimento de Atingidos por Barragens, em Mariana, eles estavam fazendo uma atividade com um grupo de adolescentes de Paracatu de Baixo, um dos distritos atingidos pela lama de rejeitos da Samarco. Se tratava da dinâmica do sonho, em que todos os presentes listam seus desejos. Naquela sala, o pedido era um só. Sem exceção, eles queriam sua comunidade de volta.

O MAB trabalha com famílias atingidas para que elas entendam quais são seus direitos e os consigam. O Movimento surgiu por uma necessidade, como desdobramento da construção de barragens no País e, neste momento, tem ativistas presentes em toda a Bacia do Rio Doce e em outros municípios atingidos do território nacional.

Nina entrevista Letícia, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) de Minas Gerais, em frente à Igreja de São Francisco de Assis em Mariana. Foto de @ismaeldosanjos

"Nosso papel é contar sobre os direitos já conquistados em situações semelhantes, porque no Brasil não há leis específicas sobre barragem”, explicou Letícia Oliveira, a militante que acompanhava o grupo de adolescentes. “São os atingidos, em movimento, que formam o MAB", disse ela se referindo ao protagonismo fundamental para que as demandas tenham força.

Normalmente, o primeiro direito violado é o de acesso às informações: os dados que aparecem são diferentes entre si e as reuniões confusas. Por isso, é importante que os atingidos se unam e participem ao máximo das discussões relativas à sua situação, e só decidam por acordos quando estiverem seguros e com todas as informações em mãos. “Temos construído as solicitações de acordo com o que eles o que querem, e a pauta do momento é a das casas. O objetivo é que passem o Natal em casa”, contou Letícia três semanas antes do Natal. A “casa” que é possível no momento são apartamentos mobiliados oferecidos pela Samarco onde alguns dos atingidos já estão alocados. A demanda real é pela construção de novos povoados à imagem e semelhança dos antigos, mas o processo deve demorar.

Muito mais que um nome

Não é à toa que o nome do estado é Minas Gerais. Empresas como a Samarco – fundada em Mariana – tem história e laços profundos nas localidades em que se desenvolvem, e na maior parte das vezes são a base da economia de uma região. "Há uma ligação muito forte da comunidade com as mineradoras. A gente não quer que isso acabe, que as empresas vão embora”, afirmou Letícia. No entanto, é uma luta do MAB que o processo de mineração seja repensado para ter mais segurança, que as riquezas fiquem no País e os empregos sejam mantidos, inclusive.

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Segundo os militantes, pesquisas indicam que ainda há minério para ser explorado por mais 115 anos caso o ritmo continue o mesmo. “Então a exploração vai continuar e o lucro também – como já vem acontecendo por mais de 300 anos em Mariana”, disse Letícia. “Que seja feito de maneira a beneficiar as populações locais”.

“Para nós, todos são atingidos, como os que ficaram sem água em Valadares e outros ribeirinhos”, finalizou.

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Esse texto faz parte da coleção Expedição Rio Doce, reportagem especial produzida para o Papo de Homem pela repórter Nina Neves e pelo repórter e fotógrafo Ismael dos Anjos – iniciada com um chamado à nossa comunidade para recebermos sugestões de perguntas a serem investigadas.

Nosso enviados percorreram 2.500 km da Barragem de Fundão à foz do Rio Doce para investigar a maior tragédia ambiental da história do Brasil. Tem alguma pergunta? Nosso time vai tentar responder a vocês com reportagens que serão publicadas ao longo da semana.

No futuro pretendemos realizar mais reportagens especiais sobre temas de grande interesse das pessoas, e essa ida a Mariana é uma semente dos  nossos sonhos para o futuro.

Puxe uma cadeira e construa esse especial conosco.

Nina Neves

É jornalista freelancer, fotógrafa amadora por hereditariedade, baiana em SP porque assim é a vida, interessada na cultura em todas as suas formas. E cuida de vinte plantas na varanda.