Envelhecer não é exatamente um processo dos mais fáceis. Se por um lado a idade te faz ganhar em autoconhecimento, confiança, experiência de vida, te dá aquela serenidade no olhar que apenas as pessoas que já passaram por poucas e boas têm, por outro lado ela também traz aspectos bem dolorosos, que vão desde as responsabilidades para as quais não estamos exatamente preparados até a necessidade de declarar anualmente imposto de renda, passando por essa dor nas costas que eu tenho certeza que começou no exato dia em que eu fiz 32 anos e apenas não quer passar.
E um processo que parece ser repetir com todo ser humano conforme ele envelhece é o progressivo crescimento da implicância com as gerações que vieram depois. Sim, essa constante sensação de que na sua época é que era certo, que antigamente era melhor, que o jovem está avacalhando com tudo, e que fazia o seu avô dizer que seu pai não sabia de nada porque nunca viu uma guerra, seu pai dizer que você não sabia de nada porque não viu a ditadura, você dizer que o adolescente hoje não sabe de nada porque usou mertiolate que não arde. Sim, a nossa versão é um pouco ridícula, mas foi o que sobrou pra gente.
Isso fica patente de várias maneiras. Não apenas por essa idealização de um passado que não foi necessariamente tão bom assim – mertiolate arder não forja caráter, ter usado moeda num telefone não nos torna melhores, único diferencial que a nossa geração tem por ter comprado CDs é aquele monte de tranqueira empilhada no quarto – como também por uma certa incapacidade de perceber que, sejamos sinceros, quase todas as gerações de jovens tem mais ou menos os mesmos defeitos.
Se o jovem de hoje se exibe mais na Internet não é necessariamente porque ele é mais fútil, ou mais narcisista ou menos interessado na vida real do que nós fomos, mas sim porque bem, ele tem mais Internet. Quando ela era discada, você jamais poderia ser um YouTuber ou postar mil fotos no mesmo dia pelo simples fato de que ainda não haviam inventado o Youtube e o máximo que a sua conexão permitia era upar uma foto, de baixa resolução, que você enviava pra impressionar aquela garota paranaense no MirC que na verdade era um homem de meia idade morando em Itaboraí.
Se o jovem de hoje acampa por sei lá quantos dias pra ser o primeiro na fila do Justin Bieber, isso diz menos sobre ele ser “trouxa” – qualquer um de nós já tomou decisões passionais, seja por um show, um jogo, um filme, uma chance de dar uns beijinhos na boca – do que sobre o fato de que hoje os pais dão muito mais autonomia para o adolescente médio, já que na minha época pra ir num show do Só Pra Contrariar que não envolveu nem fila e nem acampamento eu precisei ir com um colega de sala e os pais dele.
A verdade é que os impulsos do ser humano quando jovem são sempre mais ou menos parecidos: existe a necessidade de pertencimento a grupo, a vontade de comprovar a maturidade, a descoberta de várias experiências novas e da maneira correta de lidar com elas. O que vai mudar são os meios a que ele vai ter acesso e a forma como ele vai usar esses meios para lidar com isso. Você não pode garantir que se tivesse 15 anos hoje não seria um YouTuber amador, que se seus pais deixassem não teria acampado pra ir naquele show do Guns, que realmente iria passar o dia todo na rua brincando de pique esconde se tivesse a opção “o dia todo em casa jogando avançados jogos virtuais de tiro online com toda a galera da sala”. Essas decisões são muito menos relacionadas ao “tipo” de jovem e muito mais ao tipo de opção que o jovem tem e ao que está acontecendo ao redor dele na época.
Então, antes de a gente criticar o “jovem” ou rir das decisões meio passionais e imaturas que ele toma é interessante lembrar que bem, tomar decisões meio passionais e imaturas é a síntese de ser jovem e é um processo pelo qual todos nós passamos, em um grau ou outro. Seja a fila do Justin, sejam as selfies, seja o videozinho sobre o game da semana, seja a banheira de Nutella, são todas versões atualizadas das experiências que nós tivemos e que essa meninada precisa ter pra um dia chegar de maneira (mais ou menos) saudável até a idade adulta.
Quer dizer, a banheira de Nutella eu não sei se é realmente essencial, não lembro de ninguém ter enchido uma banheira com, sei lá, Amendocrem, quando eu era adolescente.
Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.