Fui assistir o tal Corinthians e Boca em um bar. Não que seja grande fã de futebol, pelo contrário. Nunca assisti jogo em estádio, raramente páro para assistir alguma pelada e, quando moleque, sempre escutava “você vai no gol”, porque era uma piada infame com a bola no pé.
De todo modo, assistir com um monte de fanáticos é uma experiência fantástica. Xingam o juiz, fazem poropopó e incentivam os jogadores como se o megafone intermunicipal estivesse ligado e fosse reverberar cada corre-seu-desgraçado que fosse falado.
Tensão instalada. E o Corinthians fez um gol.
Enquanto todos pulavam, eu ria da empolgação e passei a prestar atenção em um senhor de uns 50 anos, sentado umas três mesas para frente. Dava para ver de longe a jugular do colega fanático. De pé, batia os pés no chão e chacoalhava o braço que segurava o copo de cerveja. No copo já não restava nada, a cerveja voava, ensopava a camiseta. Parecia que queria colocar para fora algo que não cabia, como se a felicidade fosse demais para os pouco mais um e sessenta. Gritava meia dúzia de palavrões concatenados, misturados com umas duas ou três palavras de incentivo, que resultavam em algo totalmente incompreensível. Era o retrato do descontrole. Parecia um retardado.
Senti inveja. Autêntica. Malditas sejam as travas que não nos deixam passar mais tempo em um estado parecido com o daquela senhor. A estabilidade de um monge budista, que encara a vida com um sorriso no peito é linda, mas amigo me desculpe: o caos é fundamental. Naquele meio minuto de êxtase, podia cair um meteoro flamejante no teto do bar, que os ânimos continuariam alí, inalterados. Pela tal felicidade incondicional e descontrolada trabalhamos a vida toda. Acordamos cedo, deixamos de almoçar e compramos problemas dos outros. Para chegar não sabemos onde e nem por quê.
Eu queria parecer um retardado mais vezes.
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