Meu chefe era um imbecil. Os outros colegas do banco se dividiam em dois grupos: os traíras prontos para puxar meu tapete a qualquer momento e os playboys de gelzinho. Cada dia de trabalho me dava vontade de vomitar.
Mas eu encontrei uma escapatória. Álcool, balada e perdição.
Chegando tarde no trabalho
Nesses anos obscuros da minha vida, eu saía três a cinco vezes por semana.
No começo, era um baladeiro-mirim. Saía apenas sexta e sábado de noite. Depois descobri as festinhas escondidas de domingo. Me juntei aos pseudo-cools que dizem que “quarta-feira é o melhor dia de balada” e ao final também coloquei no pacote as festas de segunda dos riquinhos que não precisam trabalhar.
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Só que eu era diferente dessa última turma: eu precisava bater cartão no serviço. Precisava do salário pingando todo mês na conta, igual um drogado precisa de heroína. Tentei largar várias vezes, mas era difícil. Tinha pensado várias vezes em abandonar tudo e talvez estudar para algum concurso. Ou vender cosmético da Avon. Qualquer coisa seria melhor do que trabalhar naquele banco de gente semi-morta.
Não era um banco de povão qualquer. Era mercado financeiro com operações milionárias acontecendo todo dia em nossas mesas. Ganhávamos bem e em troca vendíamos alma e corpo. Uma jornada de trabalho geralmente durava 14 horas no nosso departamento.
Como era costumeiro ficar trabalhando até de madrugada, algumas vezes era normal entrar no trabalho pelas dez, onze da manhã. E eu usei essa brecha para poder cair na balada durante a semana e ir trabalhar no dia seguinte depois do almoço.
Por um lado, eu valorizava o meu emprego duramente conquistado. Por outro lado, eu queria mesmo que tudo explodisse. E mesmo se eu fosse demitido, meu CV e conexões eram boas o suficiente para conseguir outro emprego parecido em outro banco ou numa das Big Four.
Curiosamente, foi nas baladas que eu retomei a energia que estava perdendo. Depois de uma grande noitada, eu conseguia até ser mais produtivo e brilhante no trabalho. Era o oxigênio que me faltava.
Esse pensamento de “Eu mereço dar uma relaxada” era a desculpa perfeita para me tornar um BBB. Bêbado, baladeiro e babaca.
Sem comer ninguém
Desde a adolescência até os anos de BBB, sempre fui um peganínguem. De vez em quando beijava uma garota baseado totalmente em sorte aleatória. Tipo uma por ano, quando o ano era bom.
Posso dizer que tinha boas habilidades sociais. Sempre tive amigos e era costumeiramente conhecido como o bonzinho da turma. Como todos sabemos, isso era altamente brochante para qualquer garota. Eu não entendia nada de mulheres ou de paquera.
Está enganado quem acha que vou falar de PUA (Pick-Up Artists). Na minha época não tinha nada disso. Não tinha negs, state, microcalibration nem nada. Não tinha Dr. Love, artigos do Gitti, Cabana PdH ou qualquer guru de sedução. Eu estava sozinho nessa jornada.
Decidi que era hora de virar um baladeiro e descobrir o caminho das pedras sozinho. Não dava nem mesmo para contar com meus amigos, pois eles eram todos nerds do RPG que ficavam comendo Fandangos, bebendo Coca-cola e assistindo Dragonball Z até de madrugada. Resumo: se cagavam na calça com a simples ideia de ir tomar fora de mulher na noite. Um deles inclusive era alérgico a cigarro e quase teve um ataque quando tentamos “sair de balada”.
Lá estava eu, na fila da balada, sem conhecer ninguém. Nada a perder? Rá!!! Foi assustador. Eu olhava as roupas e cabelos dos caras bacanas que estavam acompanhados ou rodando um xaveco bem mandado e comparava com meu estilo coxinha. Durante a balada toda, me senti como se eu fosse uma gordinha no meio de um casting de modelos.
Precisava de um amigo onde me apoiar. Como eu também não fumo (nenhum de nós nerds fumávamos), resolvi ficar com outro amigo imaginário na mão: uma latinha de cerveja. Geladinha. Parecia até que me ajudava a ficar de pé e não perder o equilíbrio. De vez em quando tomava uma tequila ou vodka também.
Histórias de um BBB
Sempre fui meio torto das ideias. Com a influência do álcool então, ficava pior ainda. Não dá para contar todas as histórias aqui, mas lá vão algumas:
• Uma japinha estava passando pelo corredor. Segurei-a pelo punho e disse com tom perverso: “Onde você pensa que vai?”. Antes que ela pudesse responder, coloquei sua mão dentro da minha cueca para que ela pegasse no meu pinto… mole! Ela ficou com uma cara de WTF e na sequência engatamos um beijo de três minutos: cortei o beijo pra ir buscar mais breja no bar.
• Sempre voltava para casa com 5 a 10 telefones diferentes no meu celular ou em guardanapos. Nunca lembrava exatamente quem era quem. No total, devem ter sido mais de 1000 telefones (não estou exagerando, pois fui um BBB entre dois a três anos de minha vida bebendo como um imbecil).
• Desses mil números, apenas 1 (um!) resultou em sexo: foi com uma maluca acabadona de 38 anos e corpinho gelatinoso de 50. Transei meia bomba com ela e fingi que gozei para poder parar sem magoa-la.
• Quase nunca entrei em briga, mas me machuquei uma vez, tomando um murro no nariz após agarrar uma garota sentada na mesa junto com o namorado.
• Tomei oito tequilas num restaurante-bar mexicano. Achei que era o Jiraya (aquele ninja da TV Manchete) e quis ensinar a galera do bar como dar um mortal para trás. Caí de cabeça no chão. Torci o pescoço e a bacia.
• Vomitei dentro de um carro policial enquanto estava sendo levado a um hospital para tomar soro. Diz a lenda que o policial ficou muito desconcertado e que eu aparentemente havia comido macarronada algumas horas antes de começar a beber. Imagine.
• Fora do volante, quase fui atropelado e quase morri dirigindo bêbado. Bati o carro algumas vezes.
“Quem num guenta bebe leite!”
Na época, essas histórias eram engraçadas.
O tempo foi passando… No lugar dos nerds, meus novos amigos eram outros Bêbados Baladeiros Babacas que davam risada e contavam suas próprias presepadas com muitos elementos visuais de tosquidão e escatologia.
Éramos todos infelizes e em processo de fuga infantil por meio do álcool e da “night”. Um reforçava as crenças do outro de que era cool se estragar e causar muito. As frases mais comuns eram:
“Quem num guenta bebe leite!”
“O negócio é causar geral! Nossa, velho, hoje eu tou a fim de ficar m-u-c-h-o l-o-c-o!”
“Ontem foi épico! Foda que não lembro de nada!”
“Esse cara é o mais infernal de todos! Robertão-sem-noção! Hahaha!”
Esse grupo de “guerreiros” surgiu espontaneamente. Nosso único interesse comum era a balada e causar geral. Organizávamos festas e viagens juntos, sempre com o propósito de ficar lesados e tentar pegar mulher.
O problema era que não tínhamos a elegância e os culhões de chegar junto, sóbrio, numa garota. Não saberíamos o que dizer, e por isso não havia a confiança de fazer a abordagem sem o líquido milagroso. Com o álcool, vinha toda a nossa pretensa desenvoltura e a gente ficava engraçado pacas. Ou pelo menos a gente se achava engraçado.
Muitas vezes, a simples confiança da bebida era suficiente para conseguirmos uns beijos aqui e uns amassos ali. Isso reforçava a crença de que era importante beber para se dar bem. E, mesmo nas ocasiões que a gente só tomava toco a noite toda, pelo menos havia o conforto em dar risadas juntos, e no dia seguinte contar vantagem de como cada um “ficou muito louco e causou demais”.
A realidade é que ficar bêbado é uma alternativa muito conveniente para quem é inseguro. É uma ilusão para quem não quer admitir a dura realidade de não saber criar conexões e atração com o sexo oposto. A loira gelada nunca nos rejeita.
Com o tempo, alguns de nós começavam a namorar e se afastavam dessas noitadas destruidoras. Num processo de mutualismo, íamos recrutando novos guerreiros com as mesmas características de BBB. Éramos como um grande organismo se regenerando e se perpetuando.
E eu?
Vou pular parte da minha história. Larguei o trampo miserável. Entre trancos e barrancos, aprendi algumas coisas sobre o que é ser homem.
Aprendi a ter confiança em mim mesmo e a transmitir meu melhor em uma interação com uma garota atraente.
Aprendi a largar o álcool, essa muleta torta que aparentemente me sustentava, mas que me deixava cada dia mais atrofiado.
Sim, hoje sou apenas um tiozão casado e careta recebendo o convite para contar minha história no PapodeHomem. Não sou psicólogo nem pai de ninguém e não tenho credencial para dar qualquer lição de moral aqui, principalmente sendo o BBB da história.
Apenas compartilho minhas confissões secretas e espero que essa interpretação da história tenha alguma utilidade para quem se identificar com essa forma imatura de beber.
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