A dor física me instiga desde pequena. Quando comecei a me masturbar, percebi que uma força a mais me excitava, como se daquele jeito eu sentisse mais o meu corpo. Me apertava, me arranhava e imaginava um sexo forte, invasivo, animal.

Tive muitos namoradinhos e o papel de dominante era na maioria das vezes meu. Mandava e desmandava nos meninos como se brincasse de boneca. Sempre os desafiava para ver se algum conseguia me dominar, fosse no dia a dia ou na cama. Nenhum foi persistente ou inteligente o suficiente para entender que o que eu queria mesmo era uma surra. Um ou outro me deu um tapinha na bunda, mas nunca um de mão cheia, nunca um que me fizesse gritar de tesão.

Até que ele apareceu.

Ele me dominou e nem sequer perguntou se eu curtia ou não. Isso não é uma reclamação: gosto de deixar subentendido o que quero na cama, alimento uma espécie de jogo. E ele soube me ler e, mais do que isso, soube jogar.

Força bruta também pode ser um gesto de carinho

Começou na brincadeira besta e no amasso agressivo. Uma mordida aqui, outra ali, mais forte. Um aperto intenso o suficiente para deixar um roxinho, um tapa que a cada estalo ficava mais pesado. Eu o provocava um pouco mais a cada tapinha – meu jeito de dizer:

“É esse o seu melhor?”

E ele respondia batendo mais forte, deixando os cinco dedos e a palma da mão desenhados em mim, como quem diz:

“E você? Aguenta tudo isso?”

Been a bad, bad naughty girl

Faz algumas semanas que ele anda muito preocupado com o trabalho. Não se alimenta bem e o único exercício físico que faz é me comer. Claro que isso afetou o nosso desempenho. Tenho minha porção de ninfomaníaca e, por isso, comprei uma lingerie linda e esperei ele chegar. Quando a porta abriu, só vi um sorriso quase infantil.

Depois veio o inesperado.

Ele vendou meus olhos, coisa que nunca tínhamos feito. Fui submissa e rebelde. Provoquei. Ele me colocou de castigo, de bunda pra cima e me bateu com a primeira coisa que encontrou: um cinto de couro. Me deu três tapas na cara fazendo meu pescoço doer e meu tesão ir à loucura. Fizemos mil sacanagens, perdi a noção do tempo, entrei em outra realidade.

Nesse dia eu perdi minha referência – meus olhos nos olhos dele – pois eu estava vendada. Não vi absolutamente nada. Ele fez o que quis de mim. Quando terminou, tirou a minha venda e reparou em meus olhos cheios de lágrimas. Eu não estava chorando de dor ou medo, foi algo que nem eu sei explicar. Algo muito intenso entre os dois tinha acabado de acontecer e estávamos extasiados. Ficamos aos beijos e carinhos, tomamos um belo banho juntos e dormimos apaixonados.

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Uma hora o roxo sai. E aí?

Tentamos explorar a nossa sexualidade em múltiplas camadas. Falamos sobre o que nos dá tesão, nossos fetiches e putarias. Abrimos novas portas, ainda que com certo receio. Franqueza constrói a nossa confiança mútua.

Dia desses assistimos ao documentário Graphic Sexual Horror, sobre a criação, funcionamento e as pessoas por trás do InSex, o maior site com sessões de sadomasoquismo do mundo, todas feitas por livestream. Cenas violentíssimas e jogos pesados. Não é isso que queremos. Mesmo sendo muito orgulhosa para pedir que pare  – afinal, a sensação de ter aguentado acaba sendo muito melhor ao final –, não vejo graça em ficar com a pele rasgada e ter objetos bizarros enfiados em mim. Ele não quer arrancar meu sangue com o chicote e espremer meus peitos até eles ficarem roxos por falta de circulação.

A tal entrega passa por saudável respeito mútuo aos limites do outro.

Essa história do apanhar-e-bater é só uma das brincadeiras. Fazemos amor-amorzinho, inventamos histórias e situações, usamos brinquedos , transamos por cinco minutos ou cinco horas, transamos só com palavras. Fazemos o sexo rotina, como todos os casais. Não dependemos da transa agressiva.

Hoje, eu não falaria de boca cheia que “eu gosto de apanhar do meu namorado”, não fosse por um fator essencial: confiança. Todo o nosso relacionamento é alicerçado na confiança que um tem no outro. Sem isso, este seria mais um caso para a Maria da Penha.

A cada tapa dele, ao invés de sentir seu tesão, eu poderia achar que apenas desconta frustrações ou que eu, como mulher, sou uma incompetente. Mordidas, apertos, tapas e metidas violentas são uma forma de sentirmos os nossos corpos, as vontades mais primitivas um do outro e uma das facetas que um homem dominante pode apresentar e que nem todo mundo quer ver. Não vejo como machismo da minha parte.

Isso tudo é entrega. Minha e dele. Eu, por me deixar conduzir; ele, por se permitir.

Leitora Anônima

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