Quando o assunto é a relação aluno e professor, a maioria de nós foi criado dentro de uma caixa com moldes. Construiu-se uma hierarquia que tende a colocar o primeiro como um exemplo a ser seguido e o segundo como "subordinado", e muito se segue essa lógica sem questionar o porquê.
Parece que os papéis foram engessados.
Comecei a pensar sobre quando eu era aluna na escola (e seria interessante se vocês também fizessem esse exercício pra compartilhar com a gente depois). Lembro de ver um professor no shopping e ficar surpresa, como se aquele cenário não combinasse com ele, ou ir na casa de amigas que eram filhas de educadoras e achar estranho ver a professora de matemática fazendo o almoço.
Nessa visão congelada sobre o lugar que aluno e educador ocupam, um lá outro cá, muitas travas acabam surgindo. Conversar com nosso entrevistado da semana me fez perceber o quanto perdemos com isso.
Varlei é diretor de teatro estudantil e também faz um trabalho de palhaço em sala de aula. No site do grupo em que atua ele explica melhor:
Somos um grupo de Teatro Estudantil. Isso, porém, não nos faz menores que outros artistas ou coletivos teatrais. O que nos difere, neste sentido, é que o trabalho é realizado com jovens atores, em idade escolar e atuamos dentro de uma escola, o Colégio Central Casa Branca. Temos, dessa forma, forte ligação e compromisso com a educação.
Ele é alguém hierarquicamente "acima" dos alunos, funcionário da escola e auxiliar do professor, mas não está ali para ditar regras e falar o que os alunos devem fazer. Campônio, nome do palhaço que o Varlei faz, entra em sala de aula para sentar junto com os alunos e fazer as atividades, mas com uma diferença: ele abre espaço para vulnerabilidade. Ele auxilia, conversa e erra. A partir disso, as crianças se conectam com ele e perdem o receio de cometer equívocos e serem rechaçadas.
Em outros momentos da conversa, Varlei compartilha que está sempre aprendendo com as crianças. Elas fazem com que ele perceba seus defeitos e fraquezas. “A vulnerabilidade está sempre presente” disse, tanto nos jovens quanto nele, e acho que perceber, sentir e fazer algo a respeito disso é que nos torna mais humanos.
São trocas assim que desmontam a relação engessada entre professor e aluno, trazendo possibilidades mil de aprendizado e deixando evidente a importância de perceber nuances em uma relação.
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Caixa-preta é uma série de relatos em primeira pessoa, na qual homens quebram o silêncio e discutem momentos importantes de suas vidas ou do masculino. Sai toda quinta, aqui no portal e em nosso canal no YouTube.
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