O verão pra quem não gosta de verão

Aaah, o verão. Época de calor, suor, mosquitos e sofrimento  :(

Não sei vocês. Mas, para mim, janeiro é o mês internacional de comprar e usar bermuda nova.

É graças a esse ato consumista anual que consigo encarar duas horas de metrô e caminhada indo e voltando do trabalho todo dia. Ainda bem que posso trabalhar com as pernas de fora sem que a empresa encrenque. Eu até já deixei de mandar currículo para uma vaga bacana só porque desconfiei que me mandariam usar calça no verão. Prioridades, né?

Quando comecei a trabalhar, dez anos atrás, usava bermuda para ir para o trabalho no verão. Ao chegar, pegava a calça jeans na mochila e fazia cosplay de funcionário modelo por nove horas. Foi assim até um dia ensolarado de 2012, quando percebi que tinha esquecido a calça em casa. Morri de vergonha, consultei o código de conduta da empresa para ver se eles poderiam me demitir. Ou, pior, se eles poderiam me forçar a buscar a calça jeans.

No verão seguinte, a tendência das bermudas emplacou de vez nos corredores da empresa. Me senti lançando moda pela primeira vez. Até pensei em sugerir um vestuário ainda mais livre para a coleção primavera-verão do ano seguinte, mas me faltava a autoconfiança para ir trabalhar de vestido e me sobrava bom senso para sair na rua de papete. A questão é: não importa se eu uso shortinho, babydoll de nylon, sandalinha de Jesus ou sunga de crochê. A falta de roupa não vai resolver o problema do calor extremo que assola a minha existência.

Uma vez me disseram que eu tinha que apenas aceitar a sina de habitante de país tropical ou entrar na fila da imigração da Finlândia. Eu até gosto do Brasil, mas não sou obrigado a aceitar sorrindo a fornalha do inferno em que esse País se transforma. Tudo bem que sou privilegiado, moro no Sudeste, onde também faz frio de vez em quando. Não conheço o deserto e o máximo de calor que eu já passei foi durante umas férias na Colômbia. Mas, como um paulistano temporário, preciso dizer: gostar de calor não faz sentido.

Nada contra os caloristas, tenho até amigos que são. Uma dessas pessoas, com quem travo batalhas suadas no Twitter todo ano, me disse que adora calor porque as pessoas ficam mais livres, com menos roupa. Cara amiga, você sabe muito bem que sou a primeira pessoa a defender a diminuição drástica do uso de roupas nesse mundo. Agora, ficar de peito aberto quando o termômetro da Avenida Paulista mostra 38 graus às 9 da manhã é insanidade.

Outro motivo pra acabar com a conversa antes de começar: mosquitos.

Em 2015, foram registrados 1,6 milhão de casos de dengue — mais de 10 vezes o número de casos em 2005. Se já estava ruim com a dengue, imagina agora que tem zika, chikungunya e até casos de febre amarela zunindo no ar? A solução é se preparar para uma guerra toda noite. Eu uso repelente líquido no corpo, outro daqueles de colocar na tomada, um incenso de citronela para espantar mosquitos e um ventilador ligado no máximo pra dificultar o voo desses capetas. E ainda assim fica difícil achar uma posição que me deixe com o mínimo de contato possível com o lençol flamejante.

Dormir acompanhado no verão, então, é um desafio. Mas ficar acordado é pior. Eu fico tão incomodado com suor que levo antitranspirante no bolso até para ir à padaria. Quando está quente, tenho que aguentar suor misturado com repelente e com uma camada de protetor solar que faz com que eu queira que o mundo acabe em banho gelado.

É nessa hora que eu ouço aquela sugestão manjada: mas por que você não dá um jeito de ir à praia, então?

Claro, é mesmo uma ótima ideia brigar com um monte de gente por um espacinho na areia quente longe da sombra, pagar um rim numa água de coco e ficar lá torrando postando foto no Instagram. Não me leve a mal, acho praia lindo, mas na alta temporada ela reúne duas das coisas que mais avacalham o meu humor: "calor" e "humano". Como não sei nadar, nem o consolo de um mergulho refrescante eu tenho.

O jeito é ficar na cidade mesmo, esperando o Sol baixar para tomar um açaí ou passear com o cachorro. Aliás, meu cachorro concorda comigo: uma voltinha de nada na quadra no verão e ele já fica exausto. Logo ele, que, em condições normais de temperatura e pressão, exige pelo menos três passeios por dia.

Mas eu entendo o cão, porque o calor também me deixa desnorteado. No verão, até mesmo fazer horas extras não-remuneradas só para aproveitar o ar condicionado do escritório passa a ser uma boa ideia. Eu não tenho problemas respiratórios, então sofro um pouco menos com o ar condicionado do que outras pessoas. Mas não é raro começar a sentir aquela pontadinha na garganta por causa de tanta mudança brusca de temperatura no mesmo dia e tanto ventilador na cara. Chegar da rua com o corpo tão quente quanto o daquele povo que trabalhava na caldeira do Titanic no filme e tomar banho gelado não deve ajudar muito.

Não tá fácil pra ninguém

Eu sei que o frio é uma questão de saúde pública e que tem gente morrendo por falta de abrigo e agasalho. Mas o calor também faz mal para a saúde e temos muito mais dias quentes do que frios no Brasil. Desidratação bagunça a pressão arterial, atrapalha o funcionamento dos rins e o câncer de pele representa quase um terço de todos os casos de tumores malignos no Brasil. E você aí ignorando os conselhos do Pedro Bial e achando que filtro solar é frescura.

Sol de rachar é péssimo, mas tem como piorar.

Quando a gente começa a se acostumar com o bafo de Satanás preenchendo o ar, ouve um trovão. Aí vêm as malditas chuvas de verão, que quase sempre caem justamente na hora em que você precisa dar uma saidinha. Quando você fica, sempre tem um fulano que fecha a janela e cria uma sauna. Se resolve sair, precisa encarar o fato de que o guarda-chuva é apenas um enfeite — e que, dependendo da tempestade, mais atrapalha do que ajuda. Se você for pobre, já sabe do potencial devastador que a chuva e as enchentes têm. Se for #classemédiasofre, conhece os compromissos atrasados, tarifas do Uber nas alturas e meias eternamente molhadas.

Dentro da loja, a bermuda nova que acabei de escolher para enfrentar três meses da estação do inferno ganha companhia: um par de tênis desses de couro sintético, supostamente impermeável, para jamais passar pela humilhação da meia molhada de novo. Chego ao caixa com muitas perguntas na cabeça: "Será que chego em casa antes da chuva?" "Falta muito para o desodorante vencer?" "Ainda tem repelente?" "Ter saudades do frio é muito egoísmo da minha parte?".

Enquanto pago a compra, só consigo pensar numa resposta: eu odeio o verão.

E ainda tem mais verão!

Estamos gostando do calor. Tanto que preparamos este especial com artigos quentes pra deixar o verão do jeitinho que ele merece.

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Só chegar.

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publicado em 23 de Janeiro de 2017, 17:19
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Otávio Cohen

Otavio Cohen aprendeu a contar histórias em Minas Gerais, mas vive em São Paulo há oito anos. Como escritor, lançou três livros de não-ficção pelas editoras Abril e Planeta. Como jornalista, passou pela redação digital da Superinteressante, colaborou com Viagem & Turismo, Mundo Estranho e Guia do Estudante, e foi editor de infografia para livros didáticos da Editora Moderna. Especializou-se em branded content e realizou projetos para marcas como HBO, Motorola e Medley.


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