A época de vestibulares está oficialmente aberta há algum tempo. Depois do ENEM e de algumas federais, este final de semana será marcado pela prova da Fuvest, exame concorrido que dá acesso à USP.
Sabendo disso, e depois de ter passado por isso, fui atrás de um artigo que possa explicar o que acontece com uma parcela significativa dos vestibulandos: estudar, estudar, estudar e ter um tremendo apagão na hora da prova.
Em primeiro lugar é preciso ter em mente que o vestibular não é tudo. Nesse caso, vale a pena dar uma lida neste outro artigo que publiquei por aqui para entender como a sua vida não depende disso e aproveitar pra tirar um pouco da pressão e do stress pré, durante e pós-prova.
Superada essa fase, se você realmente quer entender os motivos pelos quais você simplesmente esquece tudo que sabe quando está frente a frente à prova e até se você quer saber alguma forma de evitar isso, então este artigo é o que considero ideal.
Vale lembrar que: o texto foi originalmente publicado em inglês no excelente The Conversation, tem autoria de Jared Cooney Horvath e Jason M. Lodge, foi traduzido para o português por Julia Barreto e faz parte de uma série que eles denominaram 'Making Sense of Exams' onde se propõem a discutir o propósito das provas, se elas podem ser feitas onlines ou não, como superar a ansiedade e técnicas de revisão efetivas. Pincei esse porque é o mais interessante para o momento, mas recomendo muito todos.
O que causa o 'apagão' na hora das provas?
É um padrão que muitos de nós provavelmente viveu no passado.
Você se prepara para uma prova e todas as informações parecem coerentes e simples. Mas então você senta na cadeira na hora da prova e de repente todas as informações que aprendeu vão embora. Você sofre para lembrar alguma coisa — qualquer coisa —, mas o quanto mais tenta, mais longe parece ficar a informação. O terrível branco.
Então, o que está acontecendo?
Para entender o que está acontecendo durante esse branco, há três regiões do cérebro com que precisamos nos familiarizar.
A primeira é o hipotálamo. Para todas as intenções e propósitos, podemos conceber o hipotálamo como uma ponte entre suas emoções e suas sensações físicas. Resumindo, essa parte do cérebro tem fortes ligações com o sistema endócrino, que, por sua vez, é responsável pelos tipos e quantidades de hormônios fluindo em seu corpo.
A segunda é o hipocampo. Sendo uma estrutura subcortical, o hipocampo tem um papel de extrema importância tanto no aprendizado quanto na recuperação de fatos e conceitos. Podemos conceber o hipocampo como uma espécie de porta da memória pela qual a informação deve passar para entrar e sair do cérebro.
A terceira é o córtex pré-frontal (CPF). Localizado atrás dos seus olhos, essa é a parte calma, tranquila e racional do seu cérebro. Todas as coisas que sugerem que você, como um ser humano, está no controle ficam em sua maioria aqui: coisas como memória de curto prazo (a habilidade de guardar e manipular informações em sua mente); controle de impulsos (a habilidade de reduzir respostas comportamentais indesejáveis); tomada de decisões (a habilidade de selecionar uma resposta adequada entre duas possibilidades concorrentes) etc.
Como o apagão acontece
Quando você está se preparando para uma prova num cenário que é previsível e de baixa aposta, você é capaz de entrar no modo “cognição fria”. Esse é um termo dado para processos mentais lógicos e racionais.
Nesta instância em particular, quando você está estudando em casa, sentado em sua cama confortável, escutando sua música favorita, o hipotálamo diminui a produção e liberação de hormônios-chave de stress (que serão descritos mais para frente) enquanto o córtex pré-frontal e o hipocampo estão trabalhando calma e confiantemente desimpedidos.
No entanto, quando você entra numa situação de prova de certa forma imprevisível e de altas apostas, você entra no campo da “cognição quente”. Esse é o termo dado para processos mentais não lógicos e movidos pela emoção. Cognição quente normalmente é provocada por uma ameaça clara ou uma situação altamente estressante.
Então uma prova pode servir de gatilho para uma cascata de pensamentos únicos — por exemplo:
Se eu falhar nesse exame eu talvez não entre numa boa universidade ou programa de graduação. E então não vou conseguir um bom emprego. E vou morrer sozinho e pobre.
Com esse tipo de pensamento opressivo, não é de se admirar que aqueles fazendo provas às vezes veem exames como ameaças.
Quando uma ameaça é detectada, o hipotálamo estimula a criação de vários hormônios-chave de estresse, incluindo norepinefrina e cortisol.
Altos níveis de norepinefrina entram no córtex pré-frontal e servem para amortecer o disparo neuronal e enfraquecer a comunicação efetiva. Basicamente, esse enfraquecimento limpa sua memória de curto prazo (o que quer que você esteja pensando agora se foi) e impede o lógico e racional córtex pré-frontal de influenciar outras regiões do cérebro.
Ao mesmo tempo, grande níveis de cortisol entram no hipocampo e não só interrompem padrões de ativação, mas também (com uma exposição prolongada) matam os neurônios do hipocampo. Isso serve para impedir a capacidade de acessar memórias antigas e para distorcer a percepção e o armazenamento de novas memórias.
Resumindo, quando a prova é interpretada como uma ameaça e a reação de estresse é disparada, a memória de curto prazo é varrida, mecanismos de recordação são interrompidos e a cognição quente emocionalmente carregada, movida pela hipotálamo (e outras regiões subcorticais) anulam a cognição fria usual e racional movido pelo córtex pré-frontal.
Juntando tudo, esse processo leva ao apagão, tornando difícil de ativar a atividade cognitiva lógica.
Há alguma maneira de evitar isso?
A boa notícia: há algumas coisas que você pode fazer para evitar os apagões.
A primeira diz respeito a se desestressar. Por meio da ação conjunta de prática e aplicação de técnicas cognitivas-comportamentais e/ou de relaxamento visando reformular qualquer ameaça detectada durante uma situação de prova, aqueles fazendo o teste podem, potencialmente, eliminar a reação de estresse e entrar novamente num processo mental mais racional.
A outra diz respeito à preparação. A razão para as Forças Armadas treinarem novos recrutas em situações de estresse que simulam cenários de combate é garantir a cognição fria durante situações futuras.
Quanto mais uma pessoa vive uma situação em particular, menos provável que ele ou ela a vejam como ameaçadora.
Então, quando for se preparar para um prova, tente não fazer isso em um ambiente relaxado e calmo — no lugar, procure se forçar de maneiras que imitem o cenário do teste final para o qual você está se preparando.
Assim, suas chances de ser bem sucedido no exame aumentam bastante.
publicado em 27 de Novembro de 2016, 00:05