O desafio: Alguns de nós vão dedicar uma manhã, tarde ou noite para ir onde não iríamos costumeiramente, para tentar fazer dessa noite (ou tarde) a mais proveitosa possível. Vamos nos jogar em locais que nunca pensamos em ir pelos bloqueios invisíveis, preguiças e travas que fomos cultivando sem nos dar conta.
Esse é o ponto de partida. Os três escolhidos foram: o ilustrador de sempre Felipe Franco, o editor gente fina Luciano Ribeiro e este que vos escreve. Então, já que as histórias falam por si, vamos a elas sem apresentações iniciais.
Rafael Nardini, São Paulo é ainda maior lá do Terraço Itália
Ipiranga com São Luís. Brasil com Itália. O Circolo Italiano – ou Edifício Itália, se preferir – é uma monstruosidade de 165 metros, 46 andares e, diz a lenda, entrega a mais estonteante vista da cidade mais fodástica de toda a América Latina.
No mesmo instante em que o prédio foi inaugurado em 1965 certamente um casal de pombinhos se uniu para nunca mais desgrudar. Outros tantos sonharam em subir até o topo para um jantar no restaurante Terraço Itália, tão absurdamente bom quanto caro e disputado. Sempre ouvi relatos embasbacados do que se podia ver e comer do alto do Centro de São Paulo. Mas como para tudo na vida nem sempre basta um pouco de coragem. Para essa missão em si é necessário dinheiro e desprendimento na mesma medida.
O que vem fácil vai fácil, certo? Já que é assim, decidi encarar a empreitada.
Chegamos – eu e a incrível namorada que me aguenta – às 22h52 do sábado (2). Um cigarrinho uruguaio na calçada enquanto o táxi dobra a esquina e some rua Ipiranga adentro. Temperatura amena, sensação de uma espécie de ar condicionado natural bem ajustado, o clima perfeito para enfrentar a altura e o vento.
Subimos direto até o restaurante, que, naturalmente, tinha espera. “Uma hora”, sinalizou a recepcionista. Quase no mesmo instante o maître nos indica o rumo do bar. Lá fomos recebidos por um xará – que fez questão de me mostrar sua planilha anotada com outros oito “Rafael” que estiveram ali antes da nossa chegada. Ou seja: quase um time inteiro de futebol só com o meu nome em apenas uma noite. E imagina quantos outros não estavam lá por embaixo dentro daqueles pontinhos velozes e motorizados?
Luzes na medida, cadeiras antigas dignamente mantidas e reformadas, casais de longa data, playboys que tentam impressionar e prostitutas em busca de negócio. Casais corajosos também, por quê não? Tem um pouco de tudo por ali, como em qualquer lugar dessa metrópole maluca. Sentados no bar, me imagino ter sido sugado por um episódio b-side de Mad Men enquanto recebo, sem dó, o primeiro susto: R$ 38 por um old fashioned. A Ju optou por um aranceto – coquetel belezinha com grappa, prosecco e suco de laranja – de preço não muito diferente. Era como se algo piscasse em letreiros luminosos: “Apenas relaxe e abra a carteira, capiche?”
Enquanto enganamos a fome com o álcool (não façam isso em casa, garotos), tagarelamos sobre pais, bichanos, grana e sobre o quanto é bom estar ali. Especialmente na companhia um do outro. Norah Jones canta “Sunshine” no som que sai das caixas. O pianista deve ter levantado para ir ao banheiro ou talvez apenas tenha parado para um drinque ligeiro. Vem a boa notícia mais aguardada da semana: a nossa mesa está posta. O estômago agradece. “Agora vai”, brinco.
Descemos os dois lances de escada e entramos no restaurante. O couvert vem digno, na medida. Pães italianos fatiados, um mini ciabatta, manteiga, sardela e caponata de berinjela. No andar do restaurante, o 41º do espigão, o pianista não tem direito ao descanso, diferente do piso superior. O garçom se aproxima e ela pede ravioli con brie e pistacchi in salsa di albicocca (ravioli com brie e pistache ao molho de damasco). Aposto no gnocchi alla mediterrânea (massa fresca com berinjela, ricota seca, tomate fresco e manjericão). Como de costume, decidimos os pratos em conjunto. Como de costume, o meu é mais direto ao ponto, o da Ju, mais delicado. Como sempre ocorre, o prato vai acabar trocando de dono. Sem carnes, sem sobras. Delicioso.
Hora de aproveitar a sacada um pouco. Peço uma taça de vinho e ficamos ali caminhando de um lado a outro por alguns minutos. A Ju explica a rixa clássica entre o Itália e o Hilton, construções vizinhas que formam um dérbi específico na paisagem paulistana. Lá de cima tento identificar o rumo de casa, a direção em que fica a avenida Paulista e miro o Hotel Jaraguá, logo ali em frente. Tenho a impressão de haver mais de uma Consolação. Lá de cima todas as ruas se parecem muito. Um tanto mais pobre, mas sem vertigem, medo de altura e gostando um tanto mais de São Paulo.
E, sim. O Copan é um arregaço lá de cima.
Felipe Franco, a São Paulo gratuita que a gente não ouve falar
Quando surgiu aqui a ideia de fazer uma artigo com relatos nossos, visitando lugares que nunca fomos antes ou que não costumamos ir, fui logo um dos primeiros a me prontificar. Sou bom em sair andando por aí e descobrir novos lugares para beber, comer escutar música etc. "Vai ser fácil", pensei.
Ledo engano. Justamente por já fazer isso normalmente fiquei perdido, sem saber para onde ir. Não tenho muitos preconceitos e na companhia de bons amigos, tanto faz o som que está tocando ou que tipo de pessoas estão a minha volta. A partir daí fiquei mais de uma semana procurando lugares bizarros ou diferentes de onde costumo ir, cogitei as possibilidades cair em um karaokê de dominatrix na zona norte, um bar de sadomasoquismo na zona sul, uma festa de shibarie bondage, uma balada gótica, conhecer o Centro de tradições Nordestinas, um baile funk em uma favela... Até que um amigo me chamou para ir aoMIS assistir uma seção do Cineclube Phenomena de nada menos que AKIRA.
Claro que o "pipoca" do meu amigo desistiu de última hora e acabei indo sozinho. PUTA QUE O PARIU! Não lembrava como Akira é bom. O som era alto, cheio de explosões. Puta experiência ver este tipo de filme na telona, mas nada que fugia do meu dia a dia. Depois dessa seção foda, caiu a ficha… Tá aí, por que ir em um único lugar diferente? Vou pegar o final de semana inteiro procurando rolês gratuitos – que eu não faço normalmente. Vou literalmente desbravar o que São Paulo pode me oferecer num final de semana.
Pauta definida, um plano infalível em mente agora só faltava definir um roteiro. Fiz uma pergunta ao deus da informação Google sobre eventos neste final de semana e como um bom oráculo ele não me deu uma resposta simples, mas sim várias opções. Comecei a montar um roteiro de eventos na agenda do celular para o dia seguinte.
Sábado levantei, comecei a confirmar o que iria fazer e acabei descobrindo que o bairro da Mooca estava completando 458 anos e para festejar a data estava rolando uma feira gastronômica no Clube Juventus, Perfeito!
Para quem não conhece, o Juventus é um tradicional clube da Zona Leste fundado pela colônia italiana, e é uma espécie de segundo time no coração da maioria dos paulistanos. Diz a lenda que um dos gols mais bonitos que o Pelé já fez foi justamente ali na rua Javari.
Bota no pé, chapéu na cabeça e mochila nas costas: partiu para Mooca! Quando esperava um lugar esquecido com barraquinhas mequetrefes e um monte de velhinhos jogando milho para pombos em uma praça, surgem muitas famílias, crianças correndo para todo lado, gente bonita e muita, mas muita variedade de comida. Coxinha de pato, risoto de camarão, paella, costelinha de porco, acarajé... Culinária nordestina, diversos pratos itálianos e uma porrada de doces.
Depois de alguns chopes artesanais, uma bela de paella, arrebatei com uma sangria. Hora de partir para o segundo evento do dia: Ponto pro Rock.
Ponto pro Rock é um projeto que transforma a Praça Victor Civita na zona oeste em um palco para as bandas nacionais e independentes mostrarem o seu trabalho. Sábado, 02/08, estavam lá Mafalda Morfina, Sexto Grau e Wild Five. Ver o sol se por com rock'n'roll nos ouvidos não pode ser uma má ideia.
Para começar bem a noite, fui para o Sesc Santana conhecer o trabalho do Grupo Ecoo, um grupo vocal com influências da música negra norte-americana. Para encerrar o tour, corto a cidade em direção à zona sul para conhecer a casa novo do pessoal do Coletivo Design e da Idea fixa.
Domingo. Levantei relativamente cedo para quem farreou ao som de cantigas julinas na noite anterior. Pego o celular e começo a pesquisar sobre o que fazer no domingo. Para quem não tem praia, sobram os parques. E se parar para pensar, a Madame Sorte, aquela meretriz, sorriu para mim neste final de semana. Acabei na 36º Festa das Cerejeiras no parque do Carmo, na zona leste.
A cerejeira é a árvore símbolo do Japão e tornou-se a marca dos descendentes da comunidade nipônica que vivem na região de Itaquera, zona leste. A festa, que acontece desde 1978, é organizada pela Federação Sakura e Ipê do Brasil em parceria com a Prefeitura de São Paulo… Música folclórica japonesas, barracas com comidas típicas em um parque que nunca fui na vida, por que não?
Mais uma vez o dia estava lindo. Depois de uma tigela servida de udon, alguns temakis e tempurás, uma amiga me avisou que a artista Juliana Vomero estava pintando um muro da sua casa. Cerveja, amigos, arte e um bom papo. Resumindo: mais um ótimo final de tarde.
Depois de ir para casa curtir um pouco com Django, o cão mais maloqueiro da zona oeste, e descansar o esqueleto um pouco, já era hora de sair. Vocês sabem: domingo sem Game of Thrones não é dia de ficar em casa...
Luciano Ribeiro, depois de dois anos já é mais do que hora de explorar a cidade
Esse é um relato sobre vergonha, apatia e dor.
Em primeiro lugar, vergonha e apatia: vim para São Paulo há cerca de dois anos, para trabalhar neste site que vocês leem agora. E, de lá pra cá, em meio à rotina, pouco explorei da cidade. Raramente saí do eixo Vila Madalena-Av.Paulista-Pinheiros e, quando o fiz, foi brevemente, apenas de passagem.
O motivo não foi outro a não ser apatia. Nos feriados, férias e demais oportunidades de conhecer a cidade, eu preferi viajar a passar um tempo aqui. Ou mesmo ficar na cama, sendo inútil.
Portanto, a chance de pisar fora de casa com esse intuito claramente delineado me pareceu bastante interessante.
Porém, ao acordar no domingo que seria usado para explorar as fronteiras da cidade, eu dei um mau jeito no pescoço, sozinho. Caí de volta na cama, com muita dor. Levantar e dar alguns passos se mostrou uma tarefa dificílima, já que o impacto de cada pisada se fazia sentir de maneira nada agradável. Como eu só teria esse dia, tomei alguns comprimidos que seguraram a dor e seguimos em frente.
A primeira parada seria a Zona Leste, Praça do Carmo. Lá veríamos o Festival das Cerejeiras, uma festa tradicional japonesa, que comemora o florescimento das mais de 4 mil árvores do bosque das cerejeiras na praça do Carmo. O Felipe Franco e a Ana Higa (respectivamente designer e videomaker do PapodeHomem) me acompanharam.
Contamos com um erro que até se mostrou providencial. Erramos o endereço no GPS e fomos parar no Centro de São Paulo. Vimos a Praça da República que também tinha uma feirinha cheia de obras de arte, antiguidades e quinquilharias, além da gigantesca e belíssima Igreja da Sé, o Largo do Arouche e a rua São João. Alguns pontos a mais pro nosso roteiro.
De volta à rota certa, chegamos à praça do Carmo, que estava lotadíssima, com adolescentes fazendo cosplay, outros praticando slackline, cachorros, crianças. Um belo clima. Lá tinha muitas barracas com comidas típicas, as pessoas sentavam embaixo das cerejeiras, contemplando a beleza das flores. Bem condizente com a tarde ensolarada que fazia naquele domingo.
Depois de comermos Udon e assistir a uma apresentação incrível de taiko, nos retiramos.
Franco se separou e ficamos Higa e eu dispostos a continuar missão.
Dali, a ideia inicial era pegarmos um concerto de música clássica no Masp e depois seguirmos para Santos, ver o litoral à noite. Infelizmente, nos atrasamos para o concerto, mas conseguimos chegar a tempo para ver as exposições "A inusitada coleção de Sylvio Perlstein", "Cidades Invisíveis" e "O triunfo do detalhe". Todas incríveis. Tive uma sensação bem particular ao ver as obras de Picasso, Monet e Van Gogh lá expostas. É o tipo de coisa que, se me perguntassem, eu diria que nunca aconteceria na minha vida.
Saindo de lá, a dor começou a ficar difícil de lidar. Provavelmente porque o efeito dos analgésicos devia estar passando. Comemos e voltamos para casa. O litoral ficou pra outro dia.
No entanto, decidimos que ainda dava pra fazer uma última coisa antes de encerrar o rolê. Fomos ao Café Piu Piu, um tradicional bar de rock na rua 13 de maio. Porém, não ouviríamos guitarras nesse dia, mas sim a malemolência do samba e do chorinho do grupo João de Barro.
Eu não conseguiria dançar por causa do meu pescoço zoado e a desculpa foi convincente o bastante pra eu apenas observar as pessoas se divertindo. E como se divertiam! A banda se apresentou muito bem, com um repertório muito bonito e bem executado. Valeu a noite.
Isso foi apenas um dia, mas encerramos com uma sensação de que há muito a ser explorado dentro da cidade. Podíamos ter estendido a ideia e visto muito mais se tivéssemos nos planejado melhor e perdido menos tempo com a rota equivocada. Certamente, essa é uma ideia que vou repetir em breve.
* * *
Agora é com você: Já esteve por esses lugares em que nós perdemos a virgindade? Onde você tem vontade de ir, mas nunca foi?
Mecenas: Heineken | Open your City
O tempo todo nos surpreendemos com fotos e relatos de lugares e cidades incríveis.
A Heineken faz um convite para as pessoas explorarem um lugar que pode surpreender: a cidade que você mora.
Estamos acostumados a frequentar sempre os mesmos lugares, que tal arriscar algo novo e diferente agora?
Se você mora em São Paulo, a Heineken vai te dar uma forcinha para descobrir novos lugares, com o Guia #OpenSP.
publicado em 06 de Agosto de 2014, 21:01