Antes do jantar ontem à noite, saí para comprar pão e leite no supermercado.
O pão fica no fundo do corredor 14 e a menor fila para o caixa ficava na frente do corredor 8.
Na caminhada entre o pão e o caixa vi algo que acho bem difícil de processar.
Há milhares de estudos que destacam o estado chocante de nossa saúde coletiva. Para simplificar, apliquei as estatísticas a 100 pessoas aleatórias. Esta é a cara do mundo hoje.
No Sessions, todo os dias vemos como isso impacta as pessoas, emocional, física, espiritual e financeiramente.
Pra falar francamente, estamos num estado de emergência.
Estamos encarando um desafio de saúde sem precedentes históricos.
E, ainda assim…
Este é o supermercado mais próximo da minha casa.
Corredor 13
Corredor 12
Corredor 11
Corredor 10
Corredor 9
E no caixa
Se alguém viesse até mim e me pedisse que fizesse o projeto de uma loja de diabetes, eu simplesmente o levava a um supermercado.
Mas a coisa fica ainda mais louca.
Depois que esfregam na sua cara tubões de refri, enormes chocolates, salgadinhos, pirulitos, garrafinhas de refri e chocolates menores, adivinha o que mais se pode comprar?
Exatamente! Uma revista sobre pessoas que tem um pouquinho de sobrepeso.
E, como se isso não fosse suficiente, que tal isso?
Aqui não são corpos com um pouco de sobrepeso… são corpos grotescos!
Mas, não tema.
Nem tudo são chamadas sensacionalistas nas revistas. Há algumas perspectivas mais sóbrias também…
Para aqueles procurando por leitura mais educacional, que tal a “Vivendo com o Diabetes”?
Isso mesmo, a melhor coisa que você pode comprar depois que passou por refri grande, chocolatão, salgadinho, pirulito, refri pequeno e chocolatinho é uma revista sobre diabete!
E que tal uma revista sobre saúde preventiva?
Enquando você está comendo um chocolatão, um pacote de batata frita sabor churrasco e um copão de cola antes da janta, você pode ler sobre:
- Encolher gorduras localizadas.
- Refeições para promover barriga de tanquinho.
- Fazendo as pazes com o abdômem.
- Rejuvenescendo seu coração!
A foto que eu não consegui tirar foi a mais triste de todas
Era a caixa, uma adolescente. Nem adulta ainda, já bastante obesa.
Que esperança ela pode ter de reverter as tendências em curso?
Que esperança seu coração, fígado e sistema nervoso têm de ALGUM DIA serem saudáveis?
1 chance em 100? Em 1000?
E o quanto cada um de nós é cúmplice?
Os consumidores votam ao comprar coisas como essas. As empresas da área alimentícia continuam produzindo. Os publicitários fazendo tudo que podem para vender isso tudo. TV, rádio, mídia impressa e da internet promovendo através de anúncios. Os supermercados tentando nos fazer encher os carrinhos dessas coisas. Os governos se recusando a regular.
Imagine se 65% da população fosse viciada em jogo e nós permitíssemos que os bancos colocassem video poker nos caixas eletrônicos.
Ao nos depararmos com uma crise de saúde sem precedentes, como podemos aceitar um mundo no qual o mesmo estabelecimento joga diabetes e obesidade nossa goela abaixo e ao mesmo tempo vende revistas para nos ajudar a lidar com essas coisas?
Esse é um daqueles momentos na história que as futuras gerações lembrarão com vergonha, raiva e completa perplexidade.
Atualização: 9:30pm, 25 de Agosto de 2014 — Este post, originalmente publicado no Medium, está perto de receber um milhão de visitas, e a resposta que recebi devido a ele me surpreendeu muito. Recebi centenas de emails, tweets e comentários, e para esclarecer melhor, tentei responder alguns deles num post que você pode ler no the Sessions blog.
* * *
Nota do editor: abaixo, a importante atualização feita no the Sessions blog, da empresa do autor.
O Mundo está Louco pra Caralho, uma atualização
No início dessa semana postei um artigo no Medium entitulado: “O mundo está louco pra caralho”.
O artigo está prestes de receber um milhão de visitas e causou uma comoção que eu não poderia ter imaginado.
Para contextualizar, o escrevi num fluxo de consciência, em cerca de 20 minutos.
Era um post sobre de problematização, isto é, apontando um problema, e não dando uma solução. Fiquei (e ainda estou) embasbacado com nossa saúde coletiva e nossa disposição a aceitar todos os nossos padrões culturais atuais sem sequer os questionar.
Se eu soubesse que ia ser tão impactante, eu teria me detido mais em esclarecer alguns pontos chave.
Aqui estão amostras dos comentários mais repetidos no post e em minha resposta.
O governo devia regular minhas escolhas de bebida e comida
“Chama-se liberdade de escolha. Você acha que um estado “big brother”, intervencionista, onde não se pode comprar X ou Y porque você não preenche o perfil X ou Y é melhor? Já passamos por isso em nosso país. E adivinha, não funciona! E não vai funcionar aí também. Lembra da lei-seca? O número de alcolistas diminui? No final das contas, a liberdade de escolha exige responsabilidade pessoal”.
Você tem direito de beber e comer o que quiser. Mas estou completamente de acordo com a ideia do governo defender os direitos ao mesmo tempo que faz alimentos como esses menos baratos e facilmente disponíveis.
É uma área bastante complexa em termos de políticas públicas, mas, em princípio, apoio impostos maiores para comida e bebida nutricionalmente ruim, bem como impor restrições para sua promoção ou publicidade. Da mesma forma que apoio restrições similares com relação a cigarros.
Também, para deixar bem claro, acredito que é, no fim das contas, a responsabilidade de cada indivíduo tomar conta da própria saúde. O papel do governo é moldar a arquitetura de escolha que está por trás de nossa tomada de decisões.
Leite como uma boa escolha
Então, adoro esse post. Compartilhei em todos os meus feeds. Mas não posso deixar de notar certa ironia aqui. Você saiu pra comprar duas coisas. A primeira é um produto que provavelmente a metade das pessoas não consegue nem digerir, e a segunda é uma combinação altamente processada de carboidratos.
Definitivamente acho que as pessoas subestimam o impacto negativo que o pão e o leite têm em nossa saúde, particularmente quando consumidos em excesso.
Porém, não concordo que pão e leite sejam tão prejudiciais a saúde quanto refrigerante, chocolate, pirulito e salgadinho.
Se aprecio um pouco de leite no meu café ou mel na minha torrada, fico contente por estar num caminho mais saudável que a pessoa tomando um copo de coca-cola e um pacote de batatinhas com sal e vinagre.
Video Poker = Caça-níqueis
Aprendi algo novo hoje: o que é uma “pokie” (traduzida aqui como “video poker”). Palavra divertida.
Desculpem amigos estadunidenses, eu devia ter esclarecido melhor essa.
Nota do tradutor: o autor é australiano, mas aqui no Brasil creio que conhecemos as duas máquinas, e tanto faz para a metáfora.
As mulheres na capa de “Famous” não têm sobrepeso
Erro meu. Não é uma revista sobre mulheres com sobrepeso, é sobre mulheres que supostamente estão felizes com seus corpos, apesar das críticas. Eu devia ter deixado isso claro.
Coloque as fontes dos estudos!
“Milhares de estudos” você disse. Mas bastava linkar UM SÓ. E disso se segue minha próxima pergunta. Tá falando do mundo ou da Austrália?
“Apenas 3,5% dos estadunidenses entre 18 e 59 anos de idade fazem a mínima quantidade de atividade física recomendada pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos: 150 minutos de atividade moderada por semana”. Fonte aqui.
“Porcentagem de adultos de mais de 20 anos que têm sobrepeso, incluindo obesos: 69,2%”. Fonte aqui.
Você pode encontrar algumas fontes que afirmam um volume maior de exercícios sendo feitos, mas são em todos os casos pesquisas que incluem os exercícios declarados pela própria pessoa que se exercita. NUNCA confie em níveis de exercício declarados pela própria pessoa que se exercita. Vemos isso todos os dias aqui no Sessions. As pessoas não tem ideia de quão pouco se exercitam, e sempre são mais otimistas do que imaginam. (Da mesma forma que a maioria das pessoas pensa que dirige melhor do que de fato dirige.)
Também, meu infográfico do sobrepeso estava errado, subestimei o número de pessoas com sobrepeso e obesas.
Envergonhar publicamente um obeso
Causar vergonha por causa da gordura não é algo que vai ajudar a moça do caixa. De fato provavelmente será muito ruim para sua saúde física e mental.
Eu não estava ridicularizando a atendente. Ela era uma adolescente obesa. Isso significa que:
1. Até esse momento, o ambiente a moldou mais do que as próprias decisões.
2. Ela já está em grande desvantagem em termos de saúde. A probabilidade dela chegar a um ponto em que não seja mais obesa é extremamente baixo.
3. Ela mais provavelmente sofrerá de uma vasta agama de complicações de saúde conectadas com a obesidade.
São todos fatos. Sua presença no artigo representa o custo real e imediato de nosso ambiente insalubre.
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Acima de tudo, foi ótimo receber tanto retorno pelo post.
Claramente existe um sentimento muito forte e compartilhado com relação a insanidade de nossa própria posição.
Para mim é claro que isso é algo que consertaremos. Espero que o mais cedo possível.
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