Scooby e a reação masculina hegemônica diante de uma crítica.
Pedro Scooby entrou no BBB 22 e o público começou a se apegar a ele. Leve e divertido, rendeu muitas piadas positivas em relação a ele. Aqueles cativados pela sua conversa e encantos se diziam #scoobizados. Pedro Scooby, como o próprio apelido indica, muitas vezes lembra um cachorro tranquilo, e até mesmo uma tartaruga, de tão sossegado que ele parecia nos primeiros dias. Ele é tão sossegado que foi para o BBB sem ter visto um programa e até alguns dias atrás, não estava interessado em criar estratégias e sugeriu no paredão que ele pudesse votar em si mesmo.
Como o BBB é um experimento social feito para levar os participantes ao limite, é evidente que ninguém permanece o mesmo do começo ao final do programa, Scooby não foi diferente. A falta de preocupação do participante, que começou cativante, começou a mostrar que havia falta de compromisso com o jogo e imaturidade em lidar com os conflitos.
Uma primeira desavença aconteceu dentro do grupo de amigos (Pedro, Douglas, Paulo André e Arthur) engatilhada por conta da pontuação na máquina de soco que estava disponível na festa anterior. Os brothers disputavam quem tinha demonstrado mais força (já despontam ai questões associadas à masculinidade). Scooby, justificava que a máquina não contava pontos corretamente, de forma irônica, afinal, a Nayara, tinha feito a exata mesma pontuação que ambos os rapazes.
Scooby insistiu na piada durante horas, e Arthur já não achava mais graça das brincadeiras e diz “Por mim vocês podem continuar mano… não faz diferença nenhuma, mas tu tá aí dando show de otário, mas continua, continua, tá irado….”. Eles continuam e Tiago Abravanel chama atenção do grupo, dizendo que eles “passam o dia inteiro fazendo bullying. Uma palavra mágica foi dita e fez o Scooby sair do sério: bullying
Scooby indignado questiona como Tiago Abravanel ousa usar a palavra Bullying? O surfista argumenta que não é bullying, porque eles estavam entre amigos e bullying algo ofensivo que acontece fora do ciclo de amizade. Subindo o tom de voz e se crescendo na postura. Ele soma esse argumento ao fato de que o Arthur já teria participado das brincadeiras com eles, portanto, se ele já participou da brincadeira, deveria aguentar todas as demais zueiras que fossem direcionadas a ele.
Algo que chamou atenção na discussão é Scooby se defender da acusação de bullying argumentando que eram quatro pais de família, conversando e que Tiago estava se intrometendo. Como se ser pai fosse um atestado de maturidade e liberdade de fazer o que quiser. Se realmente ser pai fosse sinônimo de maturidade essa discussão nem teria acontecido.
Diante da discussão, se apresenta a cumplicidade masculina de Paulo André e Douglas, que em nenhum momento questiona Scooby, e nos momentos que fala é para defender, dado o papel do Scooby como uma representação da masculinidade hegemônica, essa dos antigos valores e valorização do masculino diante da masculinidade subalternizada de Abravanel, que apesar de ter diversas falhas, principalmente na positividade tóxica, foi o único a questionar aquela situação e defender Arthur, um papel de extrema importância para conseguirmos, entre nós, nos questionarmos sobre nossas ações, é só rompendo com o silêncio que isso é possível. Se vê nessa situação a dificuldade que é para um homem ir contra a uma opinião do grupo de amigos, dentro dessa dinâmica, o homem subalternizado não encontra apoio de outros homens subalternizados como Paulo e Douglas, porque estes dois escolheram ser cumplices.
Contudo, Tiago ao se colocar, rapidamente se torna o vilão por ter usado uma palavra tão ofensiva quanto Bullying, afinal, zuar o amigo e seguir zuando mesmo quando ele se mostra desconfortável à reação, não é um problema, mas acusar um colega de bullying é tremendamente sério. Um colega não, um “pai de família” outro argumento que Scooby usa para se defender da acusação. O surfista ainda questiona o silêncio de Arthur Aguiar, afinal, como ele ousaria deixar que tão vil palavra fosse usada para descrever a situação sem nem sequer corrigir Abravanel? (Para os desavisados, este parágrafo contém ironias)
Abravanel é compelido a pedir desculpas pelo mal uso do vocabulário, Arthur se desculpa pelo silêncio e Scooby, este não se desculpa com ninguém.
Nessa briga, o que conseguimos visualizar é uma masculinidade que não sabe respeitar limites (que não entendeu o que é consentimento nem em uma relação de amizade), que não aceita a fragilidade do outro e tampouco admite ser podada de causar dor ao outro. Essa masculinidade sem empatia, que ama brincar, mas não sabe lidar com críticas. Que não acredita que os outros devam se ofender diante de suas falas mas que se ofende com facilidade diante de outros interlocutores. Que essa masculinidade não deve mais ser um modelo para nós, de certa forma, já sabemos. Aqui queremos levantar o como essas dinâmicas de masculinidade acontecem também com o cara que é um “queridão”, cheio de carisma, swing e boas amizades. Não é sobre acreditar que é preciso ser um monstro, alguém com falta de carácter, para reproduzir machismos, ofensas ou bullying.
Diante de críticas, se sentir atacado não é uma saída produtiva, é importante estar sempre vigilante às suas ações antes de tomá-las, Scooby, ao ser chamado atenção, cria uma situação em que faz o Tiago sentir que atrapalhou, que errou, que foi equivocado, exagerado, “mimizento”. Esse processo de tentar virar a mesa é uma forma de vitimização que só tem a finalidade de Pedro se preservar diante do sentimento ruim do erro e da sustentação da imagem positiva, aliás, algo que muitos deles dentro da casa manifestam o mesmo medo que descubram suas falhas e sejam cancelados aqui fora. A questão é que ninguém é perfeito, e é sempre melhor aprender do que insistir no erro.
E principalmente, entre nós homens precisamos aprender a estabelecer limites e respeitar os limites do outro, Scooby não respeita isso ao questionar o porque Arthur, que em outras ocasiões estava fazendo piada, agora que é o alvo da piada, não quer ser “zuado”. O ponto é que o que é tolerável para Scooby, não é tolerável para o Arthur e tudo bem. Arthur fala que a brincadeira não tem graça e que gostaria que eles parassem e não é escutado. Em conversas posteriores ainda fizeram pouco caso dizendo que se ele queria ser escutado ao estabelecer limites, ele tinha que falar de forma firme, ou seja, a questão aqui é o quanto um pode impor seu poder ao outro e não sobre respeito, e isso é um problema. O diálogo poderia ter ocorrido assim, se houvesse respeito:
Tiago: “Po vocês ficam o dia inteiro fazendo bullying com o arthur”
Scooby: “Arthur, tu quer que a gente pare ou manere?”
Arthur: (dá seu limite, tendo voz e espaço pra falar)
Tiago e Scooby: “Então beleza, combinado, acordo feito”.
Essa é uma forma prática de empatia em um diálogo entre amigos, e você não vai ser chato se estabelecer limites e nem sem graça por respeitá-los. Isso faz parte da constituição de uma masculinidade saudável, que rompa com essa postura masculina imatura e que possa constituir círculos de amizade com verdadeiros parceiros, que vão te apoiar, e chamar atenção quando necessário. Tiago inclusive foi um dos únicos a confortar o Arthur após um jogo da discórdia onde a casa inteira havia se colocado contra ele. Essa atitude tem feito Arthur e Tiago construírem dia após dia uma amizade forte dentro e fora do jogo. Depois do paredão, na hora de dormir, Arthur foi abraçar o Tiago e dizer que o amava, essa é uma demonstração de afeto raro entre homens e ver isso em rede nacional mostra que é possível.
Essa situação que aconteceu entre Scooby e Arthur não pode ser reduzida a uma questão de “saber brincar” e “aguentar a piada”, é uma questão de cuidado um com o outro. Não é sobre ser um cara mau, é sobre não estar atento. Não estar consciente do mundo que te construiu, não estar disposto a ouvir e repensar, não estar disposto a considerar que você também é responsável por cuidar do bem estar de quem te rodeia: seja essa pessoa sua mãe, seu filho ou seu amigo. Essa análise é sobre dinâmicas masculinas comuns que vão muito além de um reality show, porque são exemplos da forma como os homens têm se relacionado com o mundo e é hora de repensar isso.
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