O Brasil não quer combater a criminalidade infantojuvenil

Passamos 20 anos discutindo a PEC que diminui a maioridade penal. E os mesmo vinte desrespeitando o Estatuto da Criança e do Adolescente

Depois de mais de 20 anos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/1993 tem avançado no Congresso Nacional.

Ela pretende mudar apenas uma palavra da Carta Mãe. Coisa singela, mas não pouca coisa. Sairíamos de:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Para:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos, sujeitos às normas da legislação especial.

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Em 1990, três anos antes da PEC encaminhada pelo Sr. Benedito Domingos, foi aprovada a Lei Nº 8.069, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Entre outras coisas, o ECA – justamente a legislação especial à qual a Constituição Federal se refere no artigo 228 – diz:

Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

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Em 1993, a Fundação Abrinq financiou uma série de reportagens sobre o trabalho infantil no país. O projeto resultou em uma exposição e no livro de fotos “Crianças de Fibra”, da jornalista Jô Azevedo e da fotógrafa Iolanda Huzak – em 1994, o livro recebeu o prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, na categoria fotografia.

Essas são algumas das fotos da obra, focada principalmente no ambiente rural:


Se gosta de fotografia, vale comprar o livro

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Depois de mais de 20 anos das fotos de Huzak, enquanto viajava pelo Brasil durante 2014 com o PapodeCopa, também fiz alguns registros sobre o tema – em uma perspectiva mais urbana.

Um pequeno catador.



Meninas tapando buracos na estrada para ganhar trocados no interior do Ceará

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Nós, brasileiros, somos capazes de passar mais 20 anos discutindo uma Proposta de Emenda Constitucional para reduzir a maioridade penal.

Nós, brasileiros, também somos capazes de passar mais de 20 anos falhando miseravelmente em cumprir artigos básicos do Estatuto da Criança e do Adolescente para tirar os jovens de situações de risco.

Será que estamos tão interessados assim em combater a criminalidade infantojuvenil?

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P.S: Paralelamente ao trabalho como editor do PdH, tenho começado a me dedicar mais à fotografia. Se você gostou das fotos desse texto ou quer conhecer outras, dê uma passada por lá: @ismaeldosanjos


publicado em 13 de Abril de 2015, 14:10
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Ismael dos Anjos

Ismael dos Anjos é mineiro, jornalista e fotógrafo. Acredita que uma boa história, não importa o formato escolhido, tem o poder de fomentar diálogos, humanizar, provocar empatia, educar, inspirar e fazer das pessoas protagonistas de suas próprias narrativas. Siga-o no Instagram.


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