“Crer é errar. Não crer de nada serve.”
– Fernando Pessoa

Isto que já começo a dizer é emprestado, estou mentindo. A cara, a boca, a mão, não são as minhas. E não é demais avisar que já começo a falar com o orgulho disfarçado de quem acredita saber algo a mais. Mas importa pouco. Essa coisa a que temos por hábito chamar de verdade, não a conhecemos ou vemos, tão menos nos pertence. Apenas ocorre que estamos acostumados a elas como ao rosto de nossas mães. A vergonha que eu quase sinto por fingir, desconfio que ela seja falsa – a ética, tal verdade, é repetidamente inventada. Invenções, elas são previsíveis e quase sempre adiáveis, elas mesmas, por si, tão pouco importantes. Mas a mentira é isso que já temos desde o começo – ela nos poupa de um esforço a mais e o velho hábito é condescendente.

Digo-o apenas para explicar que aceito de bom grado, então, o que me for diverso do acerto. É preciso notar que, de fato, eu desejaria alguma outra coisa que não o engano, mas na falta disto outro, o erro está bem.

Sei também, desde agora, a mentira que já vais me contar em resposta, e sei que ela será anunciada com o mesmo orgulho que tento velar. Vejamos: enganadores, nós não estamos sós. (Já disse que minto.)

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(Este texto apareceu originalmente no Não2Não1, blog sobre relacionamentos mantido pelo nosso Gustavo Gitti.)

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