Lições que se renovam a cada ano

Fazer aniversário abre margem para uma série de reflexões, aqui algumas das minhas

Uma frase que tenho repetido com muita frequência é: “a idade chega para todo mundo”. Eu sei que trinta e dois anos é muito novo perto de todo caminho que - espera-se - ainda tenho pela frente, mas as diferenças que sinto já são enormes.

Hoje é meu aniversário e escrevo este texto enquanto sinto uma enorme dor, estou de cama faz 4 dias e nunca demorei tanto para me recuperar assim de um resfriado-sinusite-rinite-gripe.

Apesar da minha carinha de 18 anos, de ainda me pedirem identidade para comprar bebida e todas as brincadeiras que meus amigos fazem, meu corpo já não é mais o mesmo. Doenças demoram mais para passar, lesões que antes eram resolvidas em dias agora prolongam-se por meses e o valor que damos às experiências também ganham um peso diferente.

Quando era mais novo gostava de dizer que o dia do nosso aniversário é apenas mais um como qualquer outro, que não faz diferença. Hoje entendo que muitas das coisas que valorizamos também não possuem valor algum além do mito que construímos em torno delas. Então, por que não utilizar uma data tão pessoal para algo positivo?

De um tempo pra cá o dia do meu aniversário virou um ponto de reflexão importante. Não apenas é quando me dou por satisfeito por ter conseguido concluir mais um ciclo - em vida, mas quando posso entrar num estado de introspecção mais sério e rever quais foram as lições acumuladas neste período.

Compartilho com vocês, de peito aberto, o que pude coletar e aprender neste período. Estes são temas que acordo e vou dormir pensando praticamente todos os dias no último ano.

Perfeição não é desejável e defeitos nos tornam melhores

Ao longo da vida aprendemos que perfeccionismo é uma daquelas características que podem ser chatas, mas é sempre vista como uma atitude positiva. Qualquer pessoa que já participou de uma entrevista de emprego aprendeu a dizer que seu maior defeito é ser perfeccionista, como forma de contornar a pergunta e ainda sair bonito na história.

No entanto, hoje tenho uma visão bem mais fria sobre o assunto.

O primeiro problema que surge quando estamos tentando ser perfeccionistas, é a dificuldade em começar algo. Nada nunca parece bom e dar um começo efetivo é um verdadeiro quebra cabeça. Logo em seguida, completar atividade torna-se praticamente impossível e, se existe um prazo limite de entrega, pode ter certeza que não será cumprido.

Sua criatividade e vontade de tentar coisas novas também acabam limitadas, já que é preferível fazer uma coisa só muito bem, do que explorar novos caminhos. Tudo isso resulta na perda de oportunidades que jamais saberemos que perdemos.

Os japoneses possuem uma arte chamada Kintsugi, que consiste em reparar os pedaços quebrados em peças de porcelana com ligas de ouro, prata ou platina. As peças além de se tornarem novas e únicas obras de arte, acabam fortalecidas nos pontos onde sofreram o reparo. E o mesmo funciona conosco.

Somos mais fortes nos pontos onde erramos, e esse nosso remendo é o que nos torna pessoas diferentes, mais legítimas e reais. É o que chamamos de experiência.

Assim como acabou acontecendo com a arte de remendo japonesa, onde pessoas passaram a quebrar suas peças propositalmente para que fossem remendadas e assim tivesse sua beleza ampliada. Nos arriscar sem medo dos erros e cicatrizes nos traz uma nova perspectiva de um todo, nos tornamos mais fortes.

Pessoas mudam e isso é bom.

Durante nossa adolescência desenvolvemos uma necessidade de assumir uma personalidade, uma vontade de definir quem somos. É comum construirmos uma identificação com um grupo e nos esforçarmos para pertencê-lo. Com a chegada da vida adulta, acabamos suavizando muitas das características tribais que coletamos desses grupos, mas a ideia de que uma forte e rígida personalidade nos faz únicos e que precisamos preservá-la a todo custo de certa forma continua nos assombrando por muitos anos, às vezes até o fim da vida.

Passei anos preso em ideias que já não faziam mais sentido. Amarrado ao medo de ser julgado por assumir uma postura contraditória que sustentei por tanto tempo.

Conversando com as pessoas, hoje entendo que este é um medo tão comum, que além de limitar nossa própria evolução, também nos torna críticos daqueles que ousam mudar, dificultando que outras pessoas assumam as mudanças de perspectiva que desejam realizar.

Mudar é bom, é sinal de aprendizado e amadurecimento. E mesmo que voltemos para a ideia inicial em algum momento, todo o caminho que a ideia viajou até retornar faz com que ela não seja exatamente a mesma, mas uma versão amadurecida de um longo pensamento.

Assumir posturas rígidas dificulta nossas relações e nosso desenvolvimento. Não existe problema em abraçar uma ideia, mas é importante saber aceitar quando novas informações sugerem que aquilo que acreditamos com tanto afinco pode estar errado.

Exponha-se, torne-se vulnerável

Este é um ponto que tem se tornado cada vez mais claro nos meus textos. Tenho trabalhado para expor minhas emoções, demonstrar minhas falhas e as coisas como realmente sinto, sem muitas voltas. Venho tentando interagir com as pessoas de uma forma mais aberta e com menos camadas.

Num mundo onde somos acostumados a vestir armaduras para evitar sofrimentos, esta pode ser uma atitude perigosa, mas a recompensa tem sido grande.

Todos somos capazes de sentir quando alguém está sendo sincero. Quando entregamos o que realmente temos a oferecer a conexão tende a acontecer de volta. Praticar este tipo de abertura tem feito meu laço com amigos se tornarem cada vez mais fortes, minhas relações menos conflituosas e as novas conexões que faço já surgirem muito fortalecidas.

Eventualmente acabo sendo levado a algum sofrimento por causa disso, mas entender que estou fazendo o meu melhor e que a qualidade nas outras relações se mostram maiores do que os eventuais contratempos.

Repense os papeis prontos

O mundo é construído por inúmeras histórias de ficção. Ideias abstratas que criamos para organizar o trabalho entre as pessoas e ajudar a sociedade a cooperar melhor entre si.

Cada uma das nossas leis, ideias e convicções que surgiram ao longo dos milhares de anos que os humanos estão pela terra, é uma dessas ficções, contos que inventamos para que a confusão deste mundo fizesse um pouco mais de sentido. Algumas destas fábulas são recentes, outras vem se arrastando há muito tempo.

Nossa participação na história é pequena. Os - com sorte - 80 anos que alguém pode viver são uma fatia quase insignificante perto da extensa linha do tempo que moldou a humanidade.

Chegamos aqui no meio de algo, recebendo atribuições e conceitos que, quando foram construídos, nem pensávamos em existir. Com isso nos atribuem papéis, sejam nossos pais, baseados na expectativa que criaram sobre nosso futuro. Ou a própria sociedade, baseada em características e comportamentos que supostamente deveríamos perpetuar.

Minha ideia aqui é questionar e se opor aos papeis prontos sempre e que não fizerem mais sentido. Não aceitar ideias apenas porque “sempre foram assim”. Já que na verdade, não foram.

Tentar mudar esses contextos pode parecer algo pequeno para o momento em que vivemos, mas daqui a muitos anos, quando novas pessoas chegarem neste mundo, talvez encontrem papeis mais livres e com menos peso para carregar.

* * *

Estes são pensamentos que sintetizam bem o que tenho pensado ao longo deste ano. São ideias simples, mas que cada uma delas pode ser explorada de forma poderosa. Cada uma delas vale um texto, são temas preciosos e que podem ser amplamente desenvolvidos.

E vocês, quais ideias surgiram no último ano e que modificaram a forma como enxergam o mundo? Amplie as ideias do texto e colabore nos comentários.


publicado em 27 de Setembro de 2016, 22:05
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Alberto Brandão

É analista de sistemas, estudante de física e escritor colunista do Papo de Homem. Escreve sobre tudo o que acha interessante no Mnenyie, e também produz uma newsletter semanal, a Caos (Con)textual, com textos exclusivos e curadoria de conteúdo. Ficaria honrado em ser seu amigo no Facebook e conversar com você por email.


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