Começo escrevendo este texto sentado numa cafeteria. Na minha frente tem um Waffle de presunto e queijo, acompanhado de um café feito com óleo de coco e uma manteiga de nome engraçado.

Ouvi tanto falar sobre isso que decidi experimentar.

Alimentação é um empreendimento lucrativo. Marcas desenvolvem produtos novos e projetam necessidades como parte da comunicação do negócio. Você tem o café que dura mais tempo no corpo, a pasta de amendoim adoçada com uma planta extraída do interior da américa do norte e queijo cheddar vegano ~idêntico ao natural.

As opções são virtualmente infinitas e o marketing nos convence de benefícios que nem sabíamos que precisávamos. Entender o tamanho da influência que o marketing e a propaganda tem em nossos hábitos e na forma que nos alimentamos é um dos pontos de partida para começar a simplificar o nosso modelo de vida.

Recentemente, um amigo veio confessar que, apesar de nunca ter sentido a necessidade, comprou uma televisão nova para seu apartamento, pois queria jogar videogame. Seu espanto, me revelou, foi sentir que era um ser humano mais digno por ter uma tela de 32 polegadas pendurada na sala de sua casa.

Ele não disse isso com arrogância, pelo contrário. Com a intimidade que temos, ele disse sentir repulsa por esse sentimento. Mas tanto eu quanto você sabemos disso: crescemos ouvindo que precisamos acumular coisas para sermos humanos mais completos. Assim, a televisão nova vem com toda essa satisfação. Você se sente de certa forma realizado, por mais que não queira ou não acredite ser o certo.

Quando pensamos em comida, temos a sensação de que não existe tanta influência do marketing. Como alimentação é uma necessidade natural, acreditamos que não é uma decisão baseada na persuasão do mercado publicitário e na estratégia desenvolvida por especialistas em vender mais.

Alguns estudos analisando os impactos da propaganda na obesidade infantil identificaram que, no caso de crianças, as com menos de 6 anos não conseguem diferenciar um conteúdo publicitário da programação regular. Já os menores que 8 anos não conseguem entender a intenção persuasiva das propagandas.

No caso dos adultos é um pouco diferente. Os comerciais nos vendem saúde, corpos perfeitos e – ainda mais delicado – estilo de vida. Quando crescemos, o viés persuasivo dos comerciais vem escondido em elementos que acreditamos ser necessidades reais.

Outro fator que as pesquisas científicas apontam como elemento para o aumento do consumo de alimentos está no nosso próprio desejo de consumir cada vez mais pagando menos. Neste estudo publicado na Nutrition Reviews os pesquisadores apontam que além da publicidade, decisões de marketing como tamanho das porções, preço e posição nas prateleiras são critérios que também causam grande influência nos consumidores.

Legenda

O estudo ainda aponta que os pesquisadores superestimam a capacidade do poder de decisão no consumo de comida, fazendo com que iniciativas como alertas sobre saúde, informações nutricionais e comerciais informativos sejam pouco efetivas. Outro estudo que acho interessante trazer, e que nos elucida sobre como diversos fatores podem afetar nossa capacidade de decisão, demonstra como o simples uso de cartão de crédito favorece o consumo de alimentos não saudáveis.

Com um cenário tão desfavorável e que nos convence a consumir cada vez mais, surge uma pergunta óbvia: como podemos esquivar da influência do mercado e nos ater ao que é realmente importante para nossa alimentação?

Comece simplificando

É comum ver iniciativas de mudar a alimentação começar com a adição de novos alimentos.

Uma barra de cereal, um suco de caixinha, um óleo milagroso e diversos outros produtos divulgados como saudáveis que, sem perceber, apenas aumentam consumo calórico e a quantidade de açúcar que estamos ingerindo.

É claro que não podemos generalizar, mas grande parte dos produtos vendidos como saudáveis trazem uma composição com mais carboidratos, açúcares e gordura do que o ideal. Mas como já mencionado, somos bombardeados sobre como adicionar estes alimentos à nossa rotina nos farão mais saudáveis.

O mesmo acontece para vários outros cenários e o modelo não muda muito de quem quer perder peso e ter só uma vida saudável, para quem quer fazer exercícios físicos e é convencido de que precisa tomar uma extensa lista de suplementos para que os resultados sejam possíveis.

No caso dos suplementos, alguns resultados realmente podem ser amplificados com o uso de suplementos, mas são situações bem mais específicas. Para grande parte da população é só uma forma de desperdiçar uma boa quantia em dinheiro com propagandas falsas e promessas exageradas.

Se você pretende mudar sua alimentação e não tem capital/disposição/interesse em buscar um nutricionista, tenha em mente essa ideia: evite adicionar produtos milagrosos e procure o caminho oposto. Tente remover os alimentos que tenham como característica o excesso de açúcar e carboidratos.

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Nesses casos, a sabedoria popular costuma funcionar bem. Sabemos que devemos evitar açúcar e carboidrato, favorecer carnes magras, comer uma maior variedade de verduras e evitar ao máximo alimentos processados e artificiais.

Quase todos temos essa noção básica de como comer bem, mas ainda assim, quando pensamos em mudar nossa alimentação, corremos para o supermercado e preenchemos a dispensa com produtos de embalagens coloridas ou marcas com folhas verdes no logotipo.

Para organizar a alimentação, esquive-se do desejo de comprar e comece apenas com o que é simples. Se for o caso, vá adicionando depois.

Para os que não tem muita noção de como comer ou tem interesse em aprofundar-se um pouco sobre isso, o governo brasileiro tem um documento incrível que elucida bastante sobre como o brasileiro pode encarar a questão da nutrição. O Guia de Alimentação para a População Brasileira – 2014, pode ser baixado aqui.

A comida do mundo não vai acabar

A maior parte dos brasileiros cresceu ouvindo uma frase muito comum, mas que representa bem a forma como nos alimentamos.

Deixar comida no prato é feio. Tanta gente passando fome e você desperdiçando. São frases que formam o mote de uma geração que aprendeu a comer além da saciedade e enquanto tiver comida disponível.

De cara a gente precisa entender que, por mais estranho que pareça, a gente não vai acabar com a fome do mundo nos forçando a comer toda a comida que está no nosso prato. O problema da comida no mundo não é quantidade, mas distribuição. Não existe nada de errado em deixar comida no prato, principalmente se você está tentando aprender a comer menos.

Nós crescemos construindo essa mentalidade de escassez e traduzindo isso para todas as refeições. Para a maioria, é cada vez mais raro sair de uma refeição sem a sensação de estar estufado.

Esse comportamento ainda traz outro efeito colateral. Se identificamos comida como um recurso escasso, comer de forma abundante é um sinal de prosperidade.

É nessa armadilha que os jovens jovens normalmente acabam entrando. Começam a trabalhar, podem pagar um fast food, um restaurante melhor e, quando se dão conta, passam mais dias comendo pizza e hamburguer do que comida, digamos, normal.

E não há nada errado em, vez ou outra, comer pizza ou se afundar de comer no sushi. O problema é, assim como no exemplo do meu amigo com sua televisão, apoiar-se no exagero alimentar como forma de preencher uma lacuna internal.

Não seja tão rígido

A tendência de quem decide mudar a alimentação é fazer uma mudança brusca de hábitos. Sem nenhuma gradação, a pessoa sai de comendo-besteira-todo-dia-viciado-em-doces, para dieta-radical-extrema-zero-carbo. Com uma quebra de hábitos tão radical, é óbvio que as chances de uma mudança como essas funcionar são baixas.

Nosso corpo é uma máquina de desenvolver rotinas. Não fosse tal capacidade de adaptação, sofreríamos o tempo todo com um tremendo desconforto. Quebrar padrões construídos por tanto tempo é difícil, principalmente falando de comportamentos associados ao prazer.

Comece devagar e assuma que, em algum momento, vai acabar falhando. Se você começou a mudar sua alimentação na segunda-feira e fez tudo direitinho, provavelmente, lá pela quarta-feira, sentirá uma necessidade enorme de voltar aos hábitos antigos. Nesse momento, se você estiver bem disposto, conseguirá seguir adiante. No entanto, em muitos casos, o comum é inventar uma justificativa e comer aquela pizza que você tanto queria.

O importante quando falhamos é o que vem depois. O impulso no momento do fracasso é desistir de uma vez. Já furei mesmo, agora já era. Quando, na verdade, é só voltar normalmente a comer bem, até o momento em que essas explosões de vontade sejam cada vez mais raras.

É importante lembrar que resistir e desenvolver essa disciplina é de suma importância, mas não se martirizar por escorregar e simplesmente voltar aos trilhos quando fraquejar é a melhor forma de ir se ajustando e renovando os hábitos.

* * *

É importante deixar claro que o objetivo do texto não é convencer as pessoas a começarem dietas exageradas ou seguir padrões de alimentação arriscados sem acompanhamento de um profissional de nutrição.

A ideia aqui é simplesmente fornecer um modelo de simplicidade, remover alimentos que todos sabemos que em excesso são prejudiciais e reforçar que esse processo de reajustar o hábito pode ser frustrante. Caso tenham qualquer dúvida ou em casos mais especiais, procurem um profissional de nutrição.

Alberto Brandão

É analista de sistemas, estudante de física e escritor colunista do Papo de Homem. Escreve sobre tudo o que acha interessante no <a>Mnenyie</a>