Não, você não está errado quando, no cinema com a sua sobrinha, você diz pra ela que os filmes de hoje em dia não são mais tão bons quanto eram na sua época.

Não que eu ache que ela esteja errada quando reclama que você só fala da sua geração e diz que você tá ficando velho. Cara, você tá ficando velho, sim. Acontece que todo o efeito de real das animações mais modernas também.

Assisti esse vídeo lá no Trabalho Sujo e ele foi um doce reconforto pro meu saudosismo dos desenhos antigos, quando a gente ainda via o traço do lápis de grafite quando Jerry se movimentava. Mas, aparentemente, a nostalgia não é o único fator a ser considerado.

Há uns bons dez ou quinze anos, a tecnologia da indústria cinematográfica não era suficiente pra projetar na tela mais de um elemento digitalmente construído ao mesmo tempo. Por isso, combinações de gravação real – com pessoas, cidades, ruas comuns – e elementos animados eram bem comuns.

Bons tempos de Roger Rabbit

Mas tudo evolui e, de uns tempos pra cá, descobrimos como projetar absolutamente tudo nos computadores. Desde então, não conseguimos mais nos segurar – não basta o Hulk estar invadindo a cidade, precisa estar caos total, com direito a gente de mentirinha gritando e fogo saindo da janela.

Só que ver o Hulk invadindo a famosa Nova Iorque, aquela que fomos visitar no fim do ano com o pacotão da CVC, a da estampa que está desbotando do meu moletom, é uma coisa. Ver o Hulk invadindo uns prédios cinzas incendiados por chamas que eu nem sei de onde estão vindo, numa cidade que nunca vi, nem comi, nem ouço falar… É outra coisa.

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Esses prédios não me convencem

Conseguimos nos relacionar muito melhor com o que se aproxima da nossa realidade, ainda que haja fantasia envolvida. É muito mais emocionante quando um monstro destrói a nossa cidade. Daí derivaria a nossa dificuldade em se conectar com animações totalmente digitais e o porquê de elas não mais causarem emoções tão fortes.

Isso significa que talvez devamos dar um passinho pra trás e voltar pros tempos de Space Jam? Talvez. Enquanto isso não acontece, sugiro que o próximo cinema com a sua sobrinha seja em casa – bote a menina pra assistir Mary Poppins e pare de camarotizar a sua geração, ou espere brigas feias na adolescência.

Marcela Campos

Tão encantada com as possibilidades da vida que tem um pézinho aqui e outro acolá – é professora de crianças e adolescentes, mas formada em Jornalismo pela USP. Nunca tem preguiça de bater um papo bom.