Depois de publicar o vídeo “É impossível controlar o outro”, compartilhamos agora a entrevista completa que fizemos com a querida Márcia Baja para a série “O que aprendi” no canal do lugar no YouTube. Libere meia hora e seja feliz:
Algumas falas
“É como se a gente recebesse uma herança de nossos antepassados, de tentativas justas de como encontrar felicidade, de como encontrar realização, mas nós mesmos não temos uma clareza de avaliar se isso é bom para nós. A gente recebe as coisas e vai fazendo o que todo mundo faz, mas a gente não para.”
“A meditação não é um processo no qual vamos abandonar a vida ou criar algum tipo de vida paralela, mas ao contrário: ela vai nos tornar muito vivos. Porque ela vai nos colocar no coração das experiências. Não vamos mais ter uma sensação de estar lidando com coisas externas que tem poder sobre nós. Ela vai nos mostrar como as coisas acontecem e como participamos delas. Então a meditação eu diria que é científica, não tem nada de religioso nisso.”
“Aquilo que vem de esforços vem dessa sensação de que nós somos alguém dentro de um mundo onde precisamos fazer coisas, adquirir coisas, realizar, obter. […] Se você quiser evitar esse obstáculo da identidade, do esforço, das metas, você tem de ir direto para esse ponto onde você vai relaxar de você mesmo, relaxar disso que você acha que é.”
“Qual o sentido de eu ficar correndo atrás de coisas no momento em que eu descubro que tudo é o espelho de mim mesma?”
“Quando você olha para as coisas desde essa região livre, sem aflições, sem apegos, você vê a confusão das pessoas. Você vai ver as pessoas no mesmo lugar onde você estava, aí brota compaixão. Como você adquiriu essa sabedoria de entender como as coisas funcionam, é natural que você sinta compaixão pelas pessoas, no momento seguinte, é junto.
Essas qualidades naturais de amor, de compaixão, de generosidade, de paciência, de conduta adequada, de energia disponível, constante, jorrando do seu coração, habilidades potencializando tudo e todos… Você se vê às vezes surpreso de sentir isso jorrando de seu coração sem você fazer esforço nenhum, simplesmente porque você está silenciado nesse lugar de sabedoria olhando para as coisas.”
“Em nosso esforço de ser alguma coisa, nós nos tornamos miseráveis, pobres, sofredores. Porque a gente quer ser alguma coisa, a gente acha que a gente tem de ser alguma coisa. A gente busca a aprovação das pessoas, a gente busca o amor das outras pessoas, porque a gente não sabe quem a gente realmente é.
Se nós conseguirmos acessar essa região do ser livre, essa consciência ampla, não tem esforço para ser qualquer coisa. E mesmo quando a gente adota papeis e posições, a gente não se engana mais porque a gente pode manifestar aquilo enquanto é útil e depois a gente se recolhe de novo no silêncio, plásticos, como se a gente fosse de barro.”
“A prática da meditação, se a olharmos em sua essência, é só isso: descanse disso que você acha que é, para você ser quem realmente é. Solte, solte, relaxe, descanse. A prática da meditação é só isso: deixa cair tudo aquilo que não é, para que aquilo que é brilhe.”
“As relações são inevitáveis. Não precisamos ter nenhum receio de que o silêncio vai nos tornar uma pessoa inerte, fria.”
“Quando falamos em liberdade dentro de uma relação, se isso não vier dessa prática de autoconhecimento, em que nós damos conta de nós mesmos, isso vai ser impossível. Isso não é um acordo entre nós, isso é um trabalho de cada um. O casal precisa fazer isso — seja casal, amigo, familiares, seja qual for a relação. Não podemos nem esperar que o outro esteja fazendo isso porque talvez ele não esteja nesse ponto.
Se queremos encontrar algum nível de plenitude, de alegria, de realização dentro das relações, precisamos primeiro passar por esse trabalho interno — no qual nós conseguimos dar conta de nossas emoções, entendemos nossa mente (como é que ela cria nossa experiência das pessoas, da realidade…), porque aí vamos entender o que estamos fazendo.”
“Eu encontrei as qualidades que eu estava buscando no outro. Quando eu busco amor, é porque eu não tenho amor. Quando eu busco atenção, é porque estou carente, não estou encontrando as minhas riquezas. Se eu estou agarrando o outro, é porque eu me sinto só.
Então precisamos penetrar nessas regiões escuras da nossa carência, da nossa solidão, dos nossos desejos, dos nossos medos todos… e iluminar isso para que a gente não jogue isso em cima do outro, quando o encontrar. Senão o que vai acontecer é isso: a gente encontra o outro e a gente não tem qualidades e espaço para oferecer, mas eu tenho uma maletinha horrível. Eu vou jogar em cima do outro exatamente isso: a minha solidão, o meu desespero, o meu apego, a minha chatice. […] Daqui a pouco a relação acaba e a gente não sabe nem por quê, mas por isso: como eu não conheço os meus conteúdos internos e eu não sei trabalhá-los, é isso que eu vou jogar em cima do outro.
A meditação, o silêncio vão nos dar esse apoio. Quanto mais eu conhecer a mim mesma, mais eu vou entender o outro também. Eu vou entender quando o outro fizer cara feia pra mim, eu vou entender quando o outro quiser ficar sozinho, eu vou entender quando o outro ficar com ciúmes. Porque eu entendo o que é isso. Se eu estou nesse processo de autoconhecimento, eu sei que isso é difícil, eu sei que o outro também vai tentar e vai errar e às vezes vai acertar… Quanto mais eu conhecer a mim mesma, mais capaz eu sou de me relacionar com o outro, de cuidar com o outro, de ter paciência com o outro.”
“O feminino sábio. O masculino sábio. Isso é casamento. Não tem um masculino que vai engolir o feminino. Não tem um feminino que vai se sentir frágil diante do masculino. Sabedoria que se manifesta pelo feminino, sabedoria que se manifesta pelo masculino, ambas tem o seu lugar.”
“O silêncio vai se tornar profundo se o relaxamento for a base.”
“A meditação é isso: você recua e olha as coisas, simplesmente olha. Você deixa seus olhos livres de qualquer coisa que você possa pensar sobre aquilo, qualquer coisa que você possa avaliar. Não avalie mais nada. Olhe como quem está chegando pela primeira vez naquele lugar, como você não trabalhasse ali, como se fosse um visitante, um alienígena, uma criança.”
Agradecimentos
Agradeço a Márcia pela generosidade, Luiza de Castro e Ana Higa por todo o trabalho de gravação e edição, Fábio Rodrigues pelos grafismos e ao CEBB São Paulo por ceder o espaço.
Agenda nacional de Márcia Baja
Márcia Baja é aluna de Lama Padma Samten desde 1996. Em 2013 completou um retiro fechado de 3 anos e 3 meses. Atua como instrutora de ioga e também como tutora do CEBB. Hoje oferece cursos em várias cidades do Brasil e reside no CEBB Darmata, em Timbaúba (PE), onde ajuda a coordenar retiros fechados. Veja sua agenda de cursos e palestras →
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