Nota editorial: Este texto foi escrito a quatro mãos, por Felipe Requião e Edgar W. Santos.

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Em “O Silêncio dos Homens”, há um trecho em que o psicólogo Fred Mattos chama a atenção para um questionamento que pode haver a respeito desse silêncio masculino. Ele pondera:

“Acho que um problema que pode surgir quando a gente fala do silêncio dos homens é pensar ‘bom, os homens estão o tempo todo falando, se impondo, interrompendo as mulheres em tudo o que elas estão falando, eles estão em lugares de poder; como assim os homens estão em silêncio? O que eu mais ouço é a voz de homem falando’”.

E explica: “tem uma diferença entre falar e se revelar de fato”.

Agora, transportemos essa ponderação do psicólogo para uma realidade da literatura brasileira e do seu respectivo mercado editorial. O resultado de uma pesquisa desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) nos mostra que mais de 70% dos livros publicados no Brasil entre 2005 e 2014 foram escritos por homens.

Não é para menos. Ao longo da história a sociedade machista dificultou às mulheres o acesso ao letramento. Por séculos mulheres foram impedidas de, livremente, fazerem arte, o que nos permite concluir que não apenas as vozes masculinas predominam, também os traços, pintados ou escritos.

Ainda assim, nem por meio deles os homens costumam revelar o que guardam nas profundezas.

Não por acaso recorremos ao best seller de uma autora – não de um autor – para tratar daquilo que os homens mais silenciam: a própria vulnerabilidade.

No livro "A coragem de ser imperfeito”, ou em sua palestra visualizada por milhões no TED Talk e em tantas outras publicações, Brené Brown evidencia que a vulnerabilidade não é sinônimo de fraqueza, pelo contrário, ela se traduz em força quando reconhecida e exposta com autenticidade.

 

Esta é uma equação que permanece desafiadora para muitos homens, que falam e escrevem em profusão, mas sem reconhecer os próprios buracos, nomeá-los e expô-los de cara limpa.

Os grupos de homens organizados para serem um espaço de broderagem saudável, pautados pelo acolhimento e alicerçados pela confiança, contribuem para que consigamos acessar o fortalecimento advindo da vulnerabilidade integrada ao próprio ser com leveza e naturalidade.

Num espaço livre de julgamentos, a fala do homem muda. Mais que a fala, a postura. Ela passa a contar histórias mais honestas, despreocupadas em ostentar um protagonismo no estilo Superman. De repente, não há problema algum em se revelar um “herói sem nenhum caráter”, como o Macunaíma de Mario de Andrade.

Pouco a pouco, vozes masculinas começam a reverberar no mundo transformando gritos, imposições e arrotos de falsa virilidade em sábias palavras ditas com força, sensibilidade e verdade por homens em processo de libertação da caixa machista em que se descobriram trancafiados.

No entanto, será que esses homens com tanta história pra contar, expressam na escrita as suas transformações? Se escrevem, será que conseguem imprimir emoção genuína em seus textos? Desconfiamos que não. São raros os que se propõem a escrever a partir do coração.

Invertendo a pergunta: Como o ato de se escrever (com coragem de mostrar a vulnerabilidade) poderia contribuir para essa a construção desse mundo interno masculino?

Veja a tamanha ambiguidade que existe entre masculinidade e escrita. Apesar de ocuparem um lugar de privilégio também no mercado editorial, os homens são desestimulados a se dedicarem à escrita criativa e afetuosa. Dentre as tantas regras veladas do machismo, há uma que não nos permite dissertar sobre os sentimentos. Escrever palavras sentidas, não.

Quer ver um exemplo?

Sabe aquele diário que toda adolescente possuía antes de surgirem as redes sociais? Então, ainda hoje é “coisa de menina”. Aos meninos cabe roubá-los, jamais escrevê-los. Aliás, dizem que o rapaz com letra cursiva bem desenhada tem “letra de menina”.

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Mesmo quando o assunto é paternidade, um tema que aguça a sensibilidade de muitos homens, vemos que existe um bloqueio. Às vezes o pai participa intensamente em todo o período de gestação, vivencia cada etapa, apoia a companheira durante as contrações, corta o cordão umbilical.

Mesmo assim, toda a bagagem emocional adquirida por ele no processo não é suficiente para que se sinta capaz de redigir um relato de sua experiência no parto, e um relato de parto é apenas uma crônica.

A crônica é o gênero literário com o qual contamos histórias do cotidiano. São prosas que costumam descrever um dia em um local. Não há extensas passagens de tempo nem muitas tramas e personagens. Em resumo, em crônicas contamos as pequenas grandes aventuras de todo dia.

Essa definição nos leva a concluir que pescadores de fim de semana e piadistas são cronistas em potencial, não é mesmo? Crônicas nos fazem rir e podem nos fazer chorar. Crônicas nos fazem sentir.

Bem, acreditamos que nós, homens, temos pra contar muito mais que causos sobre pacus de um metro e meio de comprimento fisgados no anzol e na valentia. Por essa razão, nasceu o projeto literário Homens Cronicamente Viáveis.

Homens cronicamente viáveis

O projeto apresenta uma jornada de 8 encontros que une rodas de conversas entre homens e uma mentoria literária com o objetivo de, ao final de todo um processo de aprendizagem, produzir um livro com as crônicas escritas pelos participantes.

Unindo a experiência de escritor e terapeuta de Edgar W. Santos com a facilitação de grupos de homens de Felipe Requião, o grupo será conduzido para um encontro com suas próprias emoções através de meditações, trabalhos corporais e conversas reflexivas sobre o  universo e temas masculinos.

Ao acessar esse portal que se abrirá para suas próprias cavernas, a escrita será um dos mecanismos possíveis para que esses homens exponham suas ideias, sentimentos e histórias de vida.

Do relato emocionante de um parto em casa ao microssegundo que separou a vida da morte, todas as histórias serão incentivadas e trabalhadas por uma mentoria em grupo e individual.

Em cada encontro virtual, de 2 horas, serão trabalhados temas específicos:

  1. Todos são escritores
  2. A importância da leitura na escrita
  3. Crônica: a arte de contar as grandes aventuras do cotidiano
  4. O olhar sensível do homem no papel
  5. Libertar-se para deixar a criatividade fluir
  6. A arte de guiar o leitor em cada linha
  7. Fazer rir, fazer chorar e fazer sentir pela escrita
  8. Os segredos de uma crônica bem estruturada: o começo, o meio e o fim

Os participantes também receberão mentoria para aprender ou aperfeiçoar suas técnicas de escrita através de exercícios com acompanhamento e orientação. Exercícios para realização entre as sessões também fazem parte do programa, pois, assim, além do treino diante de uma ideia que virará uma crônica, é possível desenvolver o hábito da escrita.

Juntamente à jornada, o grupo formará um clube de leitura, fomentando o gosto de todos pelos diferentes estilos de autores e histórias para que cada um desenvolva o seu próprio estilo e encontre seu caminho como escritor.

Ao final dos 2 meses escrevendo juntos e separados todas as semanas, o grupo terá escrito diversas crônicas que serão reunidas em um livro que será diagramado, editado, impresso e lançado.

Que possamos acessar nossas emoções, aprender a canalizá-las para o papel de alguma forma para nos trabalharmos como seres humanos e sentimentais, contadores de casos, histórias e crônicas.

Já pensou que as suas histórias merecem ser contadas em um livro?

Você já pensou que pode existir um Fernando Pessoa ou um Mario Quintana aí dentro de você?

Vamos, juntos, percorrer essa jornada!

 

Felipe Requião

Homem cis hétero, filho, amigo, irmão, marido e pai em busca do autoconhecimento e da felicidade. Adm de empresas, facilitador de grupos de homens e co-fundador do @grupo.horah.