Se puxar o histórico dos meus pais e tudo o que se passou em suas vidas até que eu possa escrever o texto que agora vocês leem, vou facilmente chegar a essa conclusão. O mundo mudou nesses quase trinta anos.

Podemos começar fazendo algumas comparações. Quando eu nasci, minha mãe tinha 20 anos. Meu pai tinha mais ou menos 24. Como eles, muitos de seus amigos também tiveram filhos nessa faixa dos vinte e poucos, vinte e tantos.

Nessa época, nenhum dos dois tinha muita certeza do que iria enfrentar ou de qual roteiro deveria ter seguido. O que eles sabiam é que tinham um filho pra criar e, por isso, tinham que se virar. Seus sonhos, creio eu, devem ter sido mastigados e cuspidos por essa perspectiva.

Aqueles eram os anos oitenta. A década perdida. Perto de hoje, aqueles tempos pareciam a montanha-russa do desespero no que dizia respeito ao contexto sócio-político-econômico. Não que o nosso mundo seja um mar de rosas, mas não dava para se planejar e tirar férias na Europa, conhecer o mundo, falar vários idiomas, fazer intercâmbio. Pelo menos não com tanta facilidade como agora.

Não sei se me fiz claro até aqui, mas o ponto ao qual pretendo chegar é que nós, com vinte e poucos, vinte e tantos anos, estamos imersos em liberdades que nossos pais não tinham. Talvez, por isso, para eles era um pouco mais fácil não só pensar como sonhar em exercer os papéis que lhes cabia até aquele momento. Eles queriam ter um carro, uma casa, uma família, segurança e bem-estar.

Para nós, talvez isso não faça tanto sentido. Se podemos viajar, viver cada ano em uma diferente cidade, com uma diferente profissão, ganhar grana e fazer o que bem entender, por que deveríamos parar em um lugar só e dedicar nossa vida a cultivar um relacionamento que possui grandes chances de nos causar sofrimento, dor de cabeça e até prejuízos financeiros?

Sem querer cair no terreno fácil da idealização e fazer algum juízo de valor. Não sei mesmo se uma coisa é melhor que a outra.

A Vice me colocou pra pensar, por causa desse vídeo, intitulado “A indústria Japonesa do amor”.

Link Youtube | São treze minutos, eu sei que você quer mudar a aba, mas ficaí. Vai valer a pena.

Japão é o décimo país mais populoso do mundo. Possui cerca de 128 milhões de habitantes em uma área de aproximadamente 378 mil km². Porém, está em declínio populacional. Hoje, 23,9% da sua população tem mais de 65 anos e apenas 13,5% está abaixo de 15 anos. Atualmente, morrem muito mais pessoas do que nascem no Japão. E a razão disso é que eles estão perdendo o interesse por sexo.

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Não só pelo sexo como por relações humanas. Especialmente aquelas, afetivas, homem-mulher, mulher-mulher, homem-homem. Segundo relatos desse vídeo da Vice, que fala a respeito da indústria do sexo/amor que se construiu no Japão, os jovens japoneses não querem mais “perder tempo” com outras pessoas. Eles acham que não vale a pena se sacrificar cultivando um relacionamento, afinal, têm uma profissão a zelar e outras coisas mais importantes para fazer.

É, até certo ponto, possível nos imaginar tomando decisões muito parecidas.

O que sei é que, mesmo com tantos planos, não somos essa montanha de aço que às vezes pensamos ser. Podemos desejar uma carreira brilhante e afirmar que estamos dispostos a fazer tudo o que for necessário para isso, mas temos a necessidade social de interagir com outros seres humanos. Queremos ter boas conversas, olhar no olho, fazer e receber cafunés.

Nós também queremos afeto, queremos que cuidem de nós. Queremos fazer putarias grandiosas sem perder a ternura. A gente quer tudo do melhor.

Mas, assim como eles, nós também rejeitamos muitas partes dos relacionamentos. É legal namorar, mas é um saco quando a gente deixa de ter aquele entendimento mágico, quando a trepada não é tão boa, quando você quer ir para casa e o outro quer mais festa.

Talvez, nem seja tão escandaloso assim o fato dos japoneses transformarem cada pedacinho de relacionamento em produto e consumir seus simulacros de conexão com tanta naturalidade. A gente não é tão diferente disso e temos formas de prostituição sutis espalhadas por vários setores da nossa economia. Afinal, nunca antes “ser bem tratado” foi tão importante. Não basta um bom produto, queremos ser amados.

Não pensem que esse jovem que vos escreve é algum romântico inveterado. Eu sou muito menos chegado a esses arroubos melosos do que pode parecer para quem leu até aqui.

O que me preocupa não é se nós vamos ser capazes de continuar amando a mesma pessoa por toda a vida, se teremos belos filhos, se perpetuaremos nosso código genético, se completaremos ou não o ciclo da vida, se preservaremos as tradições. Zero moralismo aqui.

O que me preocupa é nós começarmos, cada dia mais, a pensar que estar com pessoas e atender às necessidades do outro é perder tempo.

Luciano Ribeiro

Cantor, guitarrista, compositor e editor do PapodeHomem nas horas vagas. Você pode assistir no <a>Youtube</a>