Essa discussão é antiga. Quanto destaque é justo dar às atrações brasileiras em um festival do porte do Lollapalooza? E, claro, como toda velha rixa, a gente acaba vendo que os argumentos, favoráveis ou não, são tão contundentes que acabam se anulando. Simplesmente não dá para tomar uma decisão sendo completamente justo, muito menos chegar a um consenso.
De um lado temos aqueles que pensam que a música brasileira deve estar no centro de um festival como esse. Ou, talvez, ter um espaço tão grande quanto os gringos.
Do outro, temos aqueles que não imaginam um festival sem o suporte das atrações gringas.
Eu diria: nem tanto lá, nem tanto cá.
Porém, no caso deste Lollapalooza, me assombrou a qualidade do line up de brasileiros escolhidos. E, mais do que isso. Fiquei muito feliz de ver a extrema competência com que cada um se apresentou. Arrisco dizer aqui, sem remorso algum, que todos os brasileiros que vi fizeram valer a minha opção por sacrificar alguns shows gringos.
De Tokyo Savannah a Planet Hemp: um tour pela música brasileira
Com a programação em mãos, Jader e eu corremos para assistir ao show do Tokyo Savannah, velhos conhecidos que, como já imaginávamos, representaram muitíssimo bem o rock ‘n roll agressivo e direto ao ponto. No caminho, já nos deparamos com bastante lama e um dos lados em frente ao palco alternativo estava completamente comprometido pelo terreno ao mesmo tempo arenoso e escorregadio.
Uma pena que o show tenha ocorrido em um horário tão cedo, debaixo de um sol escaldante, que acabou fazendo com que o público esperasse um pouco mais para comparecer ao Jockey Club.
Sorte dos mais perseverantes e sedentos por música que acabaram por testemunhar um showzasso furioso do começo ao fim. Se os caras ainda não têm a fama e prestígio para se apresentar em um palco maior ou em um melhor horário, aguardem. Esse dia deve chegar logo.
Depois, partimos para o palco Cidade Jardim e relaxamos ao som da Pitty e o seu projeto Agridoce. E, se às vezes, a voz da mocinha é alvo de críticas por não ser tão robusta quanto é de se esperar pelo peso da sua banda principal, por outro lado, ela se adaptou muito bem ao formato mais doce e introspectivo desse novo trabalho, que também dá o devido favorecimento à riqueza lírica de suas letras.
O Jader adorou a versão de “Across The Universe”. Eu pirei em “Beethoven Blues” e nas meninas sendo bonitas sentadinhas na grama, durante o paradoxo que é um show intimista com um palco daquele tamanho.
Copacabana Club se apresentou no palco alternativo, vindo de um hiato, troca de membros e lançamento de novo single e clipe. Fizeram chover e colocaram seu público para dançar do começo ao fim. Ponto para o belíssimo protesto contra o Marcos Feliciano, que arrepiou os presentes e nos colocou para pensar um pouco. Mas sem parar a música, claro.
Graforreia Xilarmônica é um daqueles projetos que muita gente não conhece e a gente não sabe explicar muito bem o porquê. Portanto, se você estava lá e não os conhecia antes, saiba que pegou uma banda muito mais afiada e potente do que ela já costumava ser. Novos arranjos, muito mais energia. Visceralidade pura e exotismo que não se vê comumente.
O Ludov, por outro lado, seguiu por um caminho mais suave, apostando na troca de energia entre eles e o público.
O Criolo merecia um texto só para ele. Este foi o único momento no qual fiquei em dúvida entre uma banda brasileira e outra gringa. Me dirigi ao palco Butantã para conhecer o A Perfect Circle, mas não teve como permanecer lá durante muito tempo. Cedi e voltei ao palco alternativo. Ouvi algumas pessoas reclamarem do som. Não entendi muito bem. Daqui, o que eu ouvi foi uma explosão de timbres e batuques que tornam o ambiente sonoro deles bastante repleto, ao mesmo tempo extremamente primitivo e ruidoso, enquanto o Criolo disparava suas mensagens e colocava todo mundo pra cantar “Não existe amor em SP”, “Sucrilhos”, “Samba Sambei” e vários outras. Ainda bem que tive a decência de voltar.
Para o Lollapalooza o domingo amanheceu tão ensolarado e bonito quanto o sábado. Porém, mais nordestino. E, honestamente, não foi à toa que um dia praticamente inteiro foi preenchido com bandas de lá. Lirinha & Eddie e Baia são projetos sensacionais que merecem todo o destaque que tiveram, tocando no palco Butantã e Cidade Jardim. Porém, aqui deixo uma nota especial ao Vivendo do Ócio, que veio com toda a força, sem fazer feio diante de qualquer banda veterana.
E, no domingo, mais do que em qualquer outro dia, as bandas nacionais brilharam bastante no palco alternativo. Wanna Be Jalva e República, apesar de tocarem para um público um pouco menor, ainda assim, conseguiram surpreender diante da pressão de dividir espaço com os palcos principais. Destaque para o Vanguart que arrastou bastante gente para frente do palco e trouxe uma boa dose de poesia para o festival.
Ao final do dia, eu estava no Lounge da Heineken, tendo meus cinco minutos de descanso. Fui pego de surpresa quando surgiu no telão do palco Butantã o Gil Brother. O Jader e eu pensamos que seria uma boa ideia assistir o show dali mesmo. Mas bastou o primeiro riff soar pelos alto-falantes que descemos e fomos para a grama, junto com toda a multidão que não parava de chegar. Escolhido um bom lugar, o que testemunhamos foi uma brutalidade que, na minha opinião, rivaliza fácil no ranking dos melhores shows com a apresentação do Queens Of The Stone Age.
O Planet Hemp não trouxe nada de novo. Não mostrou nada além daquilo que eles já sabiam fazer. E que faziam muito, mas muito bem feito. Um som de extremo impacto, à altura de todos os protestos e revindicações que fazem. Se a causa da legalização da maconha precisava fazer barulho para se fazer ouvida, neste dia, com o Planet Hemp, ela conseguiu.
Muito bom sair de um festival deste tamanho e se sentir tão satisfeito com as atrações nacionais, que muitos julgam menores. Em todos estes shows o som estava impecável, com exceção do Tokyo Savannah que teve problemas com ruídos e excesso de ganho em alguns momentos e do Criolo, que algumas pessoas disseram estar sujo e embolado (coisa da qual eu discordo).
Se nem todas as bandas puderam estar em horários favoráveis, se nem sempre o público se acumulou na frente do palco, pelas disputas de atenção, de uma coisa todos podem se orgulhar: nenhuma banda nacional fez feio.
E vocês, que impressão tiveram dos shows nacionais?
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