Inglaterra, algum dia de janeiro de 1967. Uma parede da estação metroviaria de Islington amanhece pixada. O ato não trata-se de mais um manifesto contra-guerra de jovens ingleses. Muito menos é uma uma crítica dos skinhead, movimento que começava a ganhar forças em Londres. É sim a maior demonstração de idolatria que um músico já havia recebido. Na parede branca a tinta do spray preto afirma: “Clapton is God”.
Clapton, o guiarrista que esteve no Brasil na última semana, é Deus.
E Deus criou muita coisa boa. Inclusive Layla.
Layla não é minha canção preferida. Porém, como em Tears in Heaven, que o guitarrista compôs para seu filho morto aos quatro anos de idade após cair do 53º andar de um prédio em Nova York em 1991, a história que cerca Layla é repleta de boatos. E até algumas traições.
Clapton formou sua primeira banda aos 17 anos (The Rooters). Mas só depois depois de passar pelo John Mayall & The Bluesbrakers, Clapton formou com o baixista Jack Bruce e o baterista Ginger Baker o Cream, trio no qual ele se aperfeiçoou como guitarrista e cantor. Segundo ele, o fim do trio se deu em 1968 devido a disputas de egos.
No mesmo ano, durante uma turnê, Clapton conhece um tal George Harrison. No White Álbums (1968), é Clapton que toca a guitarra de While My Guitar Gently Weeps. Chamá- lo teria sido uma forma de dar mais credibilidade a Harrison junto aos companheiros de Beatles. A amizade entre ambos, no entanto, durou pouco. Motivo: mulher.
Pattie Boyd era uma modelo inglesa desconhecida até ser apresentada a Harrison nas filmagens de A Hard Day’s Night, onde foi figurante ao lado de centenas de garotas. Em sua autobiografia, Pattie diz que as primeiras palavras de George para ela foram: “quer casar comigo?”.
A cantada funcionou. Dois anos depois eles estavam unidos pelos sagrado matrimônio numa daquelas igrejinhas ao sul da França.
Vamos para 1969. Clapton torna-se amigo de Harrison e vira um frequentado assíduo de sua casa. Logo acaba conhecendo Pattie Boyd, uma mulher que já havia inspirado seu marido a criar obras geniais como Something e What is Life. Pois bem, Harrison começou a estranhar a reação de Pattie. Desconfiado, decide então romper relações com Eric Clapton. Nem amigos, nem parceiros, nada.
Mas era tarde. O guitarrista solo já estava completamente apaixonado pela modelo. Surge aí a motivação para escrever Layla:
(…)Eu estou implorando, querida, por favor/Eu tentei trazer consolo a você/Quando seu homem velho a deixou pra baixo/Como um idiota, eu me apaixonei por você/Por favor, não diga que nunca teremos uma chance/Nem que todo o meu amor foi em vão (…)
Harrison o acusa de traidor, mas o ex-amigo se defende dizendo que fez a música para a irmã mais velha de Pattie, a Paula, então namorada do músico. Mas não cola. Nem com Harrison, nem com Paula, que rompe o relacionamento com o, agora, sem amigo e sem mulher Eric Clapton.
Pattie nunca admitiu se Layla teve alguma influência em suas ações. Mas funcionou. Em 1970, pouco após o lançamento da música, Pattie se separa de Harrison e corre para os braços de Clapton. Eles viviem juntos até abril de 1988, quando ela deu um fim ao conturbado e polêmico românce. Claro, não antes de sevir como inspiração – de novo – para a música Wonderful Tonight.
Só.
Façamos as contas.
Em duas décadas, Pattie Boyd — ou Layla — foi motivo de Layla, Something e Wonderful Tonight. Layla é de longe o maior sucesso comercial de Eric Clapton, até hoje é tocada em seus show. Something é um clássico regravado, inclusive, por Elvis Presley. Já Wonderful Tonight é figurinha carimbada em serenatas, declarações de amor e afins.
E imaginar que tudo começou com uma mera figuração.
Vou manter aquela foto da Pattie Boyd no meu desktop.
Vai que.
Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.