Escrevi o primeiro poema para ganhar uma menina. A pequena passou, mas o amor às palavras sobreviveu. Outras vieram, mulheres e palavras, e no apetite por enriquecer o vocabulário, tornei-me um galanteador.
Das palavras, menos ciumentas que as mulheres, constitui um pequeno harém, minha coleção particular de dicionários de todo tipo. Desde o bom e velho Caldas Aulete até um raríssimo dicionário de analogias e ideias afins, passando por dicionários de citações, provérbios e expressões populares, dicionários de música, teatro e artes em geral, dicionários de gírias e palavrões, meus tesouros.
No meu serralho vocabular há também dicionários de sinônimos, claro. Mas já ensinava o poeta Quintana: esses que pensam que existem sinônimos, desconfio que não sabem distinguir as diferentes nuanças de uma cor. E é verdade. Como as mulheres, as palavras são insubstituíveis, não se troca uma pela outra sem que se perca algo. Para compreender os matizes de significado de cada palavra, é preciso contemplá-las de perto, descobrir seus segredos guardados sob a face neutra.
Na realidade, entre todas as formas que podem expressar uma ideia, apenas uma se encaixa com perfeição no corpo do texto e encarna o pensamento que se quer transmitir com clareza. Mas sem ajuda, nem sempre a palavra certa ocorre quando escrevemos.
Aí reside a utilidade de um dicionário de analogias. No sentido contrário a um dicionário comum, que para cada palavra fornece um ou mais significados, o dicionário de analogias parte da ideia e nos apresenta as palavras e expressões que podem dar forma àquela ideia. Eles fazem isso por meio do Plano de Classificação das Ideias, uma espécie de árvore de categorias que organiza mais de mil domínios conceituais. O domínio AMOR, por exemplo, está dentro da divisão AFEIÇÕES SIMPÁTICAS, que por sua vez é parte da classe AFEIÇÕES. Ou seja, a árvore conceitual tem conceitos gerais e abstratos no topo e vai descendo para ideias mais específicas na base.
No interior dos domínios conceituais, o dicionário de analogias exibe centenas de termos relacionados. Apenas para o domínio AMOR, a obra elenca, por exemplo, termos como afeto, carinho, simpatia, idolatria, admiração, apego, ternura, paixão, adoração, namoro, galanteio e outras dezenas de palavras entre substantivos, verbos, adjetivos e advérbios, além de referências literárias, mitológicas e de conhecimento de mundo como, por exemplo, Romeu e Julieta, Don Juan, Cupido, Eros, Afrodite etc.
Agora imaginem um dicionário comum de significados e um dicionário de analogias funcionando de forma combinada em um mesmo lugar, um dicionário digital disponível na internet. Imaginem que além de analogias entre palavras, esse dicionário também associe expressões populares, citações, metáforas e provérbios. E que para cada palavra ou expressão buscada ele também faça analogias com artigos da wikipedia e imagens.
Esse dicionário existe e chama-se Dicionário Criativo.
Ele é a versão digital, grandiloquente e pretensiosa daquele amor às palavras que descobri graças a uma menina. Para mim, ele é como um grande poema sobre tudo, que ainda não foi passado à limpo.
O Dicionário Criativo é o lugar onde você vai para desenvolver uma ideia e encontrar a melhor maneira de expressá-la. Segundo o linguista e autointitulado jovem romancista Umberto Eco, “todos os grandes escritores são grandes leitores de dicionários: eles nadam através de palavras”.
Os linguistas pensam nas ideias como nódulos numa vasta rede, que chamamos de rede semântica, em que cada ideia está ligada a muitas outras. Existem diferentes tipos de ligação: causas ligadas a seus efeitos (vírus/gripe); objetos com suas propriedades (limão/verde); relações opostas e complementares (vender/comprar); entidades com as categorias às quais pertencem (amor/sentimento) etc. Em Investigação sobre o entendimento humano, publicada em 1748, o filósofo David Hume reduziu os princípios de associação a três: semelhança, contiguidade de espaço e tempo, e causalidade. Nosso entendimento sobre o conceito de associação avançou desde Hume, mas seus três princípios continuam válidos.
O Dicionário Criativo é uma típica rede semântica de entidades associadas por semelhança, com o diferencial de atribuir peso à cada relação de associação. A tecnologia, chamada Rede Semântica Difusa, é o resultado de cinco anos de pesquisa em Linguística Computacional. É essa tecnologia que interliga os diferentes tipos de dicionários e informações semânticas sem produzir um caos de informação irrelevante.
O Dicionário Criativo funciona como uma grande tempestade de ideias e foi desenhado para que você navegue de palavra em palavra ad infinitum, descobrindo novas associações de conceitos e selecionando as palavras e expressões que vão servir para o seu texto. Como dizia Machado de Assis, palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, ou uma revolução.
O Dicionário Criativo tem ainda uma parceria com a editora Lexikon, a principal editora de obras de referência do Brasil. Graças a essa parceria, pela primeira vez e gratuitamente na internet, estamos disponibilizando o conteúdo integral do incrível Dicionário Analógico do professor Azevedo, revisto e atualizado.
No prefácio da nova edição impressa, Chico Buarque demonstra o seu ciúme com a obra: “Hoje sou surpreendido pelo anúncio desta nova edição do dicionário analógico de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo. Sinto como se invadissem minha propriedade, revirassem meus baús, espalhassem aos ventos meu tesouro. Trata-se para mim de uma terrível (funesta, nefasta, macabra, atroz, abominável, dilacerante, miseranda) notícia.”
A paixão pelas palavras é incurável, e o ciúme inevitável. Mas as palavras não têm dono, apenas admiradores secretos. E amantes. Por meio delas, nasce um novo livro, um artigo, um discurso, uma letra de música, um poema de amor.
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