Uma boa narrativa, seja ela cinematográfica ou literária, depende de diversos fatores que a compõem e que a revestem do fluxo necessário para prender a atenção de espectadores e leitores do começo ao fim. É uma característica tão importante que, sem ela, a obra não alcança o seu objetivo principal, que é conquistar os corações de seus participantes.

Diante da vasta quantidade de obras artísticas, ao homem é possível a configuração das mais variadas interpretações e preferências. Seria mais ou menos aquilo que normalmente se diz: “cada um tem seu próprio gosto”.

Então, o que para uns pode ser uma genialidade, para outros pode ser algo simples e banal.

Dentro desse contexto, algumas obras conseguem fidelizar mais pessoas que outras e, dependendo da quantidade, podem ser definidas como verdadeiras febres. E esse foi o caso da série de TV de ficção científica criada por J. J. Abrams, Lost, que durante as suas seis temporadas prendeu a atenção de muita gente.

LOST

Porém, embora de incontestável sucesso, não foi o final da trama que mais chamou a atenção. Pelo contrário, ele se tornou um fenômeno muito comum nos casos em que as obras se estendem por muito tempo, que é a perda do interesse por parte do público.

Ricos conteúdos são fórmulas de sucesso para obras narrativas. Quando as pessoas entram em contato com elas, a viralização ocorre e todo mundo passa a comentar sobre os acontecimentos. No caso das séries de TV, que têm transmissão semanal, as discussões vão crescendo conforme detalhes vão sendo revelados, e é nesse ponto que se encontra a grande dificuldade dos roteiristas: como manter a fidelidade dos fãs?

Como ficou claro na época, especialmente em Lost, o fenômeno foi desastroso sob o ponto de vista da fidelização. A febre que tomou conta de milhões de fãs ao redor do mundo foi arrefecendo e hoje poucas podem dizer que assistiram a série inteira, e menos ainda que gostaram do final.

Mas como isso foi acontecer?  Adolfo Bioy Casares, o autor do livro A invenção de Morel, explica.

Para quem não sabe, Lost foi inspirada em muitos livros, mas principalmente nesse escrito pelo argentino de Buenos Aires. Uma das principais narrativas insulares do século 20, o livro conta a história de um fugitivo da justiça que se isola em uma ilha deserta para não ser preso.

Anteriormente, o local fora foco de uma moléstia letal e não é mais habitável. Contudo, de repente, inexplicavelmente vão surgindo misteriosos habitantes que ignoram sua presença e que parecem não pertencer àquele ambiente, sobretudo por conta de suas vestimentas e hábitos anacrônicos. Além disso, ele não consegue entender de onde eles vieram, já que nenhum barco ou avião chegou à ilha.

A princípio, o personagem desconhecido prefere viver a tranquilidade e o isolamento na ilha, sem procurar interagir com as pessoas. Mas, quando encontra a bela Faustine, decide se revelar e tenta se aproximar. Só que ela, assim como todos os outros, não o ouve e nem percebe a sua presença.

Com o desenrolar na história, o personagem também vai vendo que, além de não ser visto, os visitantes repetem constantemente e em intervalos determinados, as mesmíssimas ações de antes, como uma fiel reprodução imagética e replicada.

A personagem Sawyer, de Lost, lendo o livro A invenção de Morel, edição em inglês com prefácio do Jorge Luis Borges (para ver a capa maior, basta clicar na imagem)
A personagem Sawyer, de  Lost, lendo o livro A invenção de Morel, edição em inglês com prefácio do Jorge Luis Borges (para ver a capa maior, basta clicar na imagem)

Inquieto, ele passa a investigar e a acompanhar as pessoas na ilha, para entender o que elas falam. Mas, a compreensão dos acontecimentos só vem quando ele escuta o cientista Morel, o dono da ilha, que construiu uma máquina que grava e reproduz pesos, sons, aromas e todas as dimensões que a realidade pode concentrar. E o mais absurdo, a sua própria existência na ilha e toda a investigação que empreende também estão registradas pela invenção de Morel.

Sendo assim, a relação entre as duas obras, Lost e A invenção de Morel vai se aproximando a complexidade da trama toma conta do cenário, já que — sem medo de spoilear — os personagens da série de TV norte-americana, segundo o próprio roteirista Damon Lindelof, estavam mortos e aguardavam a definição de sua pós-vida em uma espécie de purgatório.

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Mas a pergunta feita alguns parágrafos atrás não foi respondida. Por que Lost perdeu seus seguidores?

Tendo uma ligação tão próxima ao livro do escritor argentino, os mais atentos fãs já poderiam esperar por esse final. No fim, uma mecânica perfeita criada por um inventor universal gere as imagens que as pessoas carregam consigo e levam pela eternidade.

Então, as expectativas que os seguidores da série criaram pode ter sido muito maior do que o roteiro poderia alcançar por meio de sua linha motriz. O livro de Adolfo Bioy Casares é genial? Isso é incontestável até mesmo por Jorge Luis Borges, que a considerava perfeita.

Mas dava para ser destrinchada em série de seis temporadas? Essa é uma questão polêmica.

Muitas vezes, as séries de TV se prolongam demais, a ponto de deixar seus fãs chateados e com a impressão de estarem sendo enrolados com capítulos, e até mesmo temporadas, desnecessárias. Algumas podem até ser interessantes, mas esse é um ponto de difícil conciliação, pois os espectadores se empolgam e se divertem, mas quando percebem que a história pode não estar saindo do lugar perdem o interesse e abandonam seus postos para ocupar seus tempos com outras séries e produções.

É claro que no caso de Lost houve um problema não muito comum, que foi a greve dos roteiristas de Hollywood em 2008. Mas, apesar disso ter contribuído para as dificuldades na trama, não foi o fator principal.

É possível citar inúmeras séries de TV que cometeram, e permanecem cometendo, os mesmos erros. Entretanto, uma delas parece figurar nesse mesmo cenário. E ela se chama Guerra dos Tronos.

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Depois de cinco livro e três temporadas extasiantes de TV, a série de George Martin tornou-se um verdadeiro fenômeno mundial.

Jogos, camisas, sites, vídeos virais, memes etc. foram feitos e são consumidos por milhões de pessoas. Mas resta uma dúvida: será que ele consegue segurar as pontas até o final?

Conquistar a glória é mais fácil que mantê-la, já diria algum general romano. Embora a dificuldade existente entre Lost e Guerra dos Tronos seja de origem diferente, tem a mesma sintonia, ou seja, precisa fazer com que os fãs permaneçam fiéis aos episódios. Tarefa difícil para a HBO – produtora da série de TV – que optou por dividir o Livro 3 em duas temporadas. Sendo assim, com a série literária sendo fechada em sete livros, a série de TV terá, no mínimo, oito temporadas.

Haja fôlego!

Mas não é só de desastres e desconfianças que vive o mundo do entretenimento televisivo. Breaking Bad é um exemplo de sucesso. Com apenas cinco temporadas, foi ganhando o interesse dos fãs gradativamente e hoje é tida por muitos como uma das melhores séries dramáticas de TV de todos os tempos.

Certamente, muitos episódios foram feitos para estimular a curiosidade dos espectadores e poderiam até ser desnecessários, mas eles fazem parte da estratégia de consumo das grandes produtoras e foram montados com bastante habilidade, sem com isso perder tempo e permitir que os fãs percebessem que estavam sendo enrolados.

E aí? Será que Guerra dos Tronos vai cometer os mesmos erros de Lost? Isso, caríssimos leitores, apenas o tempo poderá responder.

Veremos!

Pergunta do editor:

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O que vocês acharam do final de breaking bad? E de Dexter, outra série que acabou há pouco? Por que as séries se arrastam tanto e em que momento elas costumam se perder (como foi com House)?

Agora é a hora de debater todas as séries que você gosta. Só correr aqui para os comentários.

Filipe Larêdo

Filipe Larêdo é um amante dos livros e aprendeu a editá-los. Atualmente trabalha na Editora Empíreo, um caminho que decidiu seguir na busca de publicar livros apaixonantes. É formado em Direito e em Produção Editorial.