Pessoal, vou tomar a liberdade de introduzir esse texto da mesma maneira com que abro o artigo “Cultive mais autocompaixão, ao invés de mais autoestima”, a ser publicado em breve dentro do percurso “23 dias para um homem melhor“. Os dois textos se complementam.

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Vivemos num mundo povoado por bestsellers e coaches motivacionais inspirados em mantras de positividade e autoestima. Aprendermos que é bom cultivarmos uma autoestima elevada e quando agimos de acordo, nos sentimos bem.

Tom Cruise interpretando o coach motivacional de sedução Frank T. J. Edgar, no filme Magnólia. Aposto que já viram figuras e discursos parecidos em outras áreas…

Então qual seria o problema em nos focarmos exclusivamente na autoestima?

Kristin Neff, uma das principais referências em autocompaixão no mundo hoje e autora já publicada no PdH, nos explica:

“O principal problema é que para se ter uma autoestima elevada é preciso sentir-se especial e acima da média.

Ser chamado de “mediano” é considerado um insulto em nossa cultura. (O que achou do meu desempenho ontem à noite? Foi mediano. Opa!) Claro, obviamente é impossível que cada ser humano no planeta seja acima da média, ao mesmo tempo.

Então, desenvolvemos o que é conhecido como um “viés de auto-aprimoramento”, que se refere à tendência de nos acharmos superiores aos outros em uma variedade de dimensões.

Estudos têm mostrado que a maioria das pessoas se acha mais simpática, mais popular, mais engraçada, mais agradável, mais confiável, mais sábia e mais inteligente do que os outros. Ironicamente, a maioria das pessoas também acha que está acima da média na capacidade de se ver objetivamente! O resultado de se usar esses óculos cor-de-rosa não é tão bonito.

Essa necessidade de se sentir superior resulta em um processo de comparação social, no qual continuamente tentamos nos sobressair e desvalorizar os outros.”

Em uma pesquisa realizada com milhares de universitários americanos entre 1987 e 2006, o narcicismo observado escalou significativamente. Sessenta e cinco por cento dos estudantes atuais superam as gerações anteriores em narcicismo e, não por acaso, em autoestima. Vocês podem ler em detalhes sobre no livro Generation Me (Geração Eu), de Jean Twenge.

Fora a constante comparação social, a obsessão pela autoestima nos envolve num processo de severa autocrítica.

Quando algo que nos faça sentir menos superiores acontece, nossa dignidade despenca. Passamos a oscilar entre picos e vales emocionais, ora nos vendo como os reis da montanha, ora como o mosquito do coco do cavalo do bandido. Naturalmente, isso nos deixa mais vulneráveis a sentimentos de ansiedade, insegurança e depressão.

É mais ou menos assim: você se sente melhor do que os outros por conta dos seus músculos impressionantes, mas quando se dá conta do corte de cabelo ridículo, a autocrítica que anda sempre de mãos dadas com a autoestima obsessiva faz você se sentir um merda. E o ciclo se repete ad nauseum…

Mas a alternativa então seria dispensar a autoestima e nos sentirmos pior, sem aquela confiança costumeira que gostamos de exibir por aí? E sem a crítica severa, será que não vamos nos tornar pessoas complacentes, que avançam vagarosas pela vida?

Apresento a autocompaixão, senhoras e senhores

Nas palavras da mesma Kristin Neff:

“Que tal nos sentirmos bem com nós mesmos, sem a necessidade de sermos melhores do que outros, caindo assim na armadilha do narcisismo/auto-reprovação?

Autocompaixão envolve sermos gentis com nós mesmos, quando a vida dá errado ou notamos algo sobre nós que não gostamos, em vez de sermos frios ou severamente autocríticos.

Ela reconhece que a condição humana é imperfeita, assim, nos sentimos conectados aos outros quando falhamos ou sofremos, em vez de nos sentirmos separados ou isolados.

Envolve também a conscientização – o reconhecimento e a aceitação imparcial das emoções dolorosas ao passo que surgem no momento atual. Ao invés de suprimir nossa dor, ou então torná-la um drama pessoal exagerado, vemos a nós mesmos e a nossa situação claramente.

Autocompaixão não exige que nos avaliemos positivamente ou que nos vejamos como melhores do que outros. Pelo contrário, as emoções positivas da autocompaixão surgem exatamente quando a autoestima cai. Quando não atendemos a nossas expectativas ou falhamos de alguma forma.

Isto significa que o senso de autovalorização intrínseco inerente à autocompaixão é altamente estável.”

A confiança no que digo vem – antes das aspas, fontes, estudos teóricos e links de aprofundamento – de minha própria experiência com o tema. Não estivesse aplicando isso no meu cotidiano, jamais teria a desfaçatez de recomendar publicamente a alguém experimentar o mesmo.

As 26 perguntas para descobrir quanta compaixão você tem consigo mesmo

Há dois caminhos para fazer o teste.

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O primeiro é se perguntar o quanto se identifica com cada uma das afirmações abaixo. Responda aqui, utilizando a escala de 1 a 5. 

1: quase nunca

2: ocasionalmente

3. metade das vezes

4. frequentemente

5. quase sempre

Após marcar todas as opções, vá ao final da página e clique em “calculate scores” para ter o seu resultado. 

Se o resultado for entre 1 e 2.5, sua autocompaixão é baixa. Entre 2.5 e 3.5 é média. E de 3.5 a 5 é alta.

Não se iluda com o design tosco da página do teste, a metodologia por trás vem de uma das pesquisadoras mais sérias que hoje se dedicam ao tema, a Kristin Neff.

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O segundo caminho é apenas refletir sobre como se relaciona, de verdade, com cada uma das afirmações abaixo. Observe qual a sua resposta de impulso e tente dissecá-la um pouco melhor. Às vezes o que pensamos acreditar sobre nós mesmos é parte de uma construção de imagem profundamente enraizada que vendemos para o mundo.

Se quiser convidar alguém (ou um grupo) para fazer a atividade em conjunto e conversar sobre em seguida pode ser uma boa.

Bom proveito!

E coragem, pois não é fácil conversar com os monstros que carregamos dentro de nós | Cena do belíssimo filme “Onde vivem os monstros”

As afirmações:

1. Sou desaprovador e julgador com minhas próprias falhas e inadequações.

2. Quando estou me sentindo pra baixo, tendo a ficar obsessivo e me fixar em tudo que está errado.

3. Quando as coisas estão indo mal para mim, vejo as dificuldades da vida como algo que todos atravessam.

4. Quando penso sobre minhas inadequações, tendo a me sentir mais distante e separado do restante do mundo.

5. Tento ser amoroso comigo quando estou passando por dores emocionais.

6. Quando falho em algo importante para mim, sou consumido por sentimentos de inadequação.

7. Quando estou me sentindo pra baixo e triste, me lembro que há muitas outras pessoas se sentindo exatamente assim agora.

8. Quando as coisas estão realmente difíceis, tendo a ser duro comigo mesmo.

9. Quando algo me irrita tento manter minhas emoções em equilíbrio.

10. Quando me sinto inadequado de algum modo, tento me lembrar de que sentimentos de inadequação são compartilhados pela maioria das pessoas.

11. Sou intolerante e impaciente com aspectos de minha personalidade dos quais não gosto.

12. Quando estou passando por um período difícil, me dou o carinho e ternura de que preciso.

13. Quando estou triste, tendo a pensar que a maioria das pessoas estão mais felizes do que eu.

14. Quando algo emocionalmente dolorido acontece, tento ter uma visão equilibrada da situação.

15. Tento pensar em minhas falhas como parte da própria condição humana.

16. Quando noto aspectos de mim que não aprecio, tendo a ser duro comigo mesmo.

17. Quando falho em algo importante para mim, tento manter as coisas em perspectiva.

18. Quando estou realmente me esforçando muito, tendo a pensar que as outras pessoas estão conseguindo as mesmas coisas com mais facilidade.

19. Eu sou gentil comigo mesmo quando estou atravessando períodos de sofrimento.

20. Quando algo me irrita sou levado pelos meus sentimentos.

21. Posso ser um bocado coração gelado comigo mesmo quando estou sofrendo.

22. Quando estou me sentindo triste, tento observar meus sentimentos com abertura e curiosidade.

23. Sou tolerante com minhas próprias falhas e inadequações.

24. Quando algo emocionalmente dolorido acontece, tendo a enxergar o incidente maior do que ele realmente é.

25. Quando falho em algo importante para mim, tendo a me sentir sozinho em meu fracasso.

26. Tento ser paciente e compreensivo com os aspectos de minha personalidade dos quais não gosto.

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Em minha experiência foi impactante fazer o teste.

Diria que uns 3 ou 4 anos atrás eu nem saberia explicar pra alguém o que é compaixão. Era ridiculamente duro comigo mesmo – e ainda carregando um orgulhinho disso, me sentindo um guerreiro.

Creio que para homens o drama é ainda pior, pois somos ensinados muitas vezes que emoções assim são “coisa de mulher”, uma tremenda besteira.

Queria eu ter aprendido mais cedo quanta coragem é necessária para cuidar de si e aceitar ser cuidado.


Se quiser se aprofundar no tema e desenvolver meios hábeis práticos para se relacionar melhor com suas emoções e mundo interno, minha recomendação sincera é que conheça e se inscreva no lugar.

Guilherme Nascimento Valadares

Fundador do PDH e diretor de pesquisa no Instituo PDH.