Mas vejam só, vocês, como as coisas funcionam. Há uma quadra da casa onde fica a nossa redação tem um restaurantezinho que apelidamos carinhosamente de "o de sempre". É lá que, quando falta disposição ou criatividade, vamos comer. Em frente, na cara do gol, tem uma padaria bem das antigas, embaixo de um prédio que, olhando bem, já está bem cansado, carecendo de um cuidado, uma reforma, um carinhozinho. Mas é lá que, saindo do de sempre, a gente senta para matar a refeição vespertina com um café coado e maldizer as mazelas da vida enquanto a digestão cumpre seu papel.

E hoje, numa quarta de sol em São Paulo, dia de feijoada, a gente deu com a cara na porta giratória de ferro coladinha no chão. A padaria estava fechada, com aviso que estava se mudando para outro lugar. Pela janela deu para ver que já não há mais, lá, balcão ou as prateleiras que outrora ostentavam pães de leite, sonhos velhos, sacos de açúcar e leite. As paredes de madeira amareladas haviam sido retiradas e o chão, onde antes havia um piso carcomido e quadriculado em preto e branco, agora era apenas areia e terra.

A desapropriação do nosso cotidiano.

Não chegou a ser um luto propriamente dito, nós sabemos que em breve haverá outra padaria, a região está cheia de estabelecimentos recheados de novas sensações degustativas, outras opções de afago para nossos estômagos, sorrisos de atendentes, cheiros de assados e frituras, comida e aconchego. 

Passou a curiosidade e fomos almoçar.

Tchau, Torino

Depois de a conta ter sido paga, aqueles dois minutinhos aproveitando o calor de depois da meio-dia e, do outro lado da rua, a padaria que não mais existia. Daí, nesse silêncio da despedida, o olhar da constatação. A construção toda está nas últimas, deteriorada, não cuidada, negócio largado mesmo, mas, que mesmo assim, mantinha-se funcionando porque, bem, estava ali, né. E daí o estagiário se pronunciou. "Olha só, né, que coisa maluca, né. Fechada. Não tem mais padoca. A gente tava lá até ontem, como se nada tivesse acontecido, como se nada fosse mudar. E hoje, do nada e sem aviso, sem a chance de a gente poder resolver algo, acabou tudo".

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Pois é. A gente ama, começa a se ver sempre, deixa a rotina fazer suas honras, cola lá e pede o de sempre, até aí tudo bonito, mas não olha o sonho ficando velho, a parede amarelando, o chão carcomendo. Não exige muito, também não se doa lá essas coisas, quem sou eu pra pedir pra passar um pano naquele balcão sujo, paga com as moedinhas e pica a mula. Daí é pedir pra acabar mesmo.

Com a mão no ombro do estagiário, dei um suspiro e meu quinhão:

"A nossa vida amorosa é uma padaria que fecha".

E a gente foi embora sem tomar café.

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Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna <a>Do Amor</a>. Tem dois livros publicados