Meu nome é Camila, acabei de completar 30 anos, sou fotógrafa e vocalista de uma banda de indie rock. Filha de fotógrafo, quase trilhei outro caminho na engenharia, mas de alguma forma – e somente hoje posso dizer – fui resgatada para este mundo. Trabalhei com meu pai por algum tempo para aprender, clicando máquinas grandes, carros, indústria, caminhões, mas quando chegou o momento de voar solo, escolhi outro caminho. Meu gosto pessoal era retratar pessoas, atitude e moda.
Eu gosto de observar. Gosto de ver como as pessoas gesticulam, falam, olham, posam. Dentro desse universo gigante sempre me despertou a curiosidade o corpo nu. E junto com esta curiosidade veio também a dificuldade em compreender os porquês dos mistérios e tabus em torno da nudez. Por que temos tanta vergonha de mostrar o corpo? Por que vergonha de ver outro corpo nu?
A mulher e a sensualidade brasileira não mostrada
É engraçado, mas vejo no Brasil uma certa incoerência entre o desejo de mostrar o corpo, a nudez e a sensualidade, que não vejo em lugares como Europa e Estados Unidos.
A mulher brasileira comum gosta de mostrar o corpo, ela sente-se bem fazendo isso. Usa roupas curtas e vai às praias com biquínis micros.
Pode se mostrar tudo – quer dizer, quase tudo: há um certo pudor em mostrar os seios, por exemplo. Seios à mostra acabam tendo alguma conotação sexual, não é comum enxergar-se simplesmente a beleza do corpo nu.
Isso ficou ainda mais claro pra mim quando passei o verão em Barcelona – pessoas de todas as idades se despem sem nenhum problema na praia, sem nenhuma vergonha ou restrição. Quem está ao redor tampouco olha, censura. É algo comum e mais que normal. Foi lá que começaram os primeiros registros fotográficos que me trouxeram até aqui.
As brasileiras são extremamente sensuais, mas marcadas por esse biotipo “gostosona”, criado não só pelo imaginário masculino, como pelo desejo feminino de agradar o homem e que estampa a maioria das revistas criadas para esse público.
O triste é ver que isso começou há relativamente pouco tempo. A chegada de tecnologia suficiente para modificar o corpo e retardar o envelhecimento dele é devastadora. Misturando essa tecnologia toda com a maneira que a grande mídia explora a imagem das pessoas nela inseridas e pronto, criamos diversos monstros.
Isso mudou inclusive o estereótipo do qual tanto falamos. A mulher brasileira ficou conhecida pela “bela bunda”, mas nunca incluímos nesse biotipo – pelo fator genético – uma quantia generosa de seios. Não precisamos nem ir tão longe da realidade atual para lembrar. Aos buscar revistas masculinas até o início da década de 90, as mulheres não tinham absolutamente nada de peito. E isso era lindo.
De repente há um exército de mulheres com peitos e bundas gigantes de silicone injustificados andando por aí. E por que? Por que elas realmente querem? Ou por que elas acham que os homens as querem assim?
A nudez por aí
Por conta de tantos questionamentos resolvi mergulhar de cabeça nessa poça de perguntas e desvendar o que realmente me intrigava. Foi aí que comecei a pesquisar.
Quando tinha uns 19 anos vi na internet o site Suicide Girls. Na época era um site ainda pequeno, com algumas garotas nuas. Estavam apenas no começo, hoje o site é um super portal com milhares de modelos e seguidores. O mote era – e ainda é – fotografar garotas com visual diferenciado, com tatuagens, piercings e cabelos coloridos.
Essas garotas provavelmente nunca posariam para uma revista masculina como a Playboy. E acho que o mais incrível desse site na época é que as fotos eram legais. O alvo não eram apenas homens. Eu cogitei participar, mas – vejam só – eu mesma tinha vergonha de mostrar o corpo.
O tempo foi passando, outros sites com outras propostas – mas também retratando pessoas da vida real – foram surgindo. O I Feel Myself mostra vídeos de garotas se masturbando. Hoje já são tantos vídeos que há várias categorias, close up, solo, estúdio, feito em casa, e por aí vai. Lá a maioria das mulheres não tem silicone, não se depilam inteiras, não são super magras e esculpidas pela academia.
Recentemente encontrei o Me In My Place. O MIMP é um site que revela garotas em suas casas fazendo qualquer coisa que elas façam naturalmente. Elas mostram o que querem.
Também encontrei na minha pesquisa dois outros projetos muito legais, com a mesma filosofia: o “Apartamento 302“, do Jorge Bispo, e a Jacques Mag – essa última, além dos editoriais, faz vídeos também.
Juntando tudo isso, fui amadurecendo e entendendo melhor o que eu gostaria de fazer. E foi aí que eu cheguei na ideia do X REAL.
Minha contribuição por uma nudez mais natural
O X REAL é a minha contribuição para este cenário. Para mostrar um olhar feminino da nudez, sem imagens agressivas e maliciosas e sem tratamento digital. Sem o uso de lentes que distorcem o corpo e ângulos explícitos. Uma nudez que seja bela para todos, homens e mulheres, mas que principalmente as mulheres se sintam bem em ver, não acuadas ou agredidas. E que de repente, por que não, elas sintam o desejo de serem retratadas.
Por isso, as fotos são feitas num ambiente escolhido pela modelo. Pode ser sua casa, casa de outro, trabalho, atelier, o que for. Ela tem que ficar mais do que confortável. A garota mostra o que quer, o limite é só dela. A produção é dela. Se ela é uma garota que gosta de se arrumar e de se produzir, assim será. Se ela é do tipo mais natural, que não usa nada, assim será também.
Do ponto de vista do espectador é legal saber que aquela cama é da garota, seu lençol, suas roupas ali no armário, seus objetos pessoais ao redor, até mesmo as músicas que ela ouve durante o ensaio são escolha própria.
Do ponto de vista da garota, ela está num ambiente familiar, não em um estúdio com fotógrafo, assistentes, maquiador, mil luzes na cara, inibindo qualquer vestígio que possa existir de vergonha nela. Sou eu, ela e tudo o que ela conhece e gosta.
Estas referências viram conteúdo. Durante as sessões escutamos música e elas preparam uma seleção musical com o tema que acharem mais bacana. Pode ser música para se despir, para dançar, viajar, e essa lista disponibilizo para quem quiser ouvir.
Além disso, deixo uma câmera digital simples com a garota, caso ela não tenha uma, para que se fotografe também. Gosto de saber e mostrar como ela se enxerga. Por fim, tem duas sessões no site que contemplam uma sugestão de um drinque, com sua receita, e algumas imagens soltas que acompanham uma citação da própria modelo.
Eu acredito em uma nudez além da pele exposta.
A parte mais legal dessa minha nova aventura, até agora, é que o post inaugural com o vídeo foi feito há pouquíssimo tempo e já recebi diversas mensagens não só de garotas que curtiram o projeto e que querem participar, como de rapazes que gostariam de ver suas parceiras ali. Tudo sem sequer ter uma foto no ar.
E isso pra mim comprova que ainda existem pessoas capazes de encontrar excitação num mundo de verdade.
O X REAL ainda está começando e tem um caminho a percorrer. Algumas coisas eu terei que descobrir no caminho. Gostaria apenas que ele tivesse conteúdo que agradasse homens e mulheres, e principalmente que fosse bonito de se ver.
Ainda em tempo, deixo aqui o meu convite para vocês conhecerem e para as meninas que queiram ser retratadas, que entrem em contato.
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